Quinta, 25 Abril 2024

Indecisão de mercado

 

O turista é, antes de tudo, um folgado; a turista é, antes de tudo, uma guerreira. Os homens chegam e se acomodam, querem praia e experimentar todas as marcas locais de cerveja. Querem ver as modelos desfilando nas calçadas de South Beach. Que las hay, hay, mas são difíceis de identificar – se disfarçam de pessoas comuns. O turista traz sua lista de eletrônicos, e sabe em qual loja tem o quê e a que preço.
 
Nada é tão simples no universo das turistas, mesmo porque essa tática direcionada já elimina metade do prazer da viagem. A turista vem às compras, portanto, traz o nome de todos os shoppings, que lojas tem em cada um deles, que produtos estarão em promoção no período de sua visita, todos os endereços de todas as filiais da Victoria Secret. Do aeroporto já seguem para a rota das compras, onde o céu e a restrições de bagagem são os únicos limites.
 
Miami é uma metrópole onde o esforço cultural fica totalmente invisível. Teatro em inglês? Francamente! Museus são obrigatórios na Europa, onde os preços em euro limitam a aventura consumista. Em Miami, o ato de ver, escolher, experimentar, decidir e pagar, ocupa todo o espaço permitido no bilhete de viagem.
 
Chegando ao hotel tarde da noite, pois os shopping estipulam que o horário de fechar é às nove, mas na verdade só param de atender às onze, aí encaram a dura confrontação com a realidade:
 
Será que vou mesmo usar isso? Esse vestido não está muito apertado? Não gastei demais nesse perfume? Foi mesmo uma barganha pagar dois e levar três? O que vou fazer com três telefones em forma de flamingos?
 
A estada de uma turista em Miami se divide especificamente em duas partes. A primeira é a euforia das compras, motivada pelo falso brilho dos templos de consumo e pelo falso crédito dos cartões de crédito. Os pacotes entulham o quarto do hotel e a turista perde o sono pensando no que pode estar perdendo com as lojas desativadas. Bem, nem todas. O Walmart e o Walgreens não fecham, e nelas sempre se acha algo que vem na lista de encomendas dos amigos e parentes.
 
Nem mesmo a intensa vida noturna de Miami Beach, ou os cassinos abertos a noite toda, encantam a turista. Os comerciantes empenhados em salvar a economia da Flórida às custas dos brasileiros ainda não descobriram o óbvio: shoppings abertos a noite toda, com direito a guarda malas e banho. Pra quê perder tempo e dinheiro em hotéis?
 
A segunda parte do aventura turística, mais cansativa e com menos brilho, é o retorno das mercadorias arrependidas. As brasileiras, não acostumadas com essa facilidade no Brasil, ficam encantadas com o poder de comprar e devolver, sem precisar se explicar. Os trajetos são refeitos, e tudo que não gostaram volta pras prateleiras. Mas nem tudo se perde nessa tarefa humilhante - em cada loja onde devolvem uma mercadoria, compram mais duas.

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