Sexta, 19 Abril 2024

Roncalli entrega as chaves das masmorras

 

Oficialmente, o governo tratou a saída de Ângelo Roncalli da Secretaria da de Justiça como um acontecimento natural, quase inesperado. Para todos os efeitos, o secretário, após ter a confirmação de que o Ministério Público Estadual (MPE) o envolveria nas denúncias de corrupção no Instituto de Atendimento Sócioeducativo do Espírito Santo (Iases), teria decidido pedir demissão, conforme anunciado pelo Palácio Anchieta nessa segunda-feira (17). 
 
Roncalli disse que preferiu deixar o cargo para poder se dedicar à sua defesa e também não “atrapalhar” o andamento do trabalho na Sejus. O governador, também demonstrando naturalidade, acatou o pedido de demissão e indicou André Garcia (Ações Estratégicas) para suceder o secretário demissionário. 
 
As primeiras palavras do novo secretário já davam a entender que o assunto estava resolvido. A saída do seu antecessor encerrava um ciclo na Sejus. Em outras palavras, Garcia queria dizer: “vamos logo virar a página e esquecer essa história”. 
 
Na tarde desta terça-feira (18), a estratégia ensaiada pelo Palácio Anchieta tentava minimizar os efeitos da queda de um secretário de Estado envolvido em corrupção. Notícia que sempre pega muito mal para qualquer governante. 
 
Para reforçar a proposta do “estamos virando essa página”, o palco escolhido foi a Assembleia Legislativa, que nas últimas semanas vinha pedindo ao governador, publicamente, a cabeça de Roncalli numa bandeja. 
 
O espetáculo teve efeito simbólico ao alinhar no mesmo palco os chefes dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. O motivo para justificar o importante encontro seria a apresentação do projeto de lei das Execuções Penais, que afeta diretamente a Sejus. Aqui fazemos um parêntese para registrar a importante contribuição do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Pedro Valls Feu Rosa, para pôr fim ao vexatório sistema de revista imposto aos familiares dos presos. A proposta do desembargador, feita em parceria com representantes da sociedade civil, também regulamenta a movimentação de presos no sistema, outro problema caótico hoje. 
 
Mas, voltando ao espetáculo pode-se dizer que a estratégia do Palácio Anchieta funcionou satisfatoriamente. Se a ideia era virar a página e mandar com ela o secretário demitido, deu certo. Muito de leve, apenas dois deputados tocaram no assunto Roncalli: Gilsinho Lopes (PR) e Sandro Locutor (PV). Os demais deputados preferiram não estragar o clima festivo que tomava conta da Assembleia. 
 
A sincronia dos acontecimentos só confirma que nesta peça nenhum ator agiu de improviso. Os textos foram exaustivamente decorados. Quem assiste ao espetáculo da coxia sabe que Casagrande obviamente já conhecia o inquérito da Operação Pixote de trás pra frente. Ele sabia que Roncalli estava encrencado e que não haveria mais clima para mantê-lo, embora da boca pra fora tenha defendido o discurso da cautela e a manutenção do secretário no cargo. 
 
Casagrande também sabia que seria complicado se livrar de um secretário que não era da sua cota, mas da de Paulo Hartung, que exigiu a manutenção da dupla Ângelo Roncalli e Silvana Gallina, respectivamente, na Sejus e no Iases, em troca do apoio concedido nas eleições que elegeram o socialista governador. 
 
O pedido de demissão aramado foi a saída encontrada por Casagrande para sacar Roncalli da equipe elegantemente. Qualquer movimento mais brusco com o homem que segurou as chaves das masmorras para Hartung todos esses anos sem se queixar de nada, poderia esgarçar a relação de Casagrande com o ex-governador. 
 
Os acontecimentos que se seguiram, como evento montado na Assembleia, faz parte da segundo etapa do plano, que já atende aos interesses do próprio Casagrande. O governador que confiou o sistema prisional de adultos e adolescentes nas mãos da dupla Roncalli e Gallina também precisava se sair bem do imbróglio. Conseguiu. É verdade que ele não saiu ovacionado desse primeiro ato, mas, de qualquer maneira, também não foi vaiado. O que não deixava de ser um risco iminente.  

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