Sábado, 20 Abril 2024

​A simbologia do Natal

Hoje sabemos que o Natal, como a data de nascimento do menino Jesus, é convencionado e não preciso. Isso decorre, até mesmo, da dificuldade de conciliação de Jesus dentro da história em seus conflitos com a religião, o dogmatismo e o simbolismo. Contudo, temos tantas histórias de crianças que vão ser registradas muito depois de nascidas, nesse nosso país de dimensões continentais, que valeria questionar a importância da imprecisão na data de nascimento, mesmo que de um personagem dessa magnitude.

Por outro lado, é na representação simbólica do Natal, em que o Rei nasce na humildade de uma manjedoura, afastado da cidade e sem registro oficial de seu nascimento, que se espelha uma majoritária população que vive em confronto com os valores da sociedade, que não se sente pertencente, que já nasce indesejado – fato explícito nas discussões burguesas da significância da prole dos menos favorecidos em jargões como "pobre adora fazer filho" – e passa a vida sofrendo as consequências de sua origem.

Enquanto o paradigma do Cristo chama à reflexão dos valores do ter em detrimento do ser, o ajuste social para sua elaboração tergiversou toda a mensagem. Transformou a data em "comemorativa", não da revisão na hierarquia dos valores do ter para o ser, mas para afirmação e exaltação dele, o ter, seja com as trocas de presentes ou pela cultura de uma ceia bela e farta, quando muito, complementada pela sensação de alívio da indiferença do cotidiano, com a possibilidade de expansão desse espírito solidário que pratica a "doação" a um ou outro desvalido da sorte e do amparo social.

Presentes para as crianças mantendo o anonimato das "cartinhas para Papai Noel dos Correios" que evitam o contato com a criança que recebe, ou cestas básicas/natalinas aos desvalidos, empregados, etc., que reafirmam a solidariedade, não como uma prática, mas como uma forma de manter a bolha da alegria e fartura para "os seus" com o desencargo na consciência pela doação.

É claro que essas ações, mesmo pontuais nas datas de apelo solidário como o Natal, trazem uma analgesia àqueles que todos os dias enfrentam a dificuldade de se manterem dignos. Contudo, a vida não se faz só no Natal, o apelo comercial selvagemente capitalista não vislumbra a reflexão, e trata de embrutecer ainda mais o egoísmo pela sensação de alívio da consciência na ação pontual.

Mais que datas é preciso compreender percursos de vida, acompanhar, reparar bem, respeitar, assistir, fortalecer e conviver dentro da dignidade humana como iguais, repartindo o pão, mas não só o pão físico, e sim a vida em sua plenitude de direitos, desde os direitos humanos elementares até os sociais, devidos por um Estado que já em sua concepção, preocupa-se com a propriedade e sua defesa ao invés da promoção da integração, harmonia e felicidade do seu povo.

Acima de tudo, que ao "Feliz Natal" seja incorporado a "Feliz Vida" que o simbolismo cristão, do nascimento do salvador, em suma, indica.


Everaldo Barreto é professor de Filosofia

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