Sexta, 03 Mai 2024

Armadilhas do desenvolvimento

 

No Espírito Santo, principalmente durante os dois governos de Paulo Hartung (2003 – 2010), a justificativa do desenvolvimento a qualquer custo permitiu que as grandes empresas conseguissem, com certa facilidade, as licenças ambientais necessárias para ampliar suas plantas poluidoras. É caso, por exemplo, das mineradoras, que trazem uma série de malefícios à saúde da população da Grande Vitória, que respira um ar de péssima qualidade. 
 
A promessa de emprego é sempre o primeiro apelo usado pelos empresários para justificar os inevitáveis impactos ambientais e sociais que um empreendimento pode causar a uma determinada comunidade. 
 
Quem não se recorda do que ocorreu em 2010, quando a Vale anunciou uma monumental parceria com Baosteel para instalar a Companhia Siderúrgica em Ubu (CSU)? À época, os impactos sociais e ambientais da megasiderúrgica foram ignorados. O discurso do poder público e dos empresários martelou na opinião pública que o empreendimento geraria emprego e renda e, consequentemente, desenvolvimento para o Estado.
 
Se o projeto com os chineses não tivesse naufragado em função da crise econômica mundial e da queda do valor do aço no mercado internacional, todas as licenças ambientais necessários para tirar o projeto do papel seriam concedidas facilmente. Afinal, era o futuro do Estado que estava em jogo. Não é verdade?
 
O projeto de expansão do Shopping Vitória também recorre ao apelo da geração de empregos como justificativa para promover as mudanças que forem necessárias no Plano Diretor Urbano (PDU), que hoje impediria a consecução do projeto. 
 
Os dois principais jornais impressos do Estado (A Gazeta e A Tribuna) apresentaram o projeto de expansão do shopping como algo definitivo na edição desta sexta-feira (9). As manchetes dos dois jornais estampam a quantidade de empregos que serão gerados com o empreendimento, com data de conclusão prevista para 2014. 
 
A hipocrisia está no fato de a prefeitura de Vitória e o grupo de empresários marcarem uma audiência pública para apresentar o projeto à comunidade, como se a opinião da população fosse valer alguma coisa. As matérias de página inteira com ilustrações gigantes das maquetes da Ala Marina – nome de batismo da área que será expandida -, induzem o cidadão a comprar o projeto como algo extremamente positivo para a cidade. Ninguém está interessado em discutir nada. Eles só querem mostrar o projeto para, no final, receberem os aplausos da população.
 
Do contrário, qual clima haveria na audiência pública do próximo dia 13, para que um dos participantes levantasse a mão e questionasse, por exemplo, os impactos urbanos que o empreendimento trará à região? Nenhum. A audiência pública, em vez de atender às demandas da população, terá o papel estratégico de legitimar o projeto, que terá o selo de aprovação popular. 
 
Mais que isso, a aprovação do projeto de ampliação do Shopping Vitória tem também a função estratégica de ressuscitar um projeto maior, que é a construção de torres residenciais com pelo menos 32 metros de altura cada. O presidente do Grupo Buaiz, Américo Buaiz, já adianta que a segunda parte do projeto, as torres residenciais, não vai empatar a vista do Convento da Penha. 
 
A deixa de Buaiz é um recado aos órgãos que embargaram há alguns anos o projeto Nova Cidade (Water Front), que previa a construção de 13 edifícios com 57 metros de altura cada na área adjacente ao Shopping.
 
Desta vez, com um projeto mais “humilde” – metade da altura do anterior -, e com a aprovação da população, ele pretende tirar o projeto de seus sonhos do papel. 
 
A complexa discussão sobre os impactos do empreendimento à região, que será levada para a audiência pública, Buaiz resumiu à vista ao Convento da Penha. “De fato precisamos discutir, trata-se de uma das últimas áreas livres da Ilha, mas eu, como empreendedor, preciso saber qual filosofia seguir. A nossa proposta é essa”, declarou ao jornal A Gazeta. 
 
A mensagem implícita é óbvia: “a nossa proposta é dar prosseguimento ao nosso projeto custe o que custar”. A audiência pública é só para inglês ver. 
 

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