Como posso eu pegar um trem? Mais difícil ainda era pegar um bom assento, fosse Alegre-Guaçuí ou Alegre-Cachoeiro. Indo ou vindo. Pegava-se então a ajuda de um maleiro para nos garantir o lugar, preferivelmente no lado aberto das curvas, para evitar as fagulhas. Esses especialistas de trens, no entanto, só pegavam o lado da estação, porque as malas eram jogadas pela janela antes mesmo de o trem parar. Os passageiros mais afoitos já estavam em pé no corredor, pegando a fila de saída, que nem se faz hoje nos aviões.
Mas em vez de pegar o trem, peguei uma gripe. Como posso eu pegar uma gripe, que não é um mal concreto e maleável? Melhor pegar um cineminha, mas porque peguei o trajeto errado não peguei o começo do filme. Como era moda, então, peguei a ajuda do vizinho de poltrona, que me resumiu o que estava acontecendo na tela. Ninguém recusava essa gentileza, mas dei azar e peguei um chato que já tinha visto o filme e me contou o final. Tantas vezes isso me aconteceu que peguei aversão a cinema. Só pego filme na Netflix.
E aqui vou eu tentando pegar o jeito e prestar minha singela homenagem às viagens de trem do passado. Pegando carona no Google, que não estava eu presente para contar a história. Mas viajava sempre nos vagões da Leopoldina Railway, que em Alegre pegava os passageiros duas vezes por dia. Depois vieram os ônibus e a estrada de rodagem, como se dizia no tempo da maria-fumaça, e as viagens perderam a graça. O guarda-pó foi eliminado da indumentária e se pegava muita poeira.
Na Europa ainda hoje se anda de trem, apesar das estradas melhores que as nossas, voos mais frequentes e mais baratos que os nossos e carros melhores comprados em suavíssimas prestações mensais. Aqui peguei um Honda Civic no leasing, mais barato ainda. No Brasil brasileiro, com péssimas estradas, onde o carro nem sempre pega e custa caro, foram-se os trens da paisagem, e um patrimônio de valor inestimável pegou ferrugem e foi sucateado. Pegaram os trilhos de ferro para fazer alicerces na construção civil. Idem, idem, os dormentes de madeira de lei.
Um relatório de 1867, do Ministério da Agricultura, informava que naquele ano houve um superávit no desempenho financeiro das estradas de ferro brasileiras. Mas em 1897 todas as nossas linhas férreas estavam falidas, e foram adquiridas por uma empresa em Londres, The Leopoldina Railway Company Ltd., que se tornou a maior ferrovia brasileira e uma das maiores do mundo. O nome Leopoldina homenageava a Imperatriz, que não era Escola de Samba, e Railway a gente pensava que era o sobrenome da nobre senhora.
Tem gente que pega as coisas no ar, e não é gripe. Pegando no batente a gente pode pegar um bom carro, antes que ele – o carro – nos pegue. Pegue sempre um modelo que pegue menos combustível. Mas tem quem prefira pegar um bronze na praia, e aí a opção é pegar um ônibus. Quem quiser pegar o Expresso Oriente, o trem mais famoso do mundo, tem que pegar um avião para a França. Em Paris, pegue um táxi para a Gare de Strasbourg – o trem parte diariamente às 22h20. Pegue a poltrona da janela, e boa viagem.