Quarta, 24 Abril 2024

​Com suspensão de leilão, sociedade cobra debate público sobre IBC

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Leonardo Sá

Apontado como uma "vitória parcial da população capixaba" pelo Núcleo do BRCidades no Espírito Santo, a suspensão do edital de venda de parte dos galpões do antigo Instituto Brasileiro do Café (IBC) abriu uma brecha para nova disputa de narrativas sobre o patrimônio federal, que teve sua maior parte cedida ao Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), após mobilizações da sociedade civil e políticos. A venda da área de cerca 6,6 mil m² dos 33 mil m² totais do imóvel completo, que seria leiloado dia 12 de abril, foi adiada até que o edital seja retificado.

Uma ação civil pública da Associação de Moradores de Jardim da Penha (Amjap) junto com as Defensorias Públicas da União e do Espírito Santo pediu que o edital fosse reformulado para que conste a informação de que o imóvel está em processo de tombamento provisório pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC). Agora, o governo federal tem prazo de 15 dias desde o dia 8 para reformular o chamado. Com o atraso, entidades querem reforçar o debate público sobre o uso do bem.

Marcada na imagem a parte que está sendo colocada em leilão. O restante está cedido para uso do Ifes. Imagem: SPU

"Agora cabe à população capixaba se mobilizar e lutar para impedir a venda dos Galpões do IBC e garantir que esse imóvel se reverta para o uso coletivo da sociedade!", disse o BRCidades ES, comentando o adiamento do leilão. O próximo passo deve ser a realização de uma audiência pública sobre o tema na Câmara de Vitória, a ser anunciada em breve.

"É uma bandeira muito antiga, que vem desde 1984. Existe um sentimento de pertencimento entre a comunidade e aquele espaço, para que seja de usufruto da sociedade de maneira geral. A cessão para o Ifes atendeu parcialmente essa demanda, mas queremos a totalidade", alega Angelo Delcaro, diretor da Amjap e advogado responsável pela ação.

Para ele, a estratégia do governo federal, que era de entregar o espaço para a iniciativa privada e setor imobiliário para provável construção de edifícios, além de poder destruir um patrimônio histórico, implicaria impactos negativos para o bairro, já adensado e com serviços públicos que considera insuficientes como escolas, postos de saúde e centros de acolhimento. Já o uso público como o do Ifes e outras possíveis iniciativas, contribuiria para fortalecer a comunidade, movimentar o comércio do entorno, a sensação de segurança e outros impactos positivos, sem tensionar os valores imobiliários e serviços públicos, como no caso de construção de unidades habitacionais de alto padrão. 

O Ifes recebeu o cessão de parte dos armazéns, onde vai instalar um Centro de Inovações. Foto: Leonardo Lopes/Ifes

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Espírito Santo (CAU-ES), autarquia federal que possui a função de "orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de arquitetura e urbanismo, zelar pela fiel observância dos princípios de ética e disciplina da classe em todo o território nacional, bem como pugnar pelo aperfeiçoamento do exercício da arquitetura e urbanismo", também se posicionou de forma assertiva contra o leilão, entendendo que um "empreendimento desta magnitude deve envolver amplo estudo e debate entre os diferentes agentes da sociedade".

Com base da defesa da gestão democrática das cidades para garantia do direito social de acesso à cidade, de forma sustentável e com redução das desigualdades sociais, o CAU-ES destaca os impactos diretos e indiretos não só para a comunidade local mas para toda cidade, no caso de modificações no uso de imóveis de tal envergadura. O Conselho lembra que um dos motivos de questionamento à venda é o valor da construção como patrimônio histórico que remonta ao início do bairro de Jardim da Penha, sendo uma de suas primeiras construções, e à história da produção e comercialização do café, um dos principais produtos da economia capixaba desde o Século XIX até os tempos atuais.

"Sabe-se que o espaço já não é mais utilizado para a sua finalidade original e encontra-se ocioso em sua maior parte (o Ifes deu início ao processo de ocupação de parte dos galpões). Assim, a necessidade da requalificação integral do espaço é atual e urgente", corrobora o CAU-ES, apontando que o espaço deve cumprir função social que garanta segurança, acessibilidade, sustentabilidade e que movimente a economia local.

Jardim da Penha nos anos 1970. À esquerda o IBC, próximo às primeiras casa e conjuntos habitacionais e da Ufes. Foto: Antonio Carlos Sessa

"Esse debate deve ser realizado de forma horizontal, contemplando os moradores da região, o empresariado, a administração pública e, sobretudo, com ampla participação de arquitetos e urbanistas, categoria profissional habilitada para planejar e executar atividades relacionadas ao urbanismo e patrimônio cultural", reivindica o órgão, que ressalta, também, o processo de tombamento em curso, pedindo que o empreendimento não seja negociado comercialmente antes da conclusão do mesmo, iniciado em novembro de 2021.

A parceria entre órgãos públicos e a iniciativa privada é apontada como melhor caminho para manutenção e utilização do espaço do que a venda. "Nesse sentido, o Conselho sugere que se promova amplo debate, por meio de consultas públicas e assembleias, a partir da estruturação de um grupo de trabalho interinstitucional para analisar a situação a partir do Plano Diretor Municipal (PDM); e a realização de estudos técnicos e a ampla atuação de Arquitetos e Urbanistas, a fim de fundamentar uma proposição ampla para a destinação e usos futuros das áreas em questão, que contemplem as demandas de todos os entes envolvidos (populações locais, mercado imobiliário, conselhos, prefeituras, dentre outros)", conclui o CAU-ES.

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