Domingo, 28 Abril 2024

Pandemia e o desastre na educação

Para mensurar o estrago da pandemia na educação, é fundamental estar no chão da escola pública.

Foram dois anos de embustes, sem retenção, que alguns especialistas falam até em 10 a 15 anos para recuperar. No chão da escola, a percepção é dramática. O alunado está matriculado dois anos à frente de sua real posição em nível de conhecimento, discernimento e responsabilidade. As professoras e professores estão se desdobrando em trabalho e criatividade para amenizar a situação, mas é como enxugar gelo.

Tomarei por referência o Ensino Médio, onde atuo e penetro mais o ambiente. Os ingressantes de 2022 chegaram sem os dois últimos anos do fundamental, exatamente aqueles que os prepararia para uma nova etapa, mais amadurecida, com a redução do lúdico e a inserção em um universo mais acadêmico. O resultado disto é um verdadeiro caos.

Um Ensino Médio infantilizado, semianalfabeto, que como o efeito de uma onda, recebeu assim o alunado do fundamental e precisa prepará-los para a universidade, com entrega de conteúdos e amadurecimento pessoal para a vida e o mercado de trabalho, com senso crítico, cidadão e protagonismo. Esta que sempre foi uma tarefa árdua para educadoras e educadores, agora, recebendo alunas e alunos despreparados, não dispondo de recursos materiais e tempo para recuperá-los, acaba reduzindo as exigências e passando o problema para a nova etapa.

Ainda há um outro grande problema, que é a evasão escolar. As escolas estão vazias, muitos jovens não retornaram, e os que retornaram estão sendo, de certa forma, mimados para ali permanecerem, até por que a categoria de educadores tem sempre o assombro do desemprego pelo fechamento de turmas. Por exemplo, não é incomum professoras e professores terem que conviver com estudantes grudados no celular durante as aulas.

Salvo exceções, a onda os entregará para as universidades, que precisarão também reduzir o nível de exigência, para entregá-los ao mercado em quatro a seis anos como profissionais formados.

Me parece que, nos próximos 10 ou 15 anos, aquela vala fétida da mediocridade estará ainda mais lotada.

O sistema educacional brasileiro não dá conta sozinho desta demanda. É preciso que estudantes e suas famílias integrem uma força-tarefa, bem assessorada por técnicos em educação, que debrucem sobre a questão e ofereçam propostas efetivas de acertos, numa tarefa para ontem, antes que a onda siga. Afinal, já foram para as faculdades estudantes que só cursaram o 1º ano do ensino médio e o concluíram na pandemia.

Para valorizar a educação, no sentido da entrega do mundo aos que chegaram, dentro dos conceitos de autoridade, responsabilidade e "amor mundi", descritos por Hannah Arendt em seu texto A crise na Educação (1957 e tão atual), é fundamental que não se atropele os propósitos em nome do mercado e da velocidade do aprendizado imposta à revelia da efetiva formação.

Afinal, só uma educação (principalmente pública) de qualidade pode trazer esperança de dias melhores, com redução das desigualdades e inclusão social.

O tempo urge, a hora de agir é agora!

Everaldo Barreto é professor de Filosofia

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Comentários: 2

Christiano Sunderhus Filho em Sexta, 09 Setembro 2022 05:59

Nas escolas cívico militares, os estudantes não tem que ficar ao celular durante as aulas, e, sim, estudando e se preparando para o futuro. TER MUITA LIBERDADE em sala de aula, no caso dos alunso, só atrapalha, afinal de contas, eles estão ali para estudar, e, não para matar o tempo!!!

Nas escolas cívico militares, os estudantes não tem que ficar ao celular durante as aulas, e, sim, estudando e se preparando para o futuro. TER MUITA LIBERDADE em sala de aula, no caso dos alunso, só atrapalha, afinal de contas, eles estão ali para estudar, e, não para matar o tempo!!!
Roberto Izoton em Sexta, 09 Setembro 2022 09:00

"Salvo exceções, a onda os entregará para as universidades, que precisarão também reduzir o nível de exigência, para entregá-los ao mercado em quatro a seis anos como profissionais formados."

Acredito que isso não vai acontecer. No ensino médio, até mesmo pelas exigências da Secretaria de Educação, temos que flexibilizar, mas essa flexibilização não tem que acontecer nem acontecerá na Universidade. Ou os alunos se adequarão ao contexto acadêmico, ou não se formarão.

"Salvo exceções, a onda os entregará para as universidades, que precisarão também reduzir o nível de exigência, para entregá-los ao mercado em quatro a seis anos como profissionais formados." Acredito que isso não vai acontecer. No ensino médio, até mesmo pelas exigências da Secretaria de Educação, temos que flexibilizar, mas essa flexibilização não tem que acontecer nem acontecerá na Universidade. Ou os alunos se adequarão ao contexto acadêmico, ou não se formarão.
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Segunda, 29 Abril 2024

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