Terça, 23 Abril 2024

Bem-vinda a primavera

 

Em seu livro Os Brasileiros (Vozes, 1978), o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) concluiu que não passariam de cinco os grandes tipos do nosso povo. Seriam eles:
 
- os caipiras, no interior paulista e redutos de Minas e Goiás;
 
- os sertanejos, no nordeste árido;
 
- os caboclos, nos sertões da Amazônia;
 
- os crioulos, no litoral do Rio ao Nordeste;
 
- os gaúchos, nos campos do Sul.
 
É uma boa divisão, toda ela com raízes rurais, mas o próprio Tio Darcy abriu exceções ao lembrar que em cada categoria há subtipos. Entre os gaúchos, por exemplo, há os pelos-duros (descendentes de guaranis com portugueses ou espanhóis) e os gringos (descendentes de alemães e italianos).
 
Darcy também não mencionou os serranos, que seriam os caipiras das serras e montanhas, mas o que importa nesta crônica é perguntar como o fundador da Universidade de Brasília pode ter deixado de lado os urbanos, esses seres bizarros, gregários, medrosos, irresponsáveis e que não sabem viver longe das farmácias?  
 
Os urbanos não são um tipo só. Cada cidade tem o seu. Temos no Brasil uma variedade enorme: os capixabas, os cariocas, os paulistanos, os campineiros, os santistas, os curitibanos, os manés de Floripa, os soteropolitanos, os pelotenses, os papareias, os manauaras, os brasilienses e os goianos, para ficar nos mais notórios.
 
Nem precisamos recorrer a outros tipos urbanos mais famosos, como os londrinos, os parisienses, os madrilenhos ou os portenhos de Buenos Aires para provar que é em nome dos urbanos, maioria no planeta, que se praticam tantos crimes ambientais, tantos atos lesivos ao futuro da humanidade.
 
Aqui é o desmanche dos ecossistemas, ali a aplicação de venenos nas lavouras e em todos lugares o lançamento de lixo na natureza. De crime em crime, vamos estreitando o espaço para a sobrevivência da flora e da fauna.
 
Nessa batida, nem nos damos conta dos pequenos absurdos da vida urbana. Tome-se o caso exemplar da vegetação de nossas ruas.
 
Com todo o desenvolvimento da agronomia, da engenharia, da geologia, da biologia e da ecologia, quem continua a plantar árvores de grande porte como os ipês, os paus-ferro e as sibipirunas embaixo da fiação elétrica?
 
Quem reserva pequeninos buracos nas calçadas para o desenvolvimento das árvores?     
 
Quem, depois dessas medidas irracionais, realiza podas bárbaras para proteger os fios do telefone e da eletricidade?
 
Sim, são os urbanos, os insensíveis urbanos. No entanto, ano a ano, diante da estupenda floração das árvores presentes em nossas calçadas, me pergunto quando vamos aprender a efêmera lição anual dos ipês roxos, abrindo seu manto lilás em pleno mês de agosto.
 
Como os urbanos não se comovem com a humilde laranjeira, que insiste em perfumar a avenida com sua copa verde salpicada de botões brancos?
 
As árvores nas praças, calçadas e canteiros das avenidas são um bálsamo para os urbanos. Elas amenizam a paisagem, dão flores e frutos, põem perfumes no ar, oxigenam a atmosfera, captam gás carbônico, atenuam a poluição sonora. 
 
Como o homem urbano se arvora em defensor da natureza se não cuida direito das árvores de sua rua?
 
LEMBRETE DE OCASIÃO

 
“Ultimamente, a coisa se tornou mais complexa porque as instituições tradicionais estão perdendo todo o seu poder de controle e de doutrinação. A escola não ensina, a igreja não catequiza, os partidos não politizam. O que opera é um monstruoso sistema de comunicação de massa fazendo a cabeça das pessoas. Impondo-lhes padrões de consumo inatingíveis,
desejabilidades inalcançáveis, aprofundando mais a marginalidade dessas populações e seu pendor à violência.”
Darcy Ribeiro, em O Povo Brasileiro, Cia das Letras, 1995, 2ª ed.

Veja mais notícias sobre Colunas.

Veja também:

 

Comentários:

Nenhum comentário feito ainda. Seja o primeiro a enviar um comentário
Visitante
Quarta, 24 Abril 2024

Ao aceitar, você acessará um serviço fornecido por terceiros externos a https://www.seculodiario.com.br/