Sexta, 19 Abril 2024

Armazém de café será transformado em centro cultural no Caparaó

casarao_fachada_divulgacao Divulgação

Um grupo de arquitetos, artistas, produtores culturais e outros cidadãos pretende preservar um imóvel histórico de uma maneira inusitada. Um casarão com mais de 80 anos de existência que foi um armazém de café vai literalmente mudar de cidade e ganhar novos usos, mantendo a arquitetura tradicional. Pouco mais de 11 quilômetros separam Santa Marta, local originário da construção, no município de Ibitirama, de Patrimônio da Penha, uma vila de Divino de São Lourenço, lugar de destino onde o imóvel de dois andares e 280 metros quadrados abrigará o Armazém Cultural Multiverso, com diversas estruturas e atividades previstas.

Mas como assim mudar o imóvel de lugar? Se alguém imaginou uma casa sendo puxada pelos ares ou arrastada por rodinhas se enganou. O grupo vai se aproveitar que a arquitetura da época, com base de madeira e tijolos, permite a desmontagem, que se registrada passo a passo, permite a remontagem em outro local aproveitando os encaixes, acrescentando alguns detalhes de design contemporâneo.

Grupo numa das visitas de reconhecimento do imóvel para preparar suas desmontagem. Foto: Divulgação

"A arquitetura tradicional ainda vista pelas estradas do Caparaó reflete um conhecimento ancestral no trato da madeira e montagem de habitações duradouras. Este patrimônio tem sido desmontado e tem desaparecido", diz o material de divulgação do projeto. Em dezembro de 2021 a edificação foi comprada visando sua preservação, já que havia outros interessados na compra mas nenhum para manter o armazém como edifício histórico.

Para essa missão de desmontar e remontar, há uma equipe com quatro anos de pesquisas e a experiência de já ter feito sete desmontagens de casas do tipo na região. A ideia é utilizar a metodologia dos mutirões, sendo que ao invés de construir um canteiro de obras, a proposta é apostar numa "obra-escola", em que o processo de desmontagem e reconstrução sirva para vivência, colaboração e aprendizado entre os mais experientes e outros que queiram contribuir durante as atividades.

Apesar de outras ações de remontagem terem sido feitas na região, esta ganha um caráter especial por se tratar de um projeto para uso coletivo e comunitário, que pretende se afirmar como um local de referência no sul do Espírito Santo como ponto de memória e cultura rural. Isso, num distrito localizado nas bordas do Parque Nacional do Caparaó, que tem grande relevância na preservação da mata e das águas, já é um destino turístico de destaque e reduto de cultura e saberes tradicionais, assim como de novos artistas que chegaram mais recentemente, atraídos por seus encantos naturais.

O imóvel atualmente visto por dentro. Foto: Divulgação

Depois de remontado, a meta é que o imóvel abrigue um auditório para teatro, dança, cinema e outras atividades, espaço para feira, cozinha, cafeteria, biblioteca comunitária, estúdio de audiovisual, sala de terapias, ateliê de artes e ofícios e alojamento para residências artísticas. Junto com a casa foi adquirida também uma antiga máquina beneficiadora de café de 1954, que fazia parte do armazém. Esta, que está preservada sem sua maior parte, passará por restauro e ficará exposta de forma permanente no salão do centro cultural, em seu lugar original dentro da construção, como relíquia do patrimônio histórico do entorno. A casa antiga terá ainda saneamento totalmente ecológico, sistema energético renovável e mobiliário a partir de materiais abundantes na região como bambu e eucalipto.

E na intenção dos realizadores, tudo isso instalado dentro de um projeto maior, que é complexo a ser chamado de Parque Comunitário das Águas e da Cultura, que incluiria além do centro cultural, um parque infantil, pracinha para eventos, Estação Lixo Zero, centro de convivência, espaço de educação ambiental, viveiro de mudas de plantas nativas, pomar, agrofloresta, além da sede da associação de moradores.

Desenho do projeto do Parque das Águas e da Cultura

O primeiro passo dado foi a compra do imóvel em Ibitirama, feito de forma colaborativa entre associados. A equipe do projeto conta com 17 pessoas, com diferentes funções. Além disso, um terreno pertencente à Associação de Moradores de Patrimônio da Penha (Ampa) foi doado para instalação do projeto e o grupo idealizador ainda espera a cessão de um terreno anexo, prometido pela prefeitura, para que se consolide integralmente a proposta do parque e do armazém cultural como um complexo só.

À frente do projeto estão o Armazém Cultural Multiverso, espaço de cultura que já existe em uma casa menor e passaria a ocupar o novo local, além da AMPA e da Associação Permacultural e Agroecológica Jacutinga do Caparaó, com apoio de outras 17 entidades, que incluem grupos, coletivos, associações, cooperativas e pequenas empresas. Porém, ainda é necessário a captação de recursos para que se possa realizar todo o projeto, não apenas de desmontagem, transporte, remontagem, decoração e equipagem do novo espaço, mas também para a viabilização de atividades pontuais permanentes, muitas delas já inseridas dentro do projeto de criação, como dez ações educativas sobre salvaguarda da agricultura familiar, técnicas construtivas tradicionais, tecnologias sociais e ambientais de energia e saneamento, turismo de base comunitária e patrimônio imaterial.

Para fazer tudo isso acontecer, o grupo quer se valer de um novo instrumento lançado pelo governo estadual, a Lei de Incentivo à Cultura Capixaba (LICC). Por meio dela, busca empresas interessadas em apoiar o projeto financeiramente em troca de descontos no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O grupo também está aberto a parceiros que queiram ser co-investidores, contribuindo com cotas que permitem participar da construção do regimento do espaço e ter prioridade na reserva do espaço para atividades.

Local onde deve ser instalado o empreendimento, sobre o qual o grupo realizador dialoga com o poder público estadual e municipal. Foto: Divulgação
Dentro do plano construído pelo grupo organizador, o processo desde a desmontagem até a inauguração em Patrimônio da Penha deve durar 12 meses a partir da captação de recursos, incluindo a pesquisa e registros sobre o Armazém de Café, desmontagem, armazenamento, projeto arquitetônico, preparação do terreno, remontagem, instalações elétricas e hidráulicas, construção da mobília, tudo devidamente registrado audiovisualmente para ser transformado num documentário.

Em Patrimônio da Penha, ao olhar-se para o passado projeta-se o futuro. "Restaurar e re-montar todo esse patrimônio histórico de nossa região e abri-lo à visitação da comunidade é preservar e difundir a memória dos habitantes dessa região, é também produzir o futuro da região a partir da abertura, salvaguarda e continuidade dessas memórias, ou seja, é um espaço que visa trabalhar com os aspectos e bens materiais e imateriais do patrimônio histórico-cultural do Espírito Santo".

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Comentários: 1

Ricardo Salles de Sá em Sexta, 08 Julho 2022 10:07

Grande iniciativa, parabéns às idealizadoras do projeto!

Grande iniciativa, parabéns às idealizadoras do projeto!
Visitante
Sexta, 19 Abril 2024

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