Quinta, 18 Abril 2024

Perigo no ar

 

Os prejuízos à saúde gerados pela poluição do ar na Grande Vitória viraram a máxima das estatísticas e alertas sobre o problema já há algum tempo. O debate saiu do campo do confronto de ideias entre ambientalistas e setor econômico, utilizado na maioria das vezes para tentar desqualificar qualquer mobilização popular contra as empresas poluidoras, para entrar no campo da prova: os números. Mas do lado do poder público, o que mudou? Nada. 
 
Embora o Estado ainda caminhe lentamente em realizar estudos locais que relacionem a poluição do ar com doenças, nunca foi difícil chegar a tais constatações. No entanto, foi de uns anos pra cá, principalmente, que os capixabas começaram a ter a real dimensão do problema. Não por conta do empenho dos órgãos responsáveis. Não mesmo. Mas por dados nacionais, resultado de constantes inclusões em rankings da poluição do ar. 
 
O próprio governo do Estado, com os levantamentos da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), sabe que as doenças do aparelho respiratório representam a principal causa de internação nos hospitais da rede pública estadual. O mais recente deles, com enfoque em crianças e adolescentes, referentes a janeiro e junho deste ano, indica 5.521 internações. O segundo lugar, as doenças infecciosas, vem bem atrás: 3.283. Mas não é só nessa faixa que o sapato aperta. Os idosos também são grupo vulnerável.
 
Outro dia, um dos maiores especialistas da área, Paulo Saldiva, do Laboratório de Poluição Atmosférica da Universidade Federal de São Paulo (USP), ressaltou que cada morador de Vitória fuma um cigarro e meio por dia. Ele exemplificou, de maneira clara e necessária, o que dizem os vários estudos nacionais sobre a poluição na Capital, que ultrapassa os limites recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Os poluentes que mais afetam a saúde estão por aqui em doses cavalares: as partículas finas (PTS e PM10) –  que chegam aos pulmões - e o dióxido de enxofre (SO2). 
 
Também este ano, espelhado no exemplo de São Paulo, o vereador de Vitória Serjão Magalhães (PSB) elegeu o tema como bandeira e realizou um seminário para discutir a adoção no Estado de novos parâmetros para as emissões. O que é importante, sem dúvida. Mas para isso, a sugestão foi criar uma comissão para monitorar e elaborar propostas para conter a poluição do ar. Demanda tempo. Até lá, o governo espera, enquanto os números sobem em ritmo acelerado. 
 
Ainda no ano passado, a Câmara de Vila Velha instaurou uma CPI para investigar a poluição do ar. Os vereadores ficaram assustados com a informação que as doenças pulmonares eram a terceira causa de mortes no município. Mas sabe-se lá que fim levou. Se as intenções eram boas, ficaram para trás, porque nem esses indicativos mais recentes foram capazes de provocar qualquer reação na Casa. 
 
Também em 2011, estudo relacionou a poluição do ar da Samarco com a incidência de câncer em pescadores de Anchieta, sul do Estado. O Palácio Anchieta passou longe dos resultados. Fingiu que não era com ele. E ainda foi prestigiar o lançamento da pedra fundamental da 4ª usina da empresa. 
 
Isso tudo para lembrar apenas dos últimos acontecimentos, pois a lista é muito mais extensa. E o governo do Estado? Esse nem sabe ao certo o que de fato cada empresa polui e em qual quantidade. Digo as principais, ArcelorMittal, Vale e Samarco. As outras, então, nem se fala. Estudo nesse sentido anda a passos de tartaruga, ou guardado no fundo da gaveta.
 
E o  Ministério Público do Estado? Bom, esse é melhor nem comentar. Senado, Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa muito menos.
 
Agora eu pergunto: as famílias nos nossos representantes/governantes não têm pulmão?
 
Manaira Medeiros é jornalista e especialista em Educação e Gestão Ambiental

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