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Conferência de nuvens

De tudo um pouco, ou quase nada – como um haikai

Anônima, espiando atrás da cortina quando o sol mal desponta, vejo a garota passar correndo como se fosse apagar o incêndio. Onde vai com tanta pressa? De longe, ela é linda de se admirar, navegando sobre seu impecável tênis branco, a malha justa no corpo bem torneado, provavelmente com uma dessas etiquetas que suportam os grandes eventos esportivos.

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Cabelo longo e louro preso num rabo de cavalo, no ouvido um minúsculo aparato transmitindo o som da moda. Depois dela passa o casal de meia-idade, ou idade e meia. Devagar, de mãos dadas, trajes desbotados pelo muito uso. Pele escura, curtida, cabelos brancos. Devagar e sempre, eles e a garota terminarão a empreitada ao mesmo tempo. Depois deles chega a meninada mais jovem, comumente chamada de estudantes. Tão bonitinhos!

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Eles se reúnem na entrada do condomínio aguardando o ônibus escolar. Sentam no meio-fio e tiram das mochilas os celulares de última geração. Não brincam, não cantam nem dançam, raramente conversam, e provavelmente estão todos vendo o mesmo programa: um jogo eletrônico ou um dos seriados da moda. O “amarelinho” os recolhe: cor amarela padronizada e o mesmo modelo usado há mais de cem anos. Some na curva e o dia fica menos bonito.

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Depois dele passa o jovem casal a caminho do trabalho – suponho. Ela de bicicleta, ele de patins, mochila cheia nas costas – Corre ou vão chegar atrasados! De repente um relâmpago risca o céu: vence o sol ou vence a chuva? No outono as chuvas são raras. Outro relâmpago corre no ar a uma velocidade de 360 mil km/hora – um terço da velocidade da luz. Atrás dele vem o trovão, a 100 km/hora, o preguiçoso!

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De tudo um pouco, ou quase nada – como um haikai. Esse risco de luz no céu é responsável por cerca de 2.000 mortes por ano. O lugar que tem mais relâmpagos no mundo é o Lago Maracaibo, na Venezuela: cerca de 250 por dia. De repente, outro relâmpago! O sol se rende, se escondendo atrás das massas de vapor que flutuam no ar como pássaros obesos se aproximando uns dos outros: Conferência de nuvens! 

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Ninguém mais passa e os carros são os donos da rua. Fecho a janela e vou cuidar da vida, antes que a vida cuide de mim. Deu até vontade de arriscar um haikai: Brilha o sol, gente na rua/um relâmpago risca o ar/rua vazia.

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