Lula, Dilma, Afif etc.
Está rolando na Internet um longo artigo do jornalista Gilberto Maringoni sobre o ex-presidente Lula. Muito conhecido como cartunista, Maringoni é doutor em História e leciona na Universidade Federal do ABC. No artigo publicado originalmente no site Carta Maior em 15 de maio, ele se equilibra entre o rigor acadêmico e a fluência jornalística, mas condena o discurso ambíguo, ora progressista, ora conservador, do ex-líder metalúrgico, que permanece como comandante supremo do PT, exercendo influência nos rumos do governo de Dilma Rousseff.
O ponto de partida da análise de Maringoni é a recente nomeação do vice-governador paulista Guilherme Afif Domingos, de origem malufista, como ministro da Microempresa do governo federal. “Não se trata apenas de uma manobra de ocasião para compor maiorias parlamentares e estreitar o espaço da oposição nas eleições de 2014”, escreveu o cartunista-professor. “Estamos diante de uma sofisticada tática política, capaz de contentar aliados à esquerda e à direita e de se colocar como esquerda e direita ao mesmo tempo, sem assumir claramente nenhum dos lados”.
Segundo Maringoni, Lula não se avexa de elogiar ex-presidentes como o general Médici (por ter assinado a lei de criação da Embrapa em 1973 e autorizado a construção de Itaipu), fazendo média com os setores mais conservadores do país. “Contenta progressistas e conservadores, direitistas e esquerdistas e… não toca no status quo”, afirma Maringoni.
Pelo contrário, o artigo critica decisões de Lula e de Dilma como a contenção da reforma agrária, a liberalização da legislação ambiental, a manutenção da política econômica neoliberal e a nomeação de figuras remanescentes da ditadura, como o ministro Edson Lobão de Minas e Energia. Tudo isso, diz o articulista, representa “a materialização de uma habilíssima política conservadora de novo tipo”.
Conclusão do estudioso: embora tenha construído “o governo mais sofisticado e complexo no Brasil desde Getúlio Vargas (1930-45 e 1951-54)”, o PT reduziu seu alcance a avanços módicos no combate à pobreza e na ampliação do ensino. Lula e sua sucessora construíram “governos de coalizão”, montados para superar desafios históricos do país, mas no curso da história seu objetivo central passou a ser a manutenção do partido no governo, ainda que seja à custa de concessões a partidos de centro e de direita.
Maringoni não perdoa: “Os governos petistas incorporaram, sem dizer que o fizeram, políticas caras aos setores monopolistas e rentistas, como o aprofundamento do processo de privatizações, de isenções tributárias e fiscais e a política de franco favorecimento aos grandes grupos privados, via BNDES.”
O próprio historiador-cartunista reconhece que não é fácil se opor a uma gestão desse tipo, que “distribui uma parcela do excedente social entre os setores miseráveis e obteve um crescimento econômico razoável, em comparação com a administração do PSDB”. Porém, segundo Maringoni, as práticas sociais dos governos petistas não desconcentram renda de maneira significativa.
Para Maringoni, as melhorias sociais – que são reais – em vários aspectos da vida da população mais pobre, obtidas nos governos petistas, foram alcançadas graças a um cenário de crescimento econômico, sem tocar na essência da organização do Estado e sem ampliar serviços públicos universais – como educação, saúde e segurança. Na saúde pública, observa o estudioso, o que se nota é um avanço dos planos de medicina privada, das organizações sociais e um paulatino sucateamento do SUS, estabelecido na Constituição de 1988. Ou, seja, “a justiça social lulista se faz via mercado, via crédito e aumento da massa salarial que dependem de cenários de crescimento econômico”.
A grande pergunta que começa a ser colocada neste ano pré-eleitoral é: depois de dez anos de governo: tais como são percebidos hoje, o lulismo e o petismo ainda têm espaço para permanecer no poder e avançar em propostas em favor da maioria da população ou perderam a capacidade de contrariar os interesses dos grandes monopólios e dos rentistas mantidos à sombra do modelo econômico baseado no endividamento governamental?
LEMBRETE DE OCASIÃO
"Cada um de nós será julgado um dia. Cada um de nós será julgado por aquilo que fizemos e pelo que deixamos de fazer”
Presidente Lula em 2008, na festa dos 35 anos da Embrapa
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