Domingo, 28 Abril 2024

Os mimos de PH

Após o jornalista Elio Gaspari jogar na mídia nacional o escândalo de repasses de recursos públicos provenientes da isenção de impostos ao Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor do Estado (Sincades), a Justiça ajuizou nesta terça-feira (9) uma nova ação popular contra o ex-governador Paulo Hartung, idealizador e criador da farra fiscal que sangrou dos cofres do Estado e dos 78 municípios capixabas cerca de R$ 3 bilhões de 2008 para cá, quando o esquema de incentivos ao setor atacadista passou a vigorar. 

 
O autor da ação é novamente o estudante de Direito Sérgio Marinho Medeiros Neto, que já conseguiu na Justiça a suspensão dos repasses dos recursos para o Sincades e agora volta à carga para pedir a extinção definitiva dos incentivos concedidos ao setor atacadista capixaba. 
 
A ação aponta que os benefícios fiscais são ilegais, uma vez que Constituição Federal veda a concessão de incentivos sem lei específica ou prévia autorização da Assembleia Legislativa, como é o caso.
 
O estudante adverte que o governo Hartung legalizou a sonegação ao conceder as isenções fiscais às empresas. “Não há qualquer lei que autorize isso, e, a bem da verdade, nem poderia existir”, denuncia um trecho do processo que tramita na 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública Estadual.
 
No artigo publicado por Gaspari no último dia 7 na Folha de S. Paulo, e simultaneamente replicado em diversos outros jornais, o jornalista explicou didaticamente, a partir de um exemplo, o caminho da “garfada”. “A empresa deveria entregar à Viúva [governo] R$ 10 milhões e entregaria R$ 6,7 milhões [desconto de 33% sobre o ICMS cobrado]. Tendo recebido um desconto de R$ 3,3 milhões, destinará R$ 330 mil ao bem-estar da população. Resta a pergunta: para onde ia esse dinheiro?”
 
 
O governador Renato Casagrande, que assumiu para si a defesa do antecessor, designou o secretário de Desenvolvimento, Nery De Rossi, para tentar responder a Gaspari onde está o dinheiro.
 
De Rossi, no jornal A Gazeta dessa segunda-feira (8), trata a sangria com naturalidade, tentando convencer que a prática é legal e vantajosa para o Estado. 
 
O secretário tenta mostrar o “lado bom” dos incentivos. Exalta o número de empregos gerados pelo setor após a introdução do pacotão de benefícios fiscais e destaca também o aumento de arrecadação. 
 
Gaspari, no entanto, achou "estranho" o caminho do dinheiro: “(...) um pedaço do incentivo fiscal ia para uma entidade da guilda, que convertia o imposto tirado da bolsa da Viúva em mimo para ser distribuído pelo sindicalismo patronal (...)”.
 
O secretário quis convencer Gaspari que não há nada de errado na transferência de recurso das empresas do setor para o sindicato controlado pelos próprios atacadistas. Ele afirma que o dinheiro do Sincades é privado e não requer fiscalização do Estado, como cobraram o estudante na ação e o jornalista no artigo. 
 
O Sincades também se apressou em escrever uma nota para justificar os “mimos”. A nota usa um caminhão de números suspeitos para tentar provar que os incentivos são bem empregados pelo setor. 
 
O Sincades repete De Rossi ao falar do número de empregos gerados. Destaca também que a arrecadação de impostos municipais, estaduais e federais entre 2007 e 2011 mais que dobrou.
 
Informa ainda a nota que o dinheiro repassado ao Sincades beneficiou mais de 800 mil pessoas no Estado. Isso mesmo. Quem ainda estiver duvidando do número que faça um exame rápido de memória e logo confirmará que é um dos beneficiados do Sincades e nem sabia.
 
Por exemplo, se você degustou uma moqueca capixaba no Festival Panela de Barro, considere-se um beneficiado. Ao todo, segundo o Sincades, foram 30 mil os beneficiados. Ainda na área gastronômica, se você é um dos 30 mil comensais que se esbaldaram na Festa da Polenta de Venda Nova, também foi mais um beneficiado. Só nessas duas comilanças foram 60 mil beneficiados. 
 
Assistiu ao Vitória Cine Vídeo? Parabéns! Você é mais outras 15 mil pessoas foram beneficiadas. E por aí vai. Os números, não assustem leitores, são realmente impressionantes e estão todos ilustrados num belo livro que o setor mandou fazer, com o dinheiro do Sincades, é claro, para mostrar que o dinheiro vem sendo muito bem empregado. Tão bem empregado que o recurso, como o próprio governo admitiu, não precisa ser fiscalizado pelo Tribunal de Contas, embora a verba seja pública.
 
É por isso que o Sincades tem orgulhoso de dizer que em quatro anos beneficiou mais de 800 mil capixabas. Só faltou informar que o “mimo” custou mais de R$ 3 bilhões ao Erário – dinheiro que o Estado deixou de arrecadar. É preciso também informar aos prefeitos que os municípios deixaram de arrecadar cerca de R$ 750 milhões em impostos. Será que os prefeitos estão conscientes que abriram mão dessa bolada? 
 
O estudante Sérgio Marinho Medeiros Neto fez a parte dele. Agora cabe à Justiça pôr fim aos mimos e paparicos concedidos pelo ex-governador Paulo Hartung e mantidos pelo governador Renato Casagrande aos empresários do setor atacadista. Vamos ficar de olho.

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