Gastar sem responsabilidade é sempre fácil, divertido e prazeroso. Mas esse é um privilégio para poucos. No Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), dinheiro nunca foi problema, mas solução. As engrenagens da Justiça sempre viraram mais macias quando estiveram bem azeitadas pelo “faz me rir”. O governador Paulo Hartung quem o diga.
Nos dois primeiros mandatos do peemedebista (2003 a 2010), como se diz popularmente, o tribunal lavou a égua. Se em 2004 o orçamento da Corte era de R$ 360 milhões, em 2010, último ano do segundo governo Hartung, saltou para R$ 647 milhões. Um aumento de 80%.
Na gestão de Renato Casagrande (PSB) o cofre do governo continuou despejando dinheiro no tribunal. Em 2014, último ano do governo socialista, o orçamento do TJES rompeu a barreira do bilhão. Isso mesmo, os “capas-pretas” não tiveram dificuldade para gastar R$ 1.009.534.578 no ano passado.
Mas a época das vacas magras chegou. O mesmo Hartung que financiou a gastança desenfreada do tribunal durante oito anos, fechou o cofre para balanço em 2015 e jogou as chaves fora. Decretou a política de austeridade como meta número um do seu governo e aconselhou que os Poderes seguissem sua receita.
O TJES não levou o alerta a sério. Mesmo sendo obrigado a cortar em 10% (R$ 133 milhões) do orçamento 2015, a cúpula da Corte confiou que na hora H o dinheiro apareceria. Afinal, sempre foi assim.
Mas o socorro não veio. Para piorar, este ano os servidores do Judiciário pressionaram o tribunal reivindicando reajuste salarial. Eles passaram a exigir com mais veemência uma fatia mais generosa do bolo que sempre foi servido com primazia ao petit comité formado por juízes e desembargadores
Sentindo pela primeira vez que estavam com a corda no pescoço, vendo o gasto com pessoal extrapolar o teto da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o jeito foi recorrer à Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages). A entidade classista e o TJES armaram uma “pedalada fiscal” grosseira para escapar da LRF. A Procuradoria Geral do Estado (PGE) não engoliu a pedalada. Questionou, ironicamente, na Justiça, que entendeu que a manobra era ilegal. Era um sinal de que o governo poderia ajudar, mas não por um caminho tortuoso, que abriria um temerário precedente para outros “enforcados”.
Acuado, o TJES decidiu ceder. A cúpula da Corte deve ter dito a Hartung que estava disposta a seguir a prescrição do tratamento recomendado à risca para tirar o Judiciário UTI, desde que, é claro, os magistrados fossem poupados da parte dolorida do tratamento. O remédio mais amargo seria repassado aos servidores do Judiciário.
O restante dessa história teve seu desfecho nessa terça-feira (1). O governador passou a demanda para a Assembleia e 22 dos 28 deputados se dispuseram a socorrer a perdulária Corte.
Os deputados aprovaram o congelamento, até 2018, do plano de cargos e a salários dos servidores do Judiciário. O deputado Sérgio Majeski (PSDB), um dos que votaram contra a proposta, tocou no ponto. Ele disse que não era justo descontar nos servidores os excessos do TJ. “Se o Tribunal de Justiça descumpriu a LRF, por excesso de gasto, tendo sido avisado e alertado sobre isso e, mesmo assim, continuou nomeando, continuou com a gratificação, deu aumento de 14% aos magistrados, agora não pode querer que os funcionários, os servidores paguem por isso”.
Majeski, mais uma vez, está coberto de razão. Nem na época das vacas magras os magistrados querem fazer sacrifício. Cortar da própria carne, nem pensar. A Corte nababesca não está disposta a abrir mão de suas regalias. A saída foi jogar aos leões quem está no andar debaixo da pirâmide. Por ora, os leões estão saciados. Depois, não se sabe.