Comissão da Assembleia sinaliza para ação judicial; loteamento já responde a processo

Moradores do loteamento Village do Sol, em Guarapari, voltaram a cobrar fornecimento de água potável e ligação de rede de esgoto durante audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa nessa quarta-feira (12). Entre as medidas debatidas, está a revisão do zoneamento ambiental da região e o ingresso de uma nova ação civil pública (ACP).
O presidente do colegiado, deputado Fabrício Gandini (Cidadania), informou que vai buscar agendas com o governador Renato Casagrande (PSB), o prefeito Rodrigo Borges (Republicanos), o presidente da Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), Munir Abud, e o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema).
Segundo Gandini, o objetivo é garantir que as medidas já determinadas pela Justiça sejam efetivamente cumpridas, entre elas, a regularização ambiental da área, o planejamento das redes de saneamento e o atendimento adequado pela concessionária pública. Há seis anos, tramita uma ação coletiva movida pelo Ministério Público Estadual (MPES), a pedido da Associação Nacional de Defesa dos Consumidores e das Donas de Casa, contra a Imobiliária Garantia, acusada de fraude na venda dos lotes, e a construtora G&C.
A situação envolve uma série de entraves. Parte do loteamento está dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) de Setiba, o que impede a realização de obras básicas, como a instalação de rede de esgoto e o fornecimento regular de energia elétrica. A EDP Brasil e a Cesan negaram a execução dos serviços sob o argumento de que não poderiam intervir em área protegida.
Os relatos apresentados na audiência apontam que a água que chega às casas tem cor de ferrugem e cheiro forte, tornando o consumo arriscado. A comunidade afirma ter apenas duas opções diante do problema: pagar pelo fornecimento de uma empresa privada, que não é uma concessionária formalizada pelo poder público municipal, ou abrir poços artesianos, que acabam contaminados pela proximidade de fossas sépticas improvisadas.
“O governo tem que chegar, não podemos ficar à mercê, pisando no esgoto, numa cidade que se chama Cidade Saúde”, reforçou o empresário Otoniel Firmino da Silva. Outros participantes também destacaram que, apesar de cobrar caro, a empresa privada não oferece garantia de qualidade.
O público criticou ainda a ausência do prefeito de Guarapari na audiência, já que a concessão de serviços de água e esgoto é competência do poder municipal. “Se a empresa Água Limpa não produz água de qualidade, cadê a fiscalização? Cadê a Cesan? Quem fiscaliza? O Estado não está se fazendo presente, junto com a prefeitura”, questionou o advogado Paulo César Gomes. “Falam tanto que não podemos poluir o lençol freático, mas temos mais de 8 mil fossas poluindo”, acrescentou.
A moradora Scheila Ventura Fontana já havia denunciado, em 2024, durante a Tribuna Popular da Assembleia, a precariedade enfrentada no local, onde vive há mais de 15 anos. Além da falta de saneamento básico e água potável, ela destacou que a comunidade sofre com a ausência de outros serviços públicos, como saúde, transporte, segurança e educação infantil, e fez um apelo aos parlamentares por melhorias. Outro ponto crítico é a falta de asfaltamento das ruas e de transporte público: o bairro possui cerca de 60 ruas de terra, o que dificulta a circulação de ônibus e a chegada de viaturas da polícia.
Para Cesar Ivan Pinheiro, que acompanha a situação por meio de conselhos municipais de Meio Ambiente, o problema poderia ser resolvido com soluções simples, se houvesse vontade política. Ele afirma que cidades como Aracruz, no norte do Estado, já adotaram estações de tratamento de esgoto específicas para loteamentos.
O grupo que já processou a Imobiliária Garantia e a construtora G&C busca indenização pelos danos coletivos e individuais. Alega que as empresas prometeram, no início dos anos 2000, a construção de um condomínio fechado com infraestrutura completa, incluindo ruas pavimentadas, saneamento básico, rede elétrica, restaurante, piscina, área de lazer e segurança 24 horas, mas o empreendimento nunca foi entregue como anunciado. “Mesmo assim, elas continuaram vendendo lotes”, denunciou a advogada Débora Pauli Freitas, que representa os moradores no processo.

Débora explicou que a nova ação civil pública mencionada pela Assembleia não se confunde com a primeira, que abrange somente o loteamento Vale do Luar, também chamado de Village do Sol – Setor Recanto. “Essa ação civil pública que pode surgir seria mais ampla, com mais moradores e sem relação de consumo, diferente do que pleiteio no outro processo. No caso do Vale do Luar, o processo é apenas a Garantia e a G&C, que venderam os lotes”, explica. Desta vez, acrescenta, “eles estão tratando do fornecimento de saneamento básico, que é um direito essencial. As duas tratam do mesmo problema, mas por ângulos diferentes”.
Em junho de 2025, a Justiça determinou o bloqueio das matrículas de imóveis da Imobiliária Garantia no loteamento, após constatar que a empresa continuava vendendo terrenos mesmo durante o andamento do processo. O juiz Camilo José D’Ávila Couto apontou “risco de prejuízo irreparável aos consumidores” e afirmou que a medida é necessária para garantir a possibilidade de indenização futura.
“Eles continuam vendendo terrenos em áreas onde nunca poderiam ter sido feitos loteamentos”, alertou a advogada. Ela lembra que, em 2018, foram firmados dois Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) entre o Ministério Público, a empresa e a prefeitura, mas as medidas se limitaram ao patrulhamento de ruas, sem resolver os problemas de contaminação do solo e da água.

