Segunda, 29 Abril 2024

Obra na praça de Itaúnas poderá interferir em patrimônio cultural

itaunas_projetopraca_divulgacao Divulgação
Kika Gouvêa

Um projeto para revitalizar a praça principal da Vila de Itaúnas, em Conceição da Barra, norte do Estado, tem gerado críticas de moradores e de especialistas em patrimônio histórico. Apesar do reconhecimento de que o local precisa de melhorias, a proposta apresentada prevê intervenções que poderão impactar negativamente nas práticas culturais da comunidade e na preservação patrimonial.

O projeto proposto pela gestão do prefeito Mateusinho do Povão (PTB) foi apresentado aos moradores em uma reunião na última sexta-feira (5). Entre as propostas, está a colocação de um piso de concreto em frente à histórica Igreja de São Sebastião e embaixo do Mastro de São Benedito. Outra intervenção é a criação de duas passarelas de madeira com pergolados no meio da praça. Também está prevista a instalação de equipamentos de lazer e esportes, com um parquinho infantil e uma quadra de areia.

"Eu sou brincante, participo do Jongo e do Ticumbi, e aquele piso ali vai impossibilitar nossas práticas. E as passarelas, além de estranhas, vão atrapalhar as brincadeiras também. Um exemplo é o Alardo [manifestação secular que simula uma luta entre mouros e cristãos], que precisa de uma área grande para acontecer", comenta Wanderlea Campos da Paixão, a Dequinha, integrante da Associação de Folclore de Conceição da Barra.

Dequinha, que mora em Itaúnas desde que nasceu, também diz ser contra a retirada de uma feira livre que acontece às quintas-feiras na praça, conforme foi colocado na reunião. Ela é a favor de melhorias na praça, mas questiona a forma como a prefeitura apresentou o projeto.

"Tiveram quatro anos e meio para apresentar o projeto e não fizeram, agora vão querer que a gente engula uma pracinha que eles não vieram discutir com a gente, vieram para mostrar um projeto pronto. Falam que vão aceitar sugestão, mas não vão aceitar coisa nenhuma, querer fazer isso logo para a verba entrar", critica.

O arquiteto e urbanista Genildo Coelho, especialista em patrimônio histórico e frequentador da Vila de Itaúnas há vários anos, foi acionado por moradores logo após a apresentação do projeto. Para ele, a proposta divide a praça em três, inviabilizando as práticas culturais da comunidade, e esconde a igreja da cidade. Ele afirma que é possível, sim, colocar itens em benefício dos moradores, como o parquinho, mas é preciso respeitar as características locais.

"É um projeto muito equivocado, não tem o mínimo de respeito com a paisagem local, que 'gourmetiza' um espaço popular. Você não pode propor uma intervenção que desrespeita a ambiência urbana", comenta Genildo Coelho.

Boa parte dos moradores também é favorável ao projeto, ainda que com ressalvas. Rafhael Brandão, presidente da Associação de Folclore de Conceição da Barra, defende que a intervenção é necessária e ainda não há um projeto definitivo. Ele mobiliza a realização de reuniões comunitárias para debater a proposta.

"Apenas uma apresentação do projeto feito pelo Executivo foi levado para discussão em uma primeira etapa. Acho positiva a reforma, já que a nossa praça está abandonada há mais de 20 anos. Vejo com bons olhos, desde que respeite as tradições do lugar. O que não pode acontecer é a praça ficar do jeito que está, jogada", argumenta.

Já a arquiteta responsável pelo projeto, Patrícia Madeira, afirma que não houve questionamentos durante a reunião de sexta-feira e apenas uma sugestão foi encaminhada. Ela argumenta, também, que não foi feita nenhuma intervenção contra o patrimônio histórico, e todas as características foram mantidas.

"Criamos alguns elementos com acessibilidade, porque tem pessoas que andam de cadeira de rodas, como eu. Cadastralmente, na verdade, nem é uma praça, é uma rua. Não vai ser mexida em nada em relação à vegetação. O que vai no entorno dela, para não alagar, é uma calçada para as pessoas passearem em volta, como em qualquer outra praça", comenta a arquiteta.

Entretanto, Genildo Coelho afirma que materiais em madeira, como o das passarelas, não apresentam acessibilidade, além de não serem duráveis, demandando manutenção constante. "O projeto pode e deve ter acessibilidade, mas não dessa forma, que na verdade não representa acessibilidade", comenta.

Século Diário questionou a Secretaria de Estado da Cultura (Secult-ES) se o projeto foi analisado pela pasta, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.

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