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A colcha de retalhos

Neste final de 2015, quatro livros novos nos trazem ricas informações sobre o universo musical brasileiro, essa colcha de retalhos rítmicos que recobre o território brasileiro, do baião nordestino à milonga sulina, do chamamé ao carimbó, do rasqueado à rancheira e ao vanerão, mais o samba e o choro, a moda de viola e a lambada, o congo e o maçambique, o tango e a guarânia.
No Sul, saiu em outubro ESSE TAL DE BORGHETTINHO (Editora Belas Letras, de Caxias do Sul), livro do jornalista Márcio Pinheiro sobre o gaiteiro Renato Borghetti. A partir do sucesso do músico ancorado na música regional gaúcha, o livro fala sobre a música gaúcha em geral, citando desde o maestro Radamés Gnatalli até Lupicínio Rodrigues, passando por Pedro Raimundo, Teixeirinha, Tio Bilia, os irmãos Bertussi, Luiz Carlos Borges, Vitor Ramil e Elis Regina. E traça um panorama da renovação trazida pelos festivais municipais de música a partir da Califórnia da Canção Nativa de 1971 em Uruguaiana. Esse Tal de Borghettinho (um título muito feliz) preenche uma lacuna e abre caminho para o melhor entendimento da rica variedade musical sulina, que chega a ter mais conexões com a cultura argentina e uruguaia do que com a MPBrasileira.
Ainda em Porto Alegre, acaba de sair ELIS – Uma Biografia Musical (Arquipélago Editorial), escrito pelo músico e jornalista Arthur de Faria. O domínio das linguagens escrita e musical permitiu ao autor fazer uma leitura sutil dos bastidores dos discos, gravações e shows da cantora que se criou em Porto Alegre e morreu em São Paulo de uma overdose de cocaína aos 36 anos, em 1982, após uma carreira brilhante mas, ainda assim, marcada por altos e baixos.  
No Rio, foi lançado pelo cronista Ruy Castro A NOITE DO MEU BEM, enquadrando o samba-canção como um gênero nacional alheio ao bolero. Ruy é mineiro adaptado ao Rio. Escreve com graça e gosta de detalhar episódios que servem como canais de esclarecimento histórico. Depois de livros sobre a bossa nova, Nelson Rodrigues e Garrinha, Ruy conta como se desenvolveu a música nas boates do Rio do pós-guerra e pós-cassinos. Onde todo mundo pensa que só havia bolero, aí nasceu o samba-canção. O título é uma referência explícita a uma canção dor-de-cotovelo composta por Dolores Duran, que tinha uma paixão mal correspondida pelo cronista Antonio Maria. Tempos românticos e trágicos aqueles. 
Finalmente vem de São Paulo o livro MÚSICA CAIPIRA, do veterano repórter José Hamilton Ribeiro, especialista em cultura rural. Segundo Zé, a música caipira tem 22 ritmos diferentes.  Em artigo na Folha de S. Paulo, o jornalista Marcelo Tas lembrou que muita gente ainda confunde a música caipira com a sertaneja e ambas com o forró universitário ou o country americano adaptado ao rodeio de Barretos. A música caipira tem origem em trabalhos rurais. Era com ela que os trabalhadores se entretinham enquanto faziam a colheita ou processavam alguma tarefa na roça, no curral, no terreiro ou no galpão.
Somente em 1929 a música caipira foi levada para o rádio por Cornélio Pires, um pesquisador antenado para a realidade do interior. Nessa época o Brasil começava a consumir em discos o samba do Rio e o tango de Buenos Aires. No meio do caminho entre as duas maiores capitais sulamericanas, Porto Alegre fazia as primeiras gravações da música regional, que poderia ter se chamado caipira sulina, mas foi denominada música regional gaúcha, música gaudéria ou musica nativa sulriograndense. Embora identificada como gaúcha ou sulriograndense, ela se abriu para a influência dos países vizinhos. Hoje a vanera, a rancheira, a milonga, o tango, a chacarera e o chamamé estão integrados à realidade musical do Rio Grande do Sul. Com a intensa migração de gaúchos para outros estados, essa música vem se tornando mais conhecida em grande parte do Brasil.    
Quanto a isso, vale lembrar o livro MODA DE VIOLA – Ensaio de Cantar Caipira escrito nos anos 1990 pelo professor paulista Romildo Sant’Anna, que lecionava na Unesp de São José do Rio Preto. Seu estudo remete a moda de viola às raízes do Brasil colonial. 
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Montado na égua madrinha, que levava um cincerro no pescoço, eu ia puxando a tropa de burros sem precisar olhar pra trás, bastava escutar o barulhinho dos cascos na estrada: aquele troctroc  era música pra mim”.
Angelo Domingo Pretto, tropeiro nascido em 1932 no interior de Lajeado, RS

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