Como acontece anualmente, ato será em Cobilândia, onde o corpo foi encontrado
Falar dos mártires é lembrar de quem “tombou” pelas causas de Jesus Cristo, segundo a Irmandade do Mártires da Caminhada. Pode parecer contraditório, mas é falar de alguém que teve sua vida ceifada, mas continua vivo. É assim com Padre Gabriel Félix Roger Maire. Nesta terça-feira (23), quando seu assassinato completa 36 anos, haverá a celebração de sua vida, ou seja, daquilo que foi vivido com ele nas comunidades e do que ele defendeu e ainda hoje é propagado.

A celebração será às 19h, com concentração às 18h30, na Praça do Mártires, na Avenida Carlos Lindemberg, onde o corpo do sacerdote francês foi deixado, na antevéspera de Natal de 1989. É realizada pelo Grupo Ecos de Gaby, “em sintonia com a Irmandade dos Mártires da Caminhada”, grupo que “faz memória dos que tombaram no chão latino-americano caribenho”, diz Raquel Passos, que integra os dois grupos.
“A gente quer celebrar porque Gabriel fez parte da nossa história. Está entre as pessoas que vieram para o Brasil colaborar com o povo latino-americano. Ele poderia ter ficado confortavelmente na França, mas veio inspirado nas luzes do Concílio Vaticano II, e em Vitória, esteve aqui devido ao trabalho de Dom João Batista”, conta.
Raquel refere-se a Dom João Batista da Motta e Albuquerque, bispo que era entusiasta do Concílio Vaticano II. O Concílio impulsionou as Comunidades Eclesiais de Base (Cebs), por meio das quais os cristãos eram incentivados a atuar em prol de uma sociedade mais justa por meio da crença de que não se deve esperar pela morte para viver no paraíso, mas sim, buscar dignidade para todos e todas na terra.
Raquel, afirma, ainda, que manter anualmente a memória de Padre Gabriel é importante para que sua trajetória não seja esquecida. “O sangue derramado dele está presente em nossos trabalhos com as mulheres, juventude, negros. O nome dele não pode ser esquecido, para que seja possível mostrar que o que conquistamos veio de uma luta que não foi fácil”, destaca.
Padre Gabriel foi assassinado no areal de Vale Encantado, em Vila Velha. O sacerdote sofria ameaças em virtude das causas que defendia, em especial o direito à moradia. Seu corpo foi deixado na Avenida Carlos Lindemberg, em Cobilândia, no mesmo município, para se criar uma narrativa de que ali ele foi interceptado em seu famoso fusquinha, sendo vítima de latrocínio. O crime prescreveu e os mandantes nunca foram descobertos.
Se estivesse vivo, Padre Gabriel completaria 90 anos no dia primeiro agosto de 2026. Por isso, o rito da próxima terça-feira também será o pontapé inicial para celebrar a data, que, no decorre do próximo ano, contará com saraus e outras atividades em fase de elaboração.
O sacerdote chegou ao Brasil em 1980. Gabriel incentivava a organização popular, sendo um dos impulsionadores da criação de movimentos de mulheres, culminando na atual Associação de Mulheres de Cariacica Buscando Libertação (Amucabuli). Foi essencial nos movimentos de moradia e em meio aos grupos de juventude, como a Juventude Operária Católica (JOC).
Ainda sobre a classe trabalhadora, atuou na Pastoral Operária, onde coordenou um jornal chamado Ferramenta, feito por operários para operários, que buscava informar os trabalhadores sobre questões como as lutas populares no Espírito Santo, no Brasil e, em menor escala, no mundo, além de ter como outro objetivo a educação para a cidadania.

