Sábado, 18 Mai 2024

Comissão da Verdade: Vitor Costa confirma ligações com Marighela e recorda perseguições

Rubinho Gomes
Especial para Século Diário





O jornalista, advogado e ex-procurador do Estado, Vitor Costa, 80 anos, prestou depoimento à Comissão da Verdade no Sindicato dos Jornalistas do Espírito Santo no último mês de setembro, pouco depois de outro veterano jornalista aposentado, Adam Emil Czartorisky Gonçalves depor perante integrantes do grupo vinculado à Comissão da Verdade da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas e Comissão Nacional da Verdade.



Vitor Costa foi o único jornalista capixaba cassado, na última lista de cassações editada pela ditadura militar em 1969. Outros jornalistas sofreram diferentes perseguições do regime militar. No depoimento gravado em vídeo que será enviado à Fenaj, Comissão Nacional e Comissão Estadual da Verdade, Vitor Costa recordou seu afastamento do comitê central do PCB do ES, por apoiar a dissidência aberta nacionalmente pelo líder comunista Carlos Marighela.



Ele relatou prisões e depoimentos que prestou no Exército, ao lado de outras vítimas da ditadura no Estado, como o médico Aldemar Neves, o comerciante (depois professor e diretor de escola) Rubens Vervloet Gomes, o contabilista Hermógenes Lima Fonseca, dentre outros. Vitor Costa fez um longo relato de como ocorriam as relações políticas no Espírito Santo, com a disputa entre os liderados pelos ex-governadores Carlos Lindenberg e Francisco Lacerda de Aguiar, então donos de dois dos três jornais diários da época em Vitória, A Gazeta e O Diário, respectivamente.



Vitor Costa recorda que chegou a ser afastado como colaborador da Folha Capixaba, ainda em 1963, por apoiar Marighela e sua postura em relação  ao Partidão (PCB). Nesta ocasião, Vitor se tornou redator da coluna Praça 8, de A Gazeta, com foco na cobertura da Assembleia e nas articulações políticas da época. Com o golpe, após providencial desaparecimento com apoio até de viaturas oficiais do Estado, Vitor Costa retornou à cena política a convite do primeiro governador eleito indiretamente pela ditadura, Cristiano Dias Lopes Filho, de quem era amigo pessoal. Em 1969, foi surpreendido pela cassação de seus direitos políticos.



Adam Emil: "Viagem à Cortina de Ferro causou inúmeras perseguições"



O depoimento de Adam Emil Czartorisky Gonçalves recordou a viagem que o jornalista descendente de poloneses que haviam emigrado para o Espírito Santo fugindo dos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial, havia realizado com um grupo de amigos, no final dos anos 50, para países da chamada "Cortina de Ferro", no tempo da "guerra fria" envolvendo o grupo de países liderado pelos Estados Unidos e pela extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).



Do grupo participaram outros jornalistas, médicos, advogados e dirigentes comunistas do PCB, como Plinio Marchini, Lycurgo Resende, Hermógenes Lima Fonseca, Aldemar de Oliveira Neves, dentre outros. "Quando retornamos, fiz um artigo em O Diário contando o que havíamos visto durante as semanas em que percorremos a Rússia, Tchecoeslováquia, Polonia, etc, e fui surpreendido com a acusação de ter me tornado comunista na viagem. Respondi com outro artigo em O Diário lembrando que o então governador Carlos Lindenberg havia acabado de 
visitar o Leprosário de Itanhenga, em Cariacica, e nem por isso deveria ser chamado de leproso, assim como eu não me tornara comunista por visitar a URSS", relembrou Adam.



Ele relatou também perseguições ao jornalista Marien Calixte, por sua postura liberal e sua presença em reuniões com o então presidente João Goulart em suas visitas ao Estado, quando ficava hospedado com a família na residência oficial do governo do Estado na Praia da Costa, em Vila Velha. "Além disso, o Marien apoiava a luta do PCB pela encampação da Central do Brasil e pelo monopólio do petróleo", citou o jornalista.


Relatório



Com a gravação em vídeo dos depoimentos de Vitor Costa e Adam Emil, a Comissão da Verdade do Sindijornalistas - integrada pelo relator Rubens Gomes, Rogério Medeiros, Chico Flores, Tinoco dos Anjos, Suzana Tatagiba e Glaucia Regina estão finalizando o relatório final que deverá ser enviado à Federação Nacional dor Jornalistas, Comissão Nacional da Verdade e Comissão Estadual da Verdade até o final de novembro.



O relatório irá conter ainda informações sobre o depoimento do ex-delegado da Polícia Civil, Cláudio Guerra, que relatou como se deu o assassinado do proprietário do jornal O Povão e a explosão na sede do jornal na Ladeira Caramuru, na Cidade Alta, em Vitória, quando afirmou textualmente que o mandante teria sido o empresário e deputado federal pelo PMDB, Camilo Cola.



Também serão incluídos os depoimentos do jornalista Francisco Flores Rodrigues sobre o fechamento, em abril de 1964, do jornal Folha Capixaba, órgão oficioso do PCB que teve as máquinas de escrever lançadas na rua por anticomunistas; depoimento do jornalista Claudio Lachini sobre as primeiras prisões nos dias que se seguiram ao golpe de 1964, em Vitória, quando ele e outras lideranças estaduais ficaram presos no quartel do Corpo de Bombeiros no Parque Moscoso, em Vitória; além de depoimento do jornalista Rubens Camara Gomes sobre a censura imposta pelos militares aos veículos de comunicação, sobretudo após a decretação do AI-5 e a repressão às passeatas contra o regime militar em Vitória. Outro depoimento é do jornalista e escritor José Caldas sobre a guerrilha do Caparaó, em 1965, primeira insurreição armada contra a ditadura militar no país, sobre a qual escreveu, após anos de pesquisa, o livro "Caparaó : a Primeira Guerrilha Contra a Ditadura".

Veja mais notícias sobre Direitos.

Veja também:

 

Comentários:

Nenhum comentário feito ainda. Seja o primeiro a enviar um comentário
Visitante
Domingo, 19 Mai 2024

Ao aceitar, você acessará um serviço fornecido por terceiros externos a https://www.seculodiario.com.br/