Terça, 23 Abril 2024

Marias desamparadas

A Lei Maria da Penha completa nesta terça-feira (7) seis anos. É inegável que a lei tem sido decisiva para coibir a violência contra a mulher. Com a lei, as agressões passaram a ser tratadas como crime e isso já é um significativo avanço. O ditado que recomendava que “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”, pouco a pouco, vem perdendo a força e adeptos. A sociedade já não se mostra tão passiva diante dos casos de violência. As denúncias são cada vez mais frequentes.

 
De outro lado, a própria vítima, que antes não ousava denunciar o agressor e passava anos suportando a violência calada, também tem recorrido à polícia com mais frequência, crente que a lei criada especialmente para protegê-la prevalecerá e a justiça será feita. No entanto, a realidade mostra uma distância abissal entre a lei e a prática.
 
No Espírito Santo, a situação é ainda mais caótica que no restante do País, uma vez que lideramos o ranking de homicídios contra mulheres. De acordo com o Mapa da Violência 2012, a taxa no Estado é de 9,4 homicídios para cada grupo de 100 mil mulheres. Em segundo aparece Alagoas com 8,3/100 mil. Nos homicídios gerais as posições se invertem. É Alagoas que lidera o ranking nacional com o Espírito Santo na segunda colocação. 
 
Mesmo com a Lei Maria da Penha, o histórico de violência no Estado favorece o crescimento dos casos de agressão e morte de mulheres. Ironicamente, no dia em que a lei completa seis anos, os jornais capixabas desta segunda-feira (6) estampam o caso da jovem Rosiane Borges Carvalho, de 22 anos, que foi assassinada dentro do ônibus, na Serra, pelo ex-marido que não aceitou a separação e decidiu acabar com a vida da ex-companheira. 
 
A tragédia ganha ingredientes ainda mais dramáticos pelo fato de a saraivada de tiros ter atingido e matado uma passageira de 19 anos, que nada tinha a ver com a história. Rosiléia Alvarenga, assim como os outros 60 passageiros que estavam no ônibus do Transcol, entrou em pânico quando o pedreiro Gláucio Araújo Farias começou a atirar. Como ela estava exatamente no banco da frente, acabou sendo baleada. Também não foi confirmada a informação se a jovem estava ou não grávida. Se estava, o saldo da tragédia sobe para três mortes e uma tentativa de suicídio, já que o pedreiro permanece internado em estado gravíssimo, após disparar contra a própria cabeça. 
 
Em meio à tristeza dos familiares, a história da manicure Rosiane Borges Carvalho deixa uma lição. A tragédia poderia ter sido evitada e as vidas poupadas se a Justiça fosse mais efetiva e encarasse os autores da violência com mais rigor. 
 
Rosiane já tinha sofrido outras agressões do ex-marido, que sempre foi um homem violento. No ano passado, ele teria tentado matá-la a facadas. Mas, a exemplo de outros milhares de crimes que continuam impunes no Estado, o pedreiro continuava solto, pronto para fazer novas ameaças à ex-mulher. Prova disso é que dois dias antes de morrer, a vítima teria procurado a polícia suplicando ajuda. Com medo e sabendo do que o ex-companheiro era capaz, ela pressentia que corria risco de vida. Mas ninguém parece ter levado muito a sério a história da manicure e nada foi feita para protegê-la.
 
Muitas mortes de mulheres são evitadas não por eficiência da Justiça, mas pela ação de organizações não-governamentais que acolhem a vítima da violência como última alternativa para evitar o pior. Nesses casos, a vítimas fica “confinada” e o agressor livre, esperando que a burocracia da lei o coloque atrás das grades. O que dificilmente ocorre. 
 
Apesar da absurda situação que pune a vítima e é condescendente com o agressor, ainda assim, o abrigamento pode ser decisivo para salvar a vida da mulher. No caso de Rosiane, não foi lhe oferecida essa alternativa. Ela morreu indefesa nas mãos de homem violento que acreditava que a jovem mulher era propriedade dele e caberia exclusivamente a ele arbitrar se ele deveria viver ou morrer. Glaucio escolheu a punição mais aguda para ex-mulher que não o amava mais: a morte. 

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