Para boa parte da população, a audiência pública é uma ilustre desconhecida; outros até já ouviram falar, mas ainda não criaram coragem para abandonar o conforto do sofá; uma pequena parcela de cidadãos, de outro lado, não abre mão do direito de debater com as autoridades públicas os problemas que afetam uma determinada comunidade.
O baixo quórum das audiências promovidas nos municípios, comparado a um núcleo micro, é semelhante ao desinteresse pelas reuniões de condomínio. Embora os condôminos saibam que as decisões tomadas em assembleia irão afetar diretamente suas vidas, o percentual de participação, em média, não passa de 10%.
Na audiência pública esse percentual é muito menor se tomarmos como referência a população de uma cidade. Se 10% da população da Capital comparecessem a uma audiência, a prefeitura teria que locar um estádio, e dos grandes, para acomodar cerca de 35 mil pessoas.
Na prática, sabemos que a presença numa audiência, seja em Vitória, Vila Velha ou Serra, não chega a 0,05% da população. É preciso considerar também que os temas debatidos estão restritos a determinadas comunidades. Mesmo diminuindo o universo, ainda assim a participação seria tímida. A notícia boa é que os abnegados que batem ponto nas audiências se mostram cada vez mais afiados para elevar o nível da discussão com os representantes do poder público.
Exemplos desse protagonismo cidadão não faltam. Em Vitória, só para citar um caso recente, a prefeitura está promovendo audiências públicas para debater o projeto do Centro de Eventos Vitória — complexo gastronômico e de lazer que deve ser construído em área contígua ao Aeroporto de Vitória, às margens da Avenida Adalberto Simão Nader com a Dante Michelini.
Os debates travados nas audiências, que começaram no início maio, refletem a qualificação dos participantes. Se por um lado o quórum é baixo, quem vai mostra que não está ali a passeio. Os questionamentos, na sua maioria, são bem contextualizados e trazem contribuições importantes, gerando um verdadeiro debate no sentido da palavra.
Em duas audiências, só nesta semana, as comunidades de Mata da Praia, República e Morada de Camburi debateram com a prefeitura o Plano Específico de Ordenação das Formas de Uso e Ocupação do Solo da Zona de Equipamentos Especiais 1 (ZEE 1) e o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) do centro de eventos, que vai ocupar uma área de 42 mil metros quadrados.
Sobram críticas ao projeto, mas também não faltam sugestões. Isso mostra que a população, necessariamente, não é contra o empreendimento, mas faz questão de analisar tim tim por tim tim os aspectos negativos e positivos do projeto.
Uma boa exposição de especialistas sustentada por imagens bem-acabadas exibidas num telão já não impressionam o cidadão. Hoje ele tem informações prévias para entrar na discussão de igual para igual com os agentes públicos. O cidadão quer saber dos impactos ambientais e sociais de um projeto. Até que ponto as mudanças vão afetar para melhor (ou pior) a vida de determinada comunidade.
O caminho é trabalhoso, cansativo, às vezes chega ser estressante. Mas ninguém disse que era fácil construir uma democracia. Demos um passo importante quando alcançamos a democracia representativa. Agora, o segundo passo a perseverar é a democracia participativa. E a audiência pública é uma das principais ferramentas de participação popular.

