A sessão desta quarta-feira (7) da Assembleia Legislativa registrou uma cena inimaginável até outro dia. O deputado Gildevan Fernandes (PMDB) deixou os colegas embasbacados ao acatar uma sugestão do deputado Sérgio Majeski (PSDB), sem dúvida seu principal obstáculo na Casa nesses pouco mais de dois anos em que esteve na liderança do governo.
A polêmica veio com o PLC 17/2017, que promove alterações em cargos do Tribunal de Contas do Estado (TCE). O projeto, que prevê o reenquadramento de servidores em cargos de nível médio para superior, sem a realização de concurso público, chegou à Casa “envelopado” e com o selo de “aprovado” pelo governo, tanto que tramitou em regime de urgência.
Majeski alertou que o texto era inconstitucional e que poderia abrir um precedente perigoso. Ele advertiu para o risco de os servidores “promovidos” recorrerem à Justiça para conquistar isonomia com os atuais ocupantes dos cargos modificados.
A crítica de Majeski era esperada, o que ninguém poderia imaginar é que Gildevan acolhesse o argumento do “eterno rival”. O deputado, relator do projeto na Comissão de Justiça, acatou parcialmente as ponderações de Majeski e elaborou emenda suprimindo o parágrafo único do artigo 4º, justamente o trecho que permitia o reenquadramento dos auxiliares de serviço em assistente técnico.
O PLC, já com a proposição de Gildevan, passou pelas demais comissões e posteriormente foi aprovado por 17 votos a dois.
O episódio que fez o ex-líder concordar (mesmo que parcialmente) com Majeski para derrubar os argumentos do atual líder do governo, Rodrigo Coelho (PDT), que tentava a todo custo defender a constitucionalidade da redação original do projeto, confirmou que a saída de Gildevan não foi bem digerida pelo deputado.
Na primeira fala que fez na Casa, após deixar o cargo, Gildevan agradeceu a oportunidade ao governo mas não conseguiu esconder seu ressentimento com a decisão. Ao fazer o balanço do seu trabalho, à ocasião, o deputado mostrou estaticamente que foi um líder eficiente, ou seja, aprovou praticamente todos os projetos do Executivo e derrubou o que o governo mandou derrubar.
Esqueceu de incluir no balanço, porém, o tamanho do desgaste que acumulou não só com os deputados que tiveram posição contrária ao governo, mas também entre os próprios governistas. Durante esses dois anos em que Gildevam respondeu pela liderança, o “não” foi a palavra de ordem repassada por Paulo Hartung para a Assembleia.Gildevan, fiel ao seu chefe. Aceitou resignado a inglória missão e defendeu os interesses do Palácio Anchieta na Casa com mais dentes do que unhas.
Como nunca teve vocação para diplomata, Gildevan, sempre que se via pressionado, distribuía cotoveladas sem olhar para os lados. O problema é que essa truculência toda deixou hematomas na relação da Assembleia com o governo.
Em véspera de ano eleitoral, o jeito mais prático que Hartung encontrou para fechar esse ciclo e mostrar que está disposto a estabelecer uma nova relação com a Assembleia foi substituindo Gildevan.
Coelho, com sua fama de “jeitoso”, é oposto de Gildevan. Tem, é verdade, exatamente a mesma missão do antecessor: manter o controle do Executivo sobre o Legislativo. Mas, agora, com uma diferença: evitar novos solavancos nessa relação.
O episódio desta quarta-feira deu a extensão do tamanho da mágoa de Gildevan, que na primeira oportunidade, não pensou duas vezes em deixar o cotovelo no atual líder, que parece ter sentido o golpe.