Quinta, 02 Mai 2024

Com desenhos e recortes, exposição conta a história da Läjä Records

Com desenhos e recortes, exposição conta a história da Läjä Records
Do interior de uma pasta vermelha, dessas simples, de papelão, em cuja capa lê-se “Läjä” escrito numa etiqueta branca, sai um pequeno pedaço de papel. É um recorte de uma propaganda de brinquedo estilo anos 80, extraído talvez de uma página de revista: em azul ciano, desenha-se o rosto feliz de duas crianças bizarras rindo toscamente, um menino e uma menina. 
 
Por mais singela que seja - um simples e pequeno recorte - a logo “original” da Läjä Records é uma das riquezas da Läjä Records - Artes Originais, exposição sobre a história da icônica gravadora do underground nacional capitaneada por Fábio Mozine, baixista do Mukeka di Rato, Os Pedrero e guitarrista do Merda. A mostra está em cartaz na Prego Espaço de Arte, em Jaburuna, Vila Velha.
 


A exposição vai reunir um número expressivo de objetos que escreveram a história da Läjä, fundada em meados dos anos 90 para lançar os discos do Mukeka di Rato e que, de lá para cá, ampliou substancialmente seu catálogo, lançando além de discos e vinis de bandas de hardcore e rock, nacionais ou gringas, livros e DVD’s, afora mimos como camisas, bonés, broches e patches.
 
A organização está a cargo do artista plástico Alex Vieira, fundador do espaço e editor da revista que lhe dá nome, a Prego. Na tarde dessa segunda-feira (23), Alex e o amigo André Nucci estavam às voltas com uma papelada sem fim, discutindo a montagem, pensando em como organizar tudo pelos minúsculos 12 metros quadrados do espaço. 
 
É muita coisa mesmo. O material que chegou ao espaço em caixas, pastas ou sacolas, já é resultado de uma primeira filtragem, realizada em uma longa tarde na casa de Mozine. “Fizemos até uma faxina na casa ele, o tanto de gaveta cheia de coisa, mas que ao mesmo tempo não tinha nada”, diz Alex.
 
A primeira coisa que ele nos mostra é um envelope abarrotado de cartas, todas endereçadas ao Edifício Dourados, em Coqueiral de Itaparica. “RESPONDAM POR FAVOR”, finaliza uma, assim, em letras garrafais, oriunda de Cajueiro Seco, bairro de Jaboatão dos Guararapes (PE). O remetente solicitava o envio do catálogo de CD’s da gravadora, com preço e custos de frete. 
 
Mozine articulava sua firma com gente do Brasil inteiro e de alguns países do globo. Há cartas de São Paulo, Rio Grande do Sul, Japão, Portugal, Itália, Canadá, entre muitas. Claramente elas nos remetem à era pré-email. A Läjä é um claro exemplo de iniciativa que atravessou, e muito bem, a transição entre as velhas e as novas tecnologias. Seu posto de modelo bem-sucedido para o circuito não-tradicional da indústria musical deve muito ao advento dos novos processos de comunicação.
 
Os velhos e novos fãs irão se deliciar. Não há o requinte de paletas de guitarra com nomes gravados, instrumentos usados na gravação de tal ou qual disco, roupas, escovas, pentes. A estética é punk, grotesca, tosca: letras de música escritas à mão no verso de um folder de show ou numa folha de caderno da Tilibra, desenhos em papel meio rasgado, colagens como a da primeira demo dos Pedrero lançada em K-7 em 1999.
 
A estética é tosca, porém organizada. Exemplo: a caótica colagem do encarte de Curtição dos Jovens (2001), primeiro disco do Merda. Todas as imagens que o compuseram foram zelosamente guardadas numa pasta. 


Entre as raridades, há belas surpresas como a letra em caneta esferográfica azul de Auxílio Paletó, canção do primeiro rebento do Mukeka, Pasqualin na Terra do Xupa-Cabra (1997), até hoje executada nos shows; as letras de Praia da Bosta e Vitória Poluída (ambas de Gaiola, 1999); de Eu Nunca Vou Parar de Beber (um hino do show dos Pedrero, de Estilo Selvagem Rock ‘n Roll, 2001).


Muitos itens estavam espalhados sobre o chão e sobre a mesa. Sobre o chão, Alex se agacha e volta com o fotolito da capa de Sobrevivência, a mitológica demo tape em K-7 lançada em 1995 que marca a estreia fonográfica do Mukeka di Rato. 


Casando com este item, há a primeira matéria em jornal sobre a banda. Em 6 de dezembro de 95, um box de três parágrafos no finado Fanzine, a seção de cultura jovem do Caderno Dois, de A Gazeta, apresentava a desconhecida banda e descrevia a recém-lançada demo de seis músicas em nove minutos como um “hardcore feroz, estilo arrasa-quarteirão”.
 

                  
 
A ideia surgiu no final do ano passado, meses depois que a Prego Espaço de Arte foi aberta, em agosto. “Já tá na hora de fazer alguma coisa”, disse Alex a Mozine. Mas ele foi adiando, adiando, até, segundo conta, aprender que, para a coisa sair, tem que ter uma data. Pôs a data e pronto. A exposição também integra a segunda edição da Quinta Caótica, projeto que uma vez por mês visa realizar algum evento para movimentar o espaço.
 
A maior parte do material estava na casa de Mozine, abrigado em pastas ou envelopes identificados (por banda ou pela gravadora. Alex, no entanto, também tinha alguma coisa. Aos 26 anos, ele acompanha a cena capixaba desde os 13. Em 2001, teve sua primeira banda, Ajudante di Papai Noel; anos depois, veio a Mortos Pela Escola.
 
A exposição foi organizada basicamente de duas formas. A primeira vai contemplar os artistas que colaboraram com a Läjä. Carlos Dias, Daniel ET (que fez a capa de Carne, de 2007), Márcio Sno (que desenhou o rato-mascote à época de Pasqualin...), Sandro Ogro (da arte da primeira camisa do Mukeka, um rato numa bandeja), Junior Biu (da capa de Carlos, de 2005, do Merda), Mozine e do próprio Alex.
 
A segunda seção vai dividir os itens por bandas - Mukeka di Rato, Os Pedrero ou Merda. Uma ou outra coisa vai contemplar as que integram o catálogo da Läjä. Desenhos, letras de música, cartas. Cartazes de shows, são muitos, dariam outra exposição; mas um ou outro deve entrar. Fotos, nenhuma: a quantidade também daria outra exposição. Camisas antigas, fora de catálogo, também compõem a mostra. 
 
Alex avisa que vai rolar silkagem de camisetas. Quem quiser levar a sua, fique à vontade, mas com preferência às cores claras. 
 
Entre tantos itens de uma história que acompanha desde moleque e que depois ajudaria a construir, alguns lhe despertam um vínculo mais afetivo. “O que eu acho foda é o desenho original da capa do Gaiola, que depois foi considerado um dos discos mais importantes do hardcore brasileiro”, diz Alex. Este desenho também já estava separado. E o disco nem se chamaria Gaiola: no desenho original, lemos “Nossos Filhos”.  
 
Serviço
A exposição Läjä Records - Artes Originais está em cartaz na Prego Espaço de Arte, no Posto Castelinho. R. Maria Amália, Jaburuna, Vila Velha. Entrada franca.

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