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A escada da vida

Sempre à caça de simbologias que justifiquem ou expliquem seus delírios, o homem criou os andares superiores, e consequentemente, as escadas –  singelos desníveis para subir ou descer que se tornaram exemplo  de sucesso ou de grandeza. Uma rampa resolveria, mas foi a escada que melhor representou nosso afã de subir na vida.
 
Seja  um modesto aumento de salário ou a glória imortal, pra cima é que se anda, e o céu é o limite. Descer é a queda, a perda de vantagens e posição; o inferno é o limite. Nos filmes antigos as grandes divas se apropriaram desses contextos e souberam explora-los como ninguém,  sempre exigindo uma bela escadaria  onde deslumbrariam o mocinho e o mundo.
 
A rainha das escadas foi Beth Davis.  Quase todos os filmes da malvada tinham uma escadaria imponente, onde,  contrariando as leis da gravidade, ela descia para a glória… passageira, porque já se sabia que a bela se daria mal no fim. E que mulher, em sã consciência, usaria aqueles suntuosos vestidos esvoaçantes para o chá das cinco?
 
No filme Crepúsculo dos deuses, mais realista, Gloria Swanson também desce uma escadaria, mas para mergulhar em  seu triste fim.  Em outro filme que não poupou simbologias, Orfeu no Carnaval,  a descida de uma interminável escadaria indicava a descida ao inferno, onde Orfeu foi buscar sua Eurídice. Pena que ele olhou para trás, mas se tivesse resistido não se criaria o mito.  
 
Os filmes modernos eliminaram as escadarias ou ando eu menos atenta a tais detalhes? A vida acelerou o ritmo e os espaços sociais encolheram, e hoje os maus momentos ou a decadência são antecipados por relâmpagos e trovoadas, bem mais fáceis de serem simuladas nos estúdios. O aluguel das locações está muito caro.
 
Subir, no caso, tem infinitas conotações, tão variadas são as raças e as ambições humanas. Para João, basta o cargo de gerente na padaria da esquina; para Maria, ser a síndica do edifício onde mora, em Maruípe, é a glória. Dona Laura, 15 anos ocupando a posição, não abre a vez pra ninguém.   E tem o ajudante de pedreiro, que quer ser pedreiro; e o pedreiro que quer ser o dono da obra; e o dono da obra que quer ter a casa mais bonita da rua.
 
Dá pra pôr mais uma escada, pergunta o dono da obra. O  pedreiro diz que sim, mas tem que ajustar o preço. E chama o ajudante, Vai comprar mais cimento. O ajudante diz que sim, mas quer um aumento também, afinal, quem carrega peso é ele. Um dia de trabalho é desperdiçado nos acordos financeiros dessa empreitada, e ao final  todos ficam felizes – todos eles, de acordo com a percepção de cada um, subiram mais um degrau na escada da vida.   

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