Sexta, 26 Abril 2024

O estouro da boiada

 

A  menos de um mês das eleições municipais de 7 de outubro de 2012, o julgamento do Mensalão segue no ritmo lerdo das tropeadas de antigamente, quando se levava um dia inteiro para percorrer não mais do que cinco a seis léguas, pra mo’de não estropear a boiada. Mesmo sabendo que o  destino da tropa era o matadouro, cabia aos tropeiros entregar os animais inteiros aos marchantes.
 
A metáfora pode não se ajustar precisamente ao caso, mas a comparação é válida: todo mundo está vendo que os ministros do Supremo, como os tropeiros, não têm pressa de chegar. Pelo contrário, cada voto deles é uma “viagem” pelo mundo do Direito. Alguns gastam mais de uma jornada para expor seus argumentos. Vaidade, tudo é vaidade, dizia o rei Salomão, ele mesmo tomado como exemplo de juiz justo.
 
Diante de cada réu, mesmo que este seja um boizinho comum, os meritíssimos aproveitam para repassar um rol interminável de acórdãos, princípios, conceitos e valores. Depois, sem cerimônia, vão enfiando a faca nos boizinhos do presépio político brasileiro. Por enquanto, não escapou nenhum.
 
Na beira da estrada, só espiando o movimento, todo mundo quer saber o que acontecerá com os bois mais graudos e, principalmente, com Zé Dirceu, apontado como o cabeça dessa manada. A maioria dos observadores já concluiu que predomina na suprema corte um clima para mandar essa boiada para o matadouro. Afinal o que está acontecendo?
 
Considerando que o Supremo Tribunal Federal tem uma tradição de protelar decisões polêmicas, essa súbita disposição para julgar o Mensalão às vésperas das eleições municipais pode se tornar um novo referencial para o comportamento do Judiciário.
 
Entre o clamor da mídia e a perplexidade da opinião pública diante da provável condenação dos mensaleiros, e levando em conta a pressão dos partidos dominantes para abafar o caso, o Supremo deixa de agir politicamente e decide aplicar a letra fria da lei, que é o que fazem os bons tribunais, desde a implantação do direito romano.    
 
Mas ninguém esquece que por trás do Mensalão esta(va) o governo Lula. Assim, conscientemente ou não, os ministros do Supremo estão agindo como anticabos eleitorais dos partidos envolvidos na trama, que inclui crimes como peculato, improbidade, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
 
Já se sabe que não haverá penas grandes para os implicados, todos réus primários, mas talvez jamais se poderá dizer que se fez muito barulho por pouca coisa, pois a prática chamada de Mensalão ocorria em órgãos públicos, espaços que deviam ser sagrados, como os templos religiosos.
 
Embora o senso comum reconheça que é preciso condenar os mensaleiros – os ativos e os passivos  –, o julgamento do ano 2012 deixou claro que para moralizar a política é preciso fazer muito mais.
 
Além de criminalizar o uso do caixa dois, é urgente impedir que o poder econômico continue manipulando as eleições, realizadas sob a égide do Judiciário, conforme a legislação vigente.
A reforma das leis eleitorais é tarefa do Legislativo, cujos membros, em sua maior parte, preferem deixar tudo como está, pois assim fica mais fácil para fazer o jogo sujo. Conclusão: cabe ao Executivo tomar a iniciativa de propor uma reforma político-eleitoral completa.
 
O que precisa ficar claro é que, se ninguém tomar providências para mudar o rumo das coisas, de repente pode aparecer em cena novamente o ameaçador, o perigoso, o sinistro, o terrível corregedor armado, do qual muitos têm medo e outros, saudade.      
 
 
LEMBRETE DE OCASIÃO
 
“Quem cai, sempre pode se levantar. Com a queda não caiu a causa que o PT representa, daqueles que vêm da grande tribulação histórica, sempre mantidos no abandono e na marginalidade.”
 
Leonardo Boff, filósofo brasileiro

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