Grupo também vai se mobilizar em prol da criação de cozinhas solidárias

O Fórum Permanente de Pessoas em Situação de Rua vai criar uma comissão de mobilização pela reabertura do Restaurante Popular de Vitória. A iniciativa será discutida na próxima terça-feira (13), às 19h, na parte externa do adro do Convento de São Francisco, na Cidade Alta, Centro de Vitória. O Fórum, criado em abril último, é composto por pessoas em situação de rua e entidades da sociedade civil, como a Associação de Moradores do Centro (Amacentro), Humaniza Brasil e Pastoral do Povo de Rua da Arquidiocese de Vitória.
O presidente da Amacentro, Walace Bonicenha, explica que a comissão vai buscar diálogo com a gestão do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) para cobrar informações como a previsão de reinauguração do Restaurante Popular, de que forma será o atendimento para a população em situação de rua, e o que de fato falta para que o equipamento volte a funcionar.
“O Restaurante Popular é a possibilidade de alimentação enquanto garantia da dignidade humana. É uma política pública que pode minimizar a situação degradante de pessoas que rasgam saco de lixo para poder comer”, ressalta.

O Restaurante Popular foi criado em 2005, durante a gestão de João Coser (PT), no bojo da implementação de políticas federais para segurança alimentar. O fechamento se deu em dezembro de 2016, quando o então supersecretário da gestão de Luciano Rezende (Cidadania), Fabricio Gandini (PSD), hoje deputado estadual, anunciou que o plano era converter o espaço num banco de alimentos, para distribuir para as famílias mais necessitadas cadastradas no CadÚnico.
Desde então, a sociedade civil tem cobrado o retorno do equipamento, que já foi adiado inúmeras vezes pelo atual prefeito. Uma das previsões de reinauguração era em junho do ano passado, mas isso não aconteceu. A expectativa era de que voltasse a funcionar após o período eleitoral, contudo, também não se concretizou. Embora em novembro de 2024 a administração municipal tenha dado a previsão de reinauguração para o primeiro semestre deste ano, o Conselho Municipal de Segurança alimentar e Nutricional (Comsea) não tem expectativas de que isso aconteça, já que o assunto não foi discutido com o colegiado.
A comissão a ser criada pelo Fórum também vai acompanhar a implementação das cozinhas solidárias a serem criadas pelo Governo do Estado por meio da Secretaria Estadual de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades). Por meio das cozinhas solidárias, serão oferecidas refeições gratuitas para pessoas em situação de vulnerabilidade social. De acordo com Walace, a previsão inicial é a criação de três cozinhas, sendo duas no Centro de Vitória.
Durante a reunião do Fórum também serão criadas comissões para elaborar projetos para apresentação de propostas ao poder público, como os de lavanderia comunitária, banheiros públicos, espaços para banho e pontos para hidratação.
A proposta do Fórum Permanente de Pessoas em Situação de Rua é garantir um espaço de escuta, análise e proposição sobre as questões que envolvem a população em situação de rua, por isso, as reuniões têm sido feitas em locais abertos para garantir a participação desse público. Além da formulação de políticas, o Fórum busca “fomentar o diálogo com a sociedade, contribuindo para a desconstrução de preconceitos e para a valorização dessas pessoas, muitas vezes invisibilizadas e marginalizadas”, diz Walace. Ele destaca que alguns debates sobre políticas para pessoas em situação de rua têm sido feitos, como audiências públicas, mas o Fórum é uma medida permanente e duradoura.
Projeto higienista
Algumas ações têm sido feitas em Vitória com foco nas pessoas em situação de rua, mas criticadas pela sociedade civil. Em novembro do ano passado, foi votado o Projeto de Lei (PL) 57/2023, do vereador Luiz Emanuel (Republicanos). A proposta teve apenas três artigos e tinha como objetivo vedar “a ocupação por qualquer pessoa para fins de moradia e quaisquer atividades habituais, providas de assistência social, nos logradouros públicos situados no município de Vitória”.
Também previa que, “quando couber, o infrator é obrigado a indenizar ou recuperar os danos causados ao meio ambiente e aos bens de uso comum do povo, afetados por sua atividade”. O PL, no entanto, não foi aprovado, tendo voto somente do autor e do vereador Davi Esmael (Republicanos). A não aprovação se deu após articulação do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) diante das polêmicas, principalmente devido ao posicionamento da Igreja Católica.
Na ocasião, o então arcebispo da Arquidiocese de Vitória, Dom Dario, afirmou que há um projeto na Câmara “para acabar com os pobres nas ruas, querendo punir aquele que dá um prato de comida para alguém que está na rua. Essa pessoa ainda não conhece a Deus”, disse o sacerdote. Ele acrescentou que “não podemos permitir que tal coisa aconteça em nossa cidade, querer excluir aqueles que já estão excluídos, querer dar de comer a quem está com fome, e ainda ser punido porque está dando um prato de comida a um irmão que está na rua”.
Antes disso, o Vicariato para Ação Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória já havia se pronunciado sobre o tema por meio de nota, mencionando o tema da Campanha da Fraternidade de 2024, que foi Fraternidade e Amizade Social. O Vicariato afirmou que o autor do PL “parece desconhecer as implicações do que a Igreja Católica no Brasil escolheu viver na prática a partir do tema”.
De acordo com o Vicariato, o objetivo do tema é “contribuir para nos despertar sobre o valor da fraternidade humana e superar a cultura da indiferença para com os outros, que nos torna portadores do mal da cegueira, da insensibilidade, como ressalta a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil [CNBB]”.
“Em nossa cidade, a Capital do Estado, onde o orçamento público se impõe sobre os das demais cidades, onde há recursos para investimento no cuidado da pessoa em situação de rua, denúncias recentes indicam a ação de uma equipe de segurança privada agredindo fisicamente essas pessoas e jogando nelas jatos d’água, com caminhões da Prefeitura de Vitória. Denúncias que precisam ser apuradas pela atual gestão”, cobra o Vicariato.
O órgão da Arquidiocese de Vitória convidou “os legisladores interessados no assunto, como o autor do projeto citado, a acompanhar de perto as pastorais sociais da Igreja Católica nas ruas, onde atuam para indicar um novo caminho para quem está perdido e precisa de apoio”. Além disso, afirmou incentivar e apoiar “a avaliação e aprovação de projetos de lei que promovem os direitos e a dignidade da população em situação de rua”.