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Prisão domiciliar de Bolsonaro

E o chumbo trocado continua

Nessa segunda-feira (4), após a divulgação de uma vídeo-chamada e de um vídeo em redes sociais em que aparecia Jair Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decretou a prisão domiciliar do ex-presidente. O ministro alegou que Bolsonaro descumpriu reiteradamente as medidas cautelares, no que manteve as de proibição de contato com embaixadores e de se aproximar de embaixadas, bem como o uso de redes sociais.

Desse modo, em caso de descumprimento das regras da prisão domiciliar ou de qualquer das medidas cautelares, se terá a revogação destas regras e medidas e a decretação imediata de prisão preventiva do ex-presidente. Concomitantemente, a Polícia Federal (PF) cumpriu busca e apreensão na casa de Jair Bolsonaro, com a apreensão de seu celular. Além disso, o ex-presidente está proibido de receber visitas sem autorização prévia do Supremo.

A motivação da decretação da prisão domiciliar de Jair Bolsonaro foi devido, portanto, a dois vídeos divulgados no domingo (3). Segundo Moraes, houve desrespeito das medidas cautelares com a produção de imagens, ligações de vídeo e a divulgação de seu apoio às manifestações que ocorriam em Copacabana, de modo massivo.

Moraes ainda reiterou que “o flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal”, se referindo ao vídeo que Flávio publicou, em que Bolsonaro dizia “Boa tarde, Copacabana. Boa tarde, meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos”.

O outro vídeo feito pelo ex-presidente foi compartilhado pelo deputado federal  Nikolas Ferreira (PL-MG) durante a manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo. Em que o deputado afirmou que Bolsonaro não podia falar, mas podia ver. Neste dia Nikolas também criticou a atuação do Supremo, dizendo que esta não está acima do Brasil.

Tal interação de Bolsonaro com o público se deu através de ligação telefônica com chamada por vídeo, em que Moraes entendeu como mais um desrespeito às medidas cautelares, pois essas comunicações por telefone e pelas redes sociais foram utilizadas para propagação de ataques ao Supremo, insuflando manifestantes na pressão e coação da Corte.

Tais medidas, indo do uso de tornozeleira eletrônica e agora à prisão domiciliar, entra num contexto do país em que juízes do STF estão em vias de avaliar a condenação de um grupo que planejava um golpe militar no final de 2022.

Lembrando que promotores brasileiros acusam Bolsonaro de liderar uma organização que planejava anular o resultado eleitoral, dar um golpe militar, e muito além disso, assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB-SP´) e o ministro do Supremo, Alexandre de Moraes.

Tal plano de atentado foi admitido recentemente em depoimento do general da reserva Mário Fernandes, ao dizer que se tratava de um “pensamento digitalizado” e do famigerado plano batizado de “Punhal Verde Amarelo”. Título que, por sua vez, faz alusão à “A Noite das Facas Longas”, que em alemão se escreve Nacht der langen Messer.

Essa chamada Noite das Facas Longas se trata nada mais do que um expurgo político ocorrido na Alemanha Nazista, entre 30 de junho e 2 de julho de 1934, em que foi ordenado por Adolf Hitler a execução de membros de seu próprio partido, consideradas ameaças ao seu governo, incluindo líderes da SA (Sturmabteilung). Ou seja, mais uma dessas associações obscuras da extrema direita atual com uma forma cifrada de supremacismo e neonazismo.

Tal fetiche já tinha aparecido no caso da demissão do então secretário da Cultura de Bolsonaro, Roberto Alvim, dramaturgo que trocara a cocaína pelo catolicismo, ao imitar fala do nazista Goebbels, em que copiou trechos do discurso do ministro da Propaganda de Hitler, num vídeo com a ópera Lohengrin, de Richard Wagner, como música de fundo, em pronunciamento que foi para as redes sociais, num plágio de trechos de um discurso do ministro nazista.

