Sexta, 29 Março 2024

​Livro de Lima Barreto ganha ilustrações de artista capixaba

Luciano_Feijao_capa_foto_FelipeGomes Felipe Gomes

Importante escritor do início do Século XX, o carioca Lima Barreto passou por duas internações em manicômios e essa vivência deixou um livro inacabado, Cemitério dos Vivos, e uma obra recompilando anotações sua durante o período de internação, reunidas em Diário do Hospício, obra que ganha edição especial lançada nesta semana pelo coletivo editorial Borda, contando com ilustrações de Luciano Feijão.

Artista capixaba, ilustrador e professor, Feijão vem se dedicando à pesquisa e produção de obras que abordam temas como racismo, escravidão e negritude, o que ele entende que se relaciona com a escrita de Lima Barreto, um escritor negro, que teve entre os fatores que o levaram à internação o racismo brasileiro.

"Foi um grande desafio ilustrar esse livro, porque ele não é contado de forma linear, com começo, meio e fim. É fragmentado, um diário, no qual ele colhia informações para um livro que não foi lançado porque ele morreu antes", conta Luciano Feijão. O ilustrador buscou criar uma história com suas ilustrações, que fosse baseada no texto do livro, mas que se desenvolvesse de maneira própria.

O resultado são 16 desenhos feitos utilizando principalmente lápis e carvão vegetal, com toque de tinta guache e finalização digital. "A ideia é esticar um pouco o sentido do texto.Há muitas coisas na imagens que não estão escritas no texto. Minha contribuição busca fazer com que o sentido do texto se amplie", diz o artista capixaba.

Quem conhece os trabalhos anteriores de Feijão, que expôs nos últimos anos no Museu Capixaba do Negro (Mucane), Galeria Homero Massena e OÁ Galeria, vai reconhecer a proximidade com os desenhos apresentados em Diário do Hospício, que segue a mesma linha não só gráfica mas de pesquisa, que ele intitula como Antianatomia, por meio de ilustrações que com forte expressividade gestual buscam evidenciar a população negra em contraponto à estigmatização e o aniquilamento que ela sofre no País.

"As ilustrações que fiz no livro não estão diferentes da pesquisa que faço como artista visual, são uma coisa só, não só em técnica, referências, repertório, mas também na intenção de marcar um posicionamento político, pois entendo o contexto em que o livro está inserido. Busco criar certo engajamento quando vou fazer o desenho, e o desenho fala muito de uma luta antirracista", relata.

A edição da Borda para o Diário do Hospício de Lima Barreto conta também com um posfácio de Júlia Carvalho, psicóloga e mestra em Psicologia Institucional pela Universidade Federal do Estado (Ufes) e pesquisadora do movimento de luta antimanicomial. Ela analisa que por mais que a obra tenha sido escrita há um século atrás, ainda há questões muito atuais. "Por mais que a luta antimanicomial tenha conseguido fechar alguns hospitais psiquiátricos, a lógica manicomial sempre volta revestida de outros discursos e linguagens, dessa necessidade de prender e excluir da sociedade pessoas com comportamentos considerados diferentes e perigosos".

No caso de Lima Barreto, foi o alcoolismo que o levou a uma internação forçada no Hospital Nacional de Alienados, sendo que hoje volta a ganhar espaço a ideia de internações compulsórias para pessoas com vício em drogas. "E não tem como falar de todo esse processo no Brasil sem tocar no racismo, que é estruturante das relações manicomiais no país. Sempre que temos acesso a fotografias dessa época podemos observar grande quantidade de corpos negros espalhados pelos hospícios, que embora não tenham mais essa nomenclatura, seguem a mesma tendência", diz Júlia.

A psicóloga destaca a linguagem mordaz de Lima Barreto, tanto nesse diário como em outras obras, nos quais costuma trazer análises políticas e sociais da época em que viveu.

Assim o lançamento do coletivo editorial Borda contribuiu para visibilizar escritos menos conhecidos do artista, cuja obra caiu em domínio público, e levantar debates sobre temas muito presentes e atuais, além de permitir novas leituras a partir do trabalho de ilustração de Luciano Feijão.

A editora busca trabalhar com publicações independentes e deve ter foco em textos de domínio público relacionado com a produção de artistas visuais, como feito nesta edição inaugural, com 112 páginas e custo de R$ 25. A publicação de fotolivros é outra das ambições da Borda para o futuro.

Para lançar Diário do Hospício, o coletivo editorial realiza dois eventos com convidados nos dias 11 e 18 de junho, às 18h30, por videoconferência, em link que será divulgado no Instagram da Borda, contando com participação da equipe do projeto e de Júlia e Feijão.

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Comentários: 1

Lula Palomanes em Quinta, 11 Junho 2020 22:43

Início do sécolo XIX NÃÃÃOOO!
Início do século XX - VIINNTTEEEE!!!

Início do sécolo XIX NÃÃÃOOO! Início do século XX - VIINNTTEEEE!!!
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