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‘Casagrande trata o povo como criminoso por lutar por moradia’

Baiana, de Vila Esperança, denuncia perseguição a acampamento no Palácio Anchieta

“Eles tiram foto de toda barraca, de quem está de bermuda, de shorts, de quantas crianças tem. Cortaram até o biquinho de água que a gente usava para beber, e agora decretaram multa de R$ 1 mil para mim e mais dois moradores”, denuncia Adriana Paranhos, conhecida como Baiana, presidente da antiga ocupação Vila Esperança. A comunidade, removida de Jabaeté, em Vila Velha, no último dia 9 de setembro, segue acampada há 25 dias em frente ao Palácio Anchieta, no Centro de Vitória, cobrando uma alternativa digna ao despejo que atingiu mais de 800 famílias.

Para ela, o governador Renato Casagrande (PSB) tem se mostrado intransigente diante da situação. “Ele é irredutível, não senta para negociar, não abre espaço para diálogo. Prefere mandar polícia e processo, como se a gente não tivesse direito. Casagrande trata o povo como criminoso por lutar por moradia”, critica.

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Adriana Paranhos e outros moradores identificados no acampamento foram notificados nessa quarta-feira (24) da decisão judicial que determina a saída da área em ação movida pelo governo do Estado. A advogada Maria Elisa Quadros, que representa a comunidade no processo, informou que recorre da decisão. “Entramos com um agravo de instrumento e estamos aguardando o julgamento, pedindo a suspensão da medida”, acrescenta. No último sábado, o juiz Carlos Magno Moulin Lima, da 1ª Vara de Fazenda Pública Estadual, Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente, Saúde e Acidentes de Trabalho, decidiu que o acampamento seja removido para que se cumpra mandado de manutenção de posse.

Segundo Baiana, desde que a ocupação passou a reivindicar uma solução efetiva que garanta o direito à moradia dos ocupantes, a resposta do poder público foi a criminalização e a pressão psicológica. “Eles não param de rondar, ligam sirene de madrugada, ficam em cima, como se a gente fosse bandido. É perseguição”, relata.

Ela conta que as famílias têm sido alvo de relatórios de investigação policial que descrevem o cotidiano do acampamento, numa tentativa de tratá-los como suspeitos. “É como se a gente estivesse cometendo crime por lutar por um teto”, afirma. O acesso improvisado que as famílias utilizavam para beber e cozinhar foi lacrado, como aponta, “por castigo, cortaram o único ponto de água, na tentativa de nos fazer desistir pelo cansaço”, desabafa.

Segundo Baiana, essa perseguição também se expressa em tentativas de associar os acampados a lixo e doenças. A insistência em tratar o acampamento como caso de polícia reflete uma escolha política de não enfrentar o déficit habitacional, reitera. “É mais fácil gastar com polícia do que com política de habitação. Mas isso não resolve o problema das mais de 800 famílias que não têm para onde ir”, destaca.

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A determinação da Justiça cita relatório da Casa Militar que descreve o acampamento como insalubre: “As condições do local são precárias, com acúmulo de lixo, dejetos humanos, instalações elétricas improvisadas (furto de energia) e risco de incêndio”. Para Baiana, trata-se de uma tentativa de criminalizar famílias vulneráveis. “A gente mantém tudo limpo. Estão querendo usar o lixo como desculpa para nos tirar à força”, rebateu.

Baiana sustenta que o governo estadual tem recursos para resolver o impasse, “o que falta é vontade política de garantir que as famílias tenham um lugar digno. Não queremos favor, queremos direito”, completa.

As soluções oferecidas até agora são consideradas insuficientes pela comunidade. Uma delas foi o pagamento de uma parcela única R$ 3,6 mil por família, a título de auxílio, calculado para cerca de seis meses de aluguel no valor de R$ 600, valor considerado insuficiente diante da realidade do mercado imobiliário. Para Baiana, a medida é apenas paliativa. “Isso não resolve nada. Como é que uma mãe com três filhos vai se manter só com isso? Depois que acabar, volta todo mundo para a rua?”, questiona.

Outra proposta, apresentada pelo prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (sem partido), foi a de oferecer “passagem de volta” para famílias originárias de outros estados. “Ele queria pagar passagem para mandar as famílias embora, de volta para Minas Gerais, Bahia, São Paulo. Mas aqui é onde a gente construiu vida, trabalho, filhos na escola, a maioria das crianças já nasceu na comunidade. Não vamos aceitar ser descartados”, aponta.

Apesar das dificuldades, a líder reforça que a mobilização continua e pede apoio da sociedade civil com alimento, água, cobertores, colchões e roupas de criança. E também de doação em dinheiro, “porque tudo é gasto”, explica. As contribuições podem ser feitas via Pix, por meio da chave 27999498701, em nome de Adriana Paranhos.

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Vila Esperança surgiu em 2016, durante a gestão de Rodney Miranda (Republicanos), em um terreno abandonado. Em 2020, um decreto assinado pelo então prefeito Max Filho (PSDB) declarou a região de interesse social para habitação popular, o que alimentou a expectativa de regularização. O decreto, no entanto, foi revogado em 2022 pelo prefeito Arnaldinho (sem partido), abrindo caminho para a reintegração de posse. A presidente da ocupação, Adriana Paranhos, a Baiana aponta que a empresa Alphaville estaria diretamente ligada às pressões pela retirada das famílias da área.

A execução da reintegração na Vila Esperança havia sido suspensa por determinação do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que exigiu a elaboração de um plano voltado a garantir alternativas habitacionais para as famílias vulneráveis antes da remoção. Após audiência de mediação, a Justiça entendeu, porém, que o plano de desocupação pactuado entre o município, o proprietário da área e a Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), “mostrou-se satisfatório e razoável para mitigar a situação de vulnerabilidade dos ocupantes, quando da execução da ordem de desocupação”, o que é contestado pelas famílias e movimentos sociais.

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