sábado, agosto 2, 2025
15.9 C
Vitória
sábado, agosto 2, 2025
sábado, agosto 2, 2025

Leia Também:

A jabuticaba capixaba

Nas suas relações federativas com o governo federal, o Estado do Espírito Santo produziu uma genuína jabuticaba capixaba. Esta jabuticaba foi produzida ao longo dos anos recentes basicamente por uma aliança entre as elites políticas capixabas e a linha editorial (sobre o tema) da Rede Gazeta. Na essência, ela consiste na insistência – que virou um mantra – em dizer e repetir “ad nauseam” que o governo federal não só não investe no estado como também não dá atenção e prioridade ao Espírito Santo. Tem até um provinciano “visitômetro” que computa o número de visitas dos presidentes ao Espírito Santo. Nesta métrica, Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff teriam sido sofríveis. E Lula teria sido o campeão das visitas.
 
Sucessivas matérias na Rede Gazeta convergem para esta jabuticaba. Sucessivos discursos e falas de governadores do estado também. E sucessivas e repetitivas falas de integrantes da bancada federal capixaba também vão nesta direção. Principalmente em períodos eleitorais. Virou até bandeira de luta política e luta eleitoral. Na verdade, esta jabuticaba protege as sucessivas bancadas federais e os sucessivos governadores do fato puro e simples de que a diplomacia federativa capixaba tem sido recorrentemente ineficaz, equivocada, tímida, isolacionista, arrogante e, por que não dizer, perpassada por nossa já lendária “teoria do caranguejo”. Além de não corresponder aos fatos.
 
Só para exemplificar, sem fazer uma lista exaustiva, vamos à algumas ações relevantes do governo federal no Espírito Santo: antecipação dos royalties, que permitiu ao primeiro governo Paulo Hartung fazer um ajuste fiscal e governar sem a espada da instabilidade; investimentos em geração e transmissão de energia, que permitiram ao estado melhorar o seu balanço energético; implantação dos programas Luz para todos e Bolsa Família e do PRONAF , todos voltados para a população de baixa renda e o pequeno agricultor; dragagem do Porto de Vitória; escolas técnicas e Pronatec, importantes para a educação profissionalizante; investimentos da Petrobras na cadeia produtiva do petróleo&gás; financiamentos produtivos do BNDES; programa Minha casa ,minha vida; royalties e participação especial do petróleo, hoje fontes de receitas muito importantes para o estado; e vários outros.
 
A métrica, equivocada, utilizada pelos produtores da jabuticaba capixaba para afirmar que os investimentos são pequenos é a do Orçamento Geral da União e das Emendas da bancada federal. Aqui, o estado sai mesmo perdendo. Mas por que sai perdendo? Porque,exatamente, a diplomacia federativa e a ação da bancada federal do Espírito Santo são ineficazes. Por que estados menores ou menos relevantes, do ponto de vista econômico, do que o Espírito Santo, como Alagoas, conseguem mais? Porque têm uma diplomacia federativa mais eficaz do que o Espírito Santo. Simples assim.
 
Existe também a métrica da chamada “agenda velha”, a do aeroporto, da BR 262 e do Porto de águas profundas. Mas quem parou a obra do aeroporto não foi o governo federal, foi o Tribunal de Contas da União. E a diplomacia federativa capixaba não conseguiu reverter a tempo este problema que se arrastou e se arrasta. Quanto à BR 262, o leilão para a concessão à iniciativa privada deu “vazio” porque o governador Renato Casagrande (PSB) e membros das bancada federal afirmaram à imprensa regional e nacional que eram contra o pedágio, o que criou um ambiente de insegurança jurídica e afastou as empresas da disputa. Simples assim. Embora grave.
 
Aliás, hoje o Espírito Santo é visto com reservas por investidores nacionais e internacionais , por causa da perspectiva de insegurança jurídica criada com a quebra do contrato de concessão da rodovia do sol ; das afirmativas sobre o pedágio potencial na BR 262; e das resistências ainda existentes ao pedágio na BR 101. Tido nacionalmente até pouco tempo como uma espécie de “tigre asiático”, hoje o estado do Espírito Santo é visto como tendo piorado o seu clima para negócios.
 