Portanto, ao som de Richard Wagner, o compositor favorito de Adolf Hitler, o então secretário Roberto Alvim disse o seguinte: “A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa […] ou então não será nada”.

Ao passo que Goebbels havia dito: “A arte alemã da próxima década será heroica, será ferrenhamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa (…) ou então não será nada”. Tal mistura de pastiche com infâmia resultou na demissão do então secretário.

Por sua vez, teve também o caso do ex-assessor de assuntos internacionais do ex-presidente Jair Bolsonaro, Filipe Martins, que acabou condenado pela Justiça pelo gesto alusivo à supremacia branca feito durante uma sessão do Senado, em 2021. O que se chama de apito de cachorro, que inclui coisas como beber leite puro e outros sinais imagéticos.

E, em meio a esse histórico de viés neonazista, este documento intitulado “Punhal Verde Amarelo” é de autoria de Fernandes. O general da reserva, por conseguinte, se encontra preso desde novembro do ano passado e tentou minimizar a importância do documento, como se fosse mero fruto de sua visão militar, e que nunca foi compartilhado com outras pessoas.

Durante o interrogatório no STF, Fernandes disse que “é um arquivo digital que nada mais retrata do que um pensamento meu que foi digitalizado. Um compilar de dados, um estudo de situação meu, de pensamento…uma análise de risco que eu fiz e, por um costume próprio, resolvi inadvertidamente digitalizar”, afirmou o ex-número 2 da Secretaria-Geral da Presidência no governo de Jair Bolsonaro, homem de confiança do então presidente.

De acordo com o general, o documento foi impresso por ele para “para não forçar a vista” com telas e “logo depois” o rasgou. Ele foi um dos réus ouvidos no interrogatório do STF dos chamados núcleos 2 e 4 de acusados por tentativa de golpe após a derrota de Bolsonaro para Lula nas eleições de 2022.

O núcleo 2 estaria encarregado de direcionar as forças policiais e produzir minutas golpistas. O núcleo 1, do qual Bolsonaro faz parte, por sua vez, já teve interrogatórios realizados e aguarda a fase das alegações finais, para começar o julgamento final, previsto para fins de agosto e início de setembro.

E é dentro de todo este contexto que temos agora as tentativas de intervenção de Trump em favor do ex-presidente, com a questão do tarifaço, e que, mesmo com algumas mudanças e recuos, está em vigor, atingindo muitas áreas da agricultura, da indústria e do comércio brasileiro, na produção de mercadorias do país para os Estados Unidos.

A intervenção trumpista se funda em uma interpretação mais enviesada que açodada da situação brasileira, feita pelo presidente norte-americano, pois, na verdade, é uma forma de pressão sobre o Brasil para recuar nas relações e resoluções feitas no Brics, por exemplo.

O interesse diplomático internacional sempre é nacional, ao fim e ao cabo, ainda mais em se tratando dos Estados Unidos. Pois se trata de uma nação cuja característica mais marcante é sua cultura autocentrada, e que ganhou autoconfiança através de sua indústria cultural hegemônica.
 
Mesmo que Trump não faça sequer uma vaga ideia do que se passa no Brasil, a hipocrisia da real politik norte-americana segue essa sua tradição, com o pano de fundo de sempre, da excepcionalidade dos Estados Unidos desde a publicação de seu Destino Manifesto em seu nascimento como nação.

E agora, além do argumento deslocado de caça às bruxas feito por Trump, em relação ao processo contra Jair Bolsonaro, culminando no anúncio do tarifaço, temos os efeitos da Lei Magnitsky sobre o ministro Moraes, com sanções que se fundamentam na acusação de que o ministro estaria censurando setores conservadores de direita na internet. E o chumbo trocado continua, portanto, com essa decretação de prisão domiciliar de Jair Bolsonaro por parte do ministro do Supremo.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog: poesiaeconhecimento.blogspot.com 

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