Declarações de professor da instituição teriam ocorrido em conselho de classe
Um ato contra o racismo reuniu a comunidade acadêmica, movimentos sociais, entidades sindicais e coletivos negros na manhã desta segunda-feira (22) em frente ao Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), em Vitória. A mobilização foi organizada após a denúncia de falas racistas atribuídas a um docente durante um conselho de classe, direcionadas a uma estudante negra, finalista do curso técnico integrado em Estradas.
De acordo com a vice-presidente do Grêmio Estudantil do campus, Elisa Meirelles, o protesto teve como objetivo denunciar publicamente o ocorrido e cobrar uma postura mais firme da instituição diante do caso. “Foi um momento de falas e de apoio, para fazer barulho em frente ao Ifes e nos posicionarmos contra a atitude racista cometida durante o conselho de classe”, afirmou.
A principal crítica direcionada à gestão do campus foi em relação à nota divulgada pelo Ifes após a repercussão do caso. Para o Grêmio, o posicionamento institucional não reconhece de forma explícita o caráter racista das falas. “A nota tenta mascarar o que de fato aconteceu naquele conselho. Não foram apenas falas discriminatórias, foi um crime, e isso precisa ser nomeado”, observa Elisa.

O episódio ocorreu durante o conselho de classe do terceiro trimestre, realizado no fim do ano letivo, e docente citado nas denúncias foi identificado como Bernardo Bicalho, professor da área de Ferrovias, e a estudante como Suila Dandara.
Diferentemente dos conselhos do primeiro e segundo trimestres, esse encontro é fechado e conta apenas com a presença de docentes, pedagogos e coordenação de curso, sem participação de estudantes. Segundo a representante do grêmio, as declarações vieram a público após um professor negro, que estava presente na reunião, confrontar as declarações feitas e expressar indignação com o crime. Ainda conforme o relato, ele ficou visivelmente abalado, precisou sair da sala em alguns momentos, e teria deixado o conselho transtornado.
“Foi esse professor que contou à estudante tudo o que aconteceu. Ele saiu do conselho denunciando o ocorrido, inclusive para ela”, relatou Elisa. A estudante, que já teve vínculo com gestões anteriores do Grêmio Estudantil, compartilhou o caso nas redes sociais, o que levou o movimento estudantil a buscar um relato mais detalhado dos fatos.
De acordo com Suila, o episódio não foi um fato isolado. Ela relatou que já havia escutado declarações discriminatórias e machistas em sala de aula ao longo do ano, o que teria gerado um tensionamento prévio entre ambos, inclusive com confrontos diretos durante as aulas.
O ato foi convocado publicamente por estudantes e movimentos sociais, com um chamado para ressaltar a necessidade de ocupar os espaços e afirmar que o racismo não será tolerado dentro da instituição, e também participaram as vereadoras Ana Paula Rocha (Psol), de Vitória, e Açucena (PT), de Cariacica. “Nossa presença é um ato político de denúncia, resistência e defesa da vida, da dignidade e dos direitos da população negra. Racismo é crime”, aponta o texto de convocação compartilhado pela estudante.
Na semana anterior ao protesto, o Grêmio Estudantil do campus (GRB) já havia divulgado uma nota de repúdio, classificando o relato como “entristecedor e absolutamente repugnante” e cobrando a responsabilização do docente. O Grêmio também destacou que o caso evidencia a presença constante do racismo na instituição e criticou a omissão da gestão diante de situações semelhantes.
Durante o ato, Elisa Meirelles reforçou que, apesar de o Ifes ser uma instituição centenária, ainda reproduz desigualdades estruturais. “É um espaço muito elitizado, que deveria ser de debate e inclusão, mas tem se tornado um espaço de medo. A gestão tem sido omissa e tenta esconder esses casos para não ‘fazer feio’ perante a sociedade”, afirmou.
Em nota oficial, o Instituto Federal do Espírito Santo – Campus Vitória manifestou repúdio a quaisquer formas de discriminação e solidariedade às pessoas envolvidas. A gestão informou que os encaminhamentos institucionais estão sendo realizados conforme a Resolução Consup/Ifes nº 334/2025, que regulamenta os procedimentos para acolhimento de vítimas de assédio e discriminação.
A direção também destacou a existência de canais formais de denúncia, como o Fala.Br e a Ouvidoria, que garantem sigilo, escuta qualificada e encaminhamento adequado dos casos. Por fim, reafirmou “o compromisso institucional com a inclusão, a formação e a qualificação profissional, além da promoção de ações educativas e preventivas contra todas as formas de preconceito”.
Para o movimento estudantil e os coletivos presentes no ato, no entanto, o caso reforça a necessidade de medidas mais firmes e transparentes. “Não basta uma nota genérica. É preciso reconhecer o racismo, responsabilizar quem cometeu e garantir que estudantes negras e negros tenham um ambiente seguro para estudar”, cobra a porta-voz do Grêmio Estudantil.