E aí vem o Porto de águas profundas, ideia positiva e necessária de “Porto HUB” que vem desde o governo Albuino Azeredo. Aqui, foi a “teoria do caranguejo ” que atuou. Durante todos estes anos, os capixabas não conseguiram chegar a um consenso sobre a melhor localização para o Porto. No governo Vitor Buaiz a ideia era a localização em Barra do Riacho. Foi bombardeada. Depois, passaram-se os anos e desenvolveu-se uma disputa entre localizar na Serra ou em Vila Velha. Quando a presidente Dilma lançou, no final de 2012, o novo março regulatório e os novos investimentos em terminais, o governo federal queria incluir o Porto de águas profundas nas prioridades. Mas até então os capixabas ainda não tinham se entendido sobre a localização. E o Porto acabou não entrando na lista de prioridades. Simples assim. Embora também grave.
 
Pois bem. O governador eleito Paulo Hartung (PMDB) teve uma vitória eleitoral legítima para um terceiro mandato, que o credencia a formar uma nova coalizão de governo. Mas o candidato que Hartung apoiou na eleição presidencial, Aécio Neves, perdeu as eleições, embora por pequena margem. Com Aécio, Hartung certamente teria melhores possibilidades de exercer uma diplomacia federativa eficaz para o estado . Mas isto não significa que ele não possa fazer o mesmo com a presidente Dilma Rousseff. As relações e afinidades pessoais e políticas ajudam, mas as relações federativas devem ter, sobretudo, um caráter político-institucional.
 
Para caminhar nesta direção, a de uma nova diplomacia federativa que tenha eficácia nos mandatos de Hartung e Dilma, Paulo Hartung vai precisar começar por decifrar este enigma da jabuticaba capixaba nas relações federativas. Ele começou bem. Novo dia seguinte ao da reeleição da presidente postou-se com altivez e, embora um pouco acima do tom, na fronteira da arrogância, que não é do estilo dele, declarou que esperava da presidente atenção às agendas de interesse do Espírito Santo, dentre elas as do aeroporto, da BR 262 e do Porto de águas profundas. É isto: uma agenda, com projetos bem elaborados, é o início de tudo.
 
Uma boa diplomacia federativa não pode deixar de ter boas ideias, bom “direito” e bons projetos. Não pode ser pontual, fragmentada, isolada, insulada e reativa como até agora. Tem que ter proatividade permanente e visão estratégica e de conjunto. Tem que ter sinergia com os objetivos nacionais permanentes e com as prioridades do governo federal. Tem que acumular parcerias e “cumplicidades” : com outros estados, com outras bancadas, com entidades de classe, como a Findes e a CNI, por exemplo, com personalidades formadoras de opinião, com a mídia nacional e, não menos importante, com a iniciativa privada.
 
É de conhecimento público que , no final de 2013, a presidente reuniu-se no Palácio do Planalto com o agora governador eleito Paulo Hartung e com o senador Ricardo Ferraço, que na época também era cogitado como pré-candidato do PMDB à governador do Espírito Santo. Nesta reunião, que foi longa, Hartung e Ferraço defenderam uma longa e articulada Agenda para o Espírito Santo. Esta mesma agenda poderia ser o início da nova diplomacia federativa de Hartung.
 
Hoje, as circunstâncias são favoráveis à construção de novas relações federativas entre o Espírito Santo e o governo federal. A presidente reeleita sabe que precisará praticar o diálogo e a negociação permanentes com todas as força sociais, empresariais e políticas do país. E que, neste novo contexto de novas reformas, inclusive a política e a tributária, vai precisar, e muito, de diálogos federativos com os novos governadores.
 
É neste contexto de necessidade do diálogo federativo que Hartung poderá praticar uma nova diplomacia. Decifrando o enigma da jabuticaba. Ainda mais porque, não fosse apenas pelas reformas política e tributária, a presidente vai ter, também, que repactuar as relações federativas nas áreas de segurança, educação, saúde e mobilidade urbana, pelo menos, redefinindo e renegociando responsabilidades administrativas e financeiras: quem fará o que com quanto ?
 
Com altivez, mas com disposição para um diálogo que se mostre desarmado do preconceito da jabuticaba capixaba, Paulo Hartung, com sua reconhecida visão estratégica, poderá liderar um processo de reconstrução e modernização das relações federativas capixabas. Sem complexo de inferioridade, sem timidez, sem isolacionismo. E afastando a síndrome do caranguejo ….
 
O Brasil precisa do Espírito Santo. E o Espírito Santo precisa do Brasil. Parece uma frase ingênua, pueril e de efeito. Mas não é. A base de tudo é o diálogo que procure convergências de interesses do país e do estado, no contexto do pacto de poder vigente e em permanente movimento. Fora disso, vira uma sucessão de monólogos improdutivos que podem, aí sim, perpetuar a jabuticaba capixaba. E isolar ainda mais o estado do Espírito Santo.

Mais Lidas