Paulo Hartung (PMDB) tem repetido aos quatro cantos que o grande mérito do seu governo é a “fórmula de sucesso” que ele desenvolveu para enfrentar a crise econômica. Sem modéstia, ele tem dito que o seu modelo de ajuste ainda vai servir de farol para iluminar uma saída para o Brasil.
Hartung não revela, porém, o que está por trás desse “discurso vencedor”. Não diz, por exemplo, que a economia de R$ 342 milhões (2015) foi conquistada à custa da paralisação do Estado. Tampouco conta que o “sucesso” dessa política de austeridade passa por uma lâmina afiada que impõe um corte linear de 20% em todo o custeio da máquina estadual. A fúria dessa guilhotina errante tem causado estragos devastadores, sobretudo nas áreas essenciais: saúde, segurança e educação.
A educação, em especial, que foi escolhida por Hartung como seu carro-chefe na campanha ao governo e figura como principal produto da vitrine social montada para esse terceiro mandato é justamente a área que tem exposto a profundidade desse corte.
A política de educação de Hartung impôs o Escola Viva como principal programa de governo; atropelou Plano Estadual de Educação; e passou a tratar o fechamento de turmas, turnos e escolas como um mero ajuste de gestão.
O pacote, porém, causou reações na comunidade escolar, que tem exercido forte pressão sobre o governo. A resistência à política educacional tem sido fortemente reverberada na Assembleia pelo deputado Sérgio Majeski (PSDB), que é referência no Legislativo quando o assunto é educação.
O Escola Viva foi implantado, mas causou (e causa) muito desgaste para o governo. Um revés e tanto para um programa que foi concebido para ser a cereja do bolo na vitrine social deste governo.
Paralelamente ao lançamento das primeiras unidades do programa, o governo passou a cortar despesas na educação a todo custo. Usando a lógica mercantilista, Paulo Hartung, seguindo o modelo tucano de fechamento de escolas aplicado em São Paulo, Paraná e Goiás — a chamada “reorganização da educação” —, também passou a fechar turmas, turnos e escolas, sobretudo as unidades localizadas em áreas rurais.
O governo do Estado passou a tratar as unidades escolares como se fossem franquias de uma grande rede de lojas que atravessa uma crise financeira e precisa cortar gastos. O critério para fechamento de turnos, turmas e escolas tem obedecido a essa lógica de mercado.
Foi o que ocorreu em Muniz Freire, quando a Secretaria de Estado da Educação (Sedu) fechou três escolas na zona rural após chegar a uma conclusão bastante simples: em vez de manter 40 ou 50 alunos matriculados em cada uma das escolas, por que não fechá-las e transferi-los para uma única escola? Não importa se a mudança poderá dificultar ou mesmo inviabilizar o acesso desses alunos à educação, além de superlotar as turmas que vão absorvê-los. Dentro dessa lógica mercantilista de gestão, o que importa é a planilha de gastos fechando no azul no final do mês.
Ora, defenderia o governo: Não é financeiramente racional multiplicar os gastos por três se o Estado pode continuar oferecendo o “mesmo” serviço gastando um terço desse valor. O mesmo professor que dá aula para 20, pode perfeitamente lecionar para 40 ou 50 alunos. É só dar uma apertadinha, não é verdade?
Mas alguém vai questionar: A qualidade dessa educação não ficará comprometida? A maioria das escolas da rede pública já enfrenta problemas crônicos de infraestrutura, que comprometem a tal qualidade. A superlotação não vai piorar esse quadro?
O governo rebate: Precisamos manter só a vitrine arrumadinha. Por isso criamos o Escola Viva. O programa tem o desafio de vender o sonho de que é possível oferecer uma educação pública de qualidade.
Quanto ao fechamento de escolas, minimiza governo, eles vão fazer uma manifestação ou outra, mas depois o movimento se desarticula. Mesmo porque esses focos de resistência estão mais no interior, que não tem visibilidade.
Mas o governo se enganou. A promotora Maria Cristina Rocha Pimentel acatou os argumentos da comunidade escolar, e transformou as várias queixas que pipocavam em diversos municípios do Estado numa Ação Civil Pública contra o fechamento inadvertido de turmas e escolas. “O objetivo, ao que tudo indica, é de forçar a redução de alunos em unidades educacionais sob sua responsabilidade, tais como a junção de turmas, superlotação em salas de aula, diminuição de vagas disponíveis em diversas escolas”, asseverou a promotora.
O juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual, André Guasti Motta, se convenceu dos argumentos da promotora e determinou, em caráter liminar, a reabertura das escolas fechadas e a efetivação das matrículas que devem ser providenciadas pela Sedu em 48 horas, a partir da notificação. O magistrado também arbitrou multa diária de R$ 50 mil, até o limite provisório de R$ 500 mil, caso o Estado descumpra a decisão.
É preciso destacar o equilibrado trabalho da promotora e do juiz que agiram tecnicamente. Eles entenderam que a comunidade escolar está sendo usurpado do seu direito constitucional à educação.
Como bem frisou a diretora da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Fabrícia Barbosa, cabe agora à comunidade escolar fiscalizar o cumprimento da liminar e continuar pressionando para que a decisão liminar não seja revogada.
Refratário ao diálogo, o governo do Estado, teimosamente, segue esticando a corda. O mais curioso é que a comunidade escolar passou a debater a educação, ironicamente, na ocasião do lançamento do principal programa do governo: o Escola Viva.
A decisão da Justiça dá uma nova chance para o governo voltar atrás e reconsiderar sua posição. Paulo Hartung precisa entender que educação não é mercadoria e nem tampouco pode ser usada como chamariz da vitrine que esconde uma política educacional vazia.