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Projeto que protege patrimônio imaterial é aprovado na Assembleia

Outra demanda da área, a Política de Cultura Viva não tem previsão de retornar à pauta

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O Projeto de Lei (PL) 806/2025, que “cria o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem o Patrimônio Cultural do Espírito Santo”, foi aprovado por unanimidade na Assembleia Legislativa nessa segunda-feira (15). A proposta substitui a Lei nº 6.237, de 12 de junho de 2000, adequando-se ao Decreto Federal nº 3551, do mesmo ano.

O Registro de bens culturais de natureza imaterial, segundo a proposta, consiste na inscrição desses bens em ao menos um dos seguintes Livros de Registros: “livro de registro dos saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de fazer tradicionais das comunidades e grupos; livro de registro das celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da natureza, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social; livro de registro das formas de expressão, onde serão inscritas práticas literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; e livro de registro dos lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas”.

Portanto, agora há um livro a mais, que é o de registro de lugares, como na lei federal. Além disso, o projeto institui o Programa Estadual do Patrimônio Imaterial do Espírito Santo, a Política Estadual de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial do Espírito Santo, a Política Estadual de Registro do Patrimônio Vivo Capixaba e a Política Estadual de apoio a Festas e Celebrações do Patrimônio Imaterial do Espírito Santo.

O PL divide os bens culturais de natureza imaterial em quatro grupos: bens culturais de natureza imaterial, comunidade, grupo e tradição. O primeiro trata das “práticas, representações, expressões,
conhecimentos e técnicas tradicionais com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes
são associados que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte
integrante de seu patrimônio cultural, que se transmite de geração em geração e é constantemente
recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de
sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo para promover o
respeito à diversidade cultural e à criatividade humana”.

Comunidade é a “rede de laços interpessoais que proporcionam sociabilidade, solidariedade,
apoio, afeto, partilha de interesse, valores, princípios, símbolos, informações, senso de integração e
identidade social baseado em práticas, costumes e tradições culturais”. Grupo abarca “coletivo de pessoas reunidas em torno de elementos comuns circunscritos culturalmente”. Por fim, tradição, segundo o PL, está “fundamentada na memória coletiva das comunidades e grupos, significando crenças, rituais e práticas simbólicas, integradas, continuadas, constantemente reiteradas, recriadas e atualizadas, mantendo um vínculo do presente com o passado atravessando gerações”.

O PL foi aprovado com uma emenda da deputada estadual Iriny Lopes (PT), que inclui um representante da Assembleia Legislativa no Conselho Estadual de Cultura. A votação do projeto foi reivindicada pela sociedade civil, em especial a Associação de Folclore de Conceição da Barra, do norte do Espírito Santo. Em suas redes sociais, a entidade defendeu não somente a votação do PL 806/2025 ainda este ano, mas também a do PL 174/2025, que institui a Política Estadual de Cultura Viva (PECV). Contudo, ainda não há previsão de votação da segunda proposta.

Os dois projetos, defendeu a associação, “visam a garantia do pleno exercício dos direitos culturais, oferecendo aos fazedores culturais capixabas os meios e recursos necessários para produzir, registrar, gerir e difundir suas práticas culturais de base comunitárias, respeitando as especificidades territoriais e temáticas que se manifestam em nosso Estado”.

O projeto da Política Estadual de Cultura Viva, segundo a proposta, “se consolida como política pública de base comunitária, territorial e/ou temático-identitária, favorecendo o exercício da cidadania pelos diversos indivíduos, grupos e segmentos sociais, entendendo o acesso à cultura como uma das condições fundamentais para o desenvolvimento humano, social e econômico-sustentável”.

De acordo com a deputada Iriny Lopes, a matéria aprovada nessa segunda regimenta o que é patrimônio material e imaterial. A PECV, por sua vez, garante orçamento. Este último chegou à Assembleia em março deste ano, com aprovação do regime de urgência. Contudo, a Comissão de Cultura pediu vistas diante da necessidade de maior diálogo com os agentes da cultura popular. Em outubro voltou a tramitar, mas o presidente da Casa de Leis, Marcelo Santos (União) retirou de pauta, “até que sejam consolidadas as informações pertinentes junto aos órgãos competentes do Poder Executivo Estadual”.

A iniciativa levou em consideração “manifestações de parlamentares que apontam a necessidade de complementação de informações acerca de dispositivos do Projeto de Lei nº 174/2025, que institui a Política Estadual de Cultura Viva – PECV” e que “a obtenção de esclarecimentos técnicos e jurídicos é indispensável para a regularidade do processo de apreciação da matéria”.

A retirada de pauta foi feita após o deputado estadual Lucas Polese (PL), em suas redes sociais, fazer ataques ao projeto. No vídeo, ele se dirige a “pais, mães, cristãos e famílias capixabas”. “Dentro do texto dessa nova lei tem duas coisas que a gente não pode permitir que sejam aprovadas. A primeira é que vai tratar a prática de religião de matriz africana, não como uma prática religiosa, mas como uma prática cultural. Vai tratar também os praticantes como se fosse uma etnia. Eles já deram até uma terminologia: povos de terreiro. Tipo povos originários ou povos quilombolas”, disse.

O deputado prossegue: “esse é um primeiro passo para sabidamente escancarar uma porteira. As consequências e desdobramentos dessa política são muitos, como repasse financeiro do governo para terreiros, coisa que o Estado laico não permite para igrejas, ou a possibilidade de política de cotas para eles, já que eles são um povo, né? Ou pior, já que não é religião, é cultura, podem abordar essa temática na escola, já que não é doutrinação religiosa”. O parlamentar também apontou “ativismo LGBT como cultura”. “Burlam a lei anti gênero recentemente aprovada no Estado e vão enfiar isso na cabeça do seu filho na escola sem você ter o que fazer”, disse.

Avanços

O secretário da Associação de Folclore de Conceição da Barra, Jefferson Gonçalves, destaca os avanços que o PL 174/2025 podem trazer. Um deles é no artigo 20, no qual consta que “a Secult fica autorizada a transferir recursos financeiros por meio de editais públicos aos programas, projetos e ações da PECV”, o que, aponta, é uma possibilidade de medidas como remunerar mestres da cultura popular. Aponta, ainda, o artigo 6º, que tem como uma das previsões a apresentação anual, ao Comitê Gestor, de um plano de metas e investimentos a serem destinados ao PECV para o ano seguinte e divulgá-lo à sociedade civil. Para ele, trata-se de um avanço por ser uma iniciativa que vai possibilitar mostrar onde será o investimento e em qual ano.

“Garante previsibilidade para quem trabalha na cultura e o Comitê Gestor é uma importante esfera de discussão da política pública de cultura”, diz. Jefferson também considera importante a promoção da interculturalidade, prevista no artigo 8º, que trata dos eixos estruturantes da PECV.

Ao todo, são 26 eixos, abarcando segmentos como artesanato; circo; carnaval; hip hop; literatura; e direitos da mulher, da comunidade LGBTQIA+, das Pessoas com deficiência (PCDs), de crianças, adolescentes, jovens, idosos, quilombolas, povos de terreiro, indígenas e ciganos. “Mostra que todos os segmentos da cultura serão contemplados”, completa.

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