Quarta, 01 Mai 2024

Mapeamento constata que comunidades terapêuticas dominam atendimento a dependentes no ES

Mapeamento constata que comunidades terapêuticas dominam atendimento a dependentes no ES
A pesquisadora Fabíola Xavier Leal, professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Estado (Ufes), em parceria com as bolsistas em Iniciação Cientifica, Caroline Christine Moreira dos Santos e Renata Santos de Jesus, realizaram o estudo “Políticas de atenção às questões relacionadas ao consumo de álcool e outras drogas no Espírito Santo”, que mapeou o atendimento a dependentes químicos no Estado. No total, foram visitadas 268 comunidades terapéuticas, o que corresponde a 95,4% do total das instituiçõesaptas para a pesquisa. 
 
O levantamento mostra que é crescente, no Estado, o surgimento de instituições de tratamento de dependentes químicos e comunidades terapêuticas que funcionam sem qualquer fiscalização de órgãos governamentais, embora recebendo verbas públicas para funcionamento. Em contrapartida, não são implementadas por parte dos municípios iniciativas de redução de danos, tratamento e prevenção ao uso de álcool e outras drogas. 
 
Atualmente, o Estado tem oito Centros de Atenção Psicossocial álcool e outras drogas (CAPSad), sendo um infantil. A implementação dos CAPSad são de iniciativa dos município, mas podem ser construídos em responsabilidade compartilhada com os governos estadual e federal. 
 
No entanto, Fabíola explica que muitos municípios reclamam que não há destinação de verbas do Estado para a estruturação dos CAPSad e aponta a contradição para o repasse de verbas para clínicas privadas recuperação, para comunidades terapêuticas e para internações compulsórias nestes locais, sem que haja qualquer fiscalização por parte do governo.
 
O CAPSad é um serviço especializado em saúde mental que atende pessoas com problemas decorrentes do uso ou abuso de álcool e outras drogas em diferentes níveis de cuidado: intensivo (diariamente), semi-intensivo (de duas a três vezes por semana) e não-intensivo (até três vezes por mês).
 
O serviço, que é ambulatorial e territorializado, integra uma rede de atenção em substituição à “internação psiquiátrica", e que tem como princípio a reinserção social. Realiza ações de assistência (medicação, terapias, oficinas terapêuticas, atenção familiar), de prevenção e capacitação de profissionais para lidar com os dependentes. 
 
Fora da Grande Vitória, só existem CAPSad em São Mateus, no norte do Estado, em Colatina, no noroeste, e em Cachoeiro de Itapemirim e Anchieta, no sul do Estado. Além disso, apenas os CAPSad de Cachoeiro e de Vitória têm equipe de Consultório de Rua, que aborda dependentes químicos nas ruas e exercem atividades vinculadas aos CAPS, também como política de redução de danos. 
 
O objetivo do estudo foi realizar um diagnóstico das instituições públicas e privadas (com e sem fins lucrativos) que atuam nas políticas de atenção às questões relacionadas ao consumo de álcool e outras drogas no Estado, com base na legislação vigente. Além disso, o trabalho desenvolvido visa a identificar se as instituições atuam de acordo com o estabelecido pela Política de Saúde Mental e legislação aplicável e avaliar a possibilidade de desenvolver ações que fomentem suas atividades ou que propiciem a regularização destas instituições. E também fomentar as atividades das Vigilâncias Sanitárias e do Ministério Público Estadual (MPES) para que exerçam a fiscalização destas instituições; constituir e manter atualizado anualmente o banco de dados com informações sobre as instituições que atuam na área em questão.
 
Fabíola explica que as comunidades terapêuticas, pelo menos a maioria delas, não são fiscalizadas diretamente pelos órgãos de saúde, mas podem e devem receber fiscalização dos conselhos profissionais. "Em alguns desses serviços existem profissionais de nível superior. Conselhos de Medicina, Enfermagem, Serviço Social, Psicologia entre outros precisam ficar atentos", alerta.
 
Diante da dificuldade de fiscalização, a pesquisadora ressalta a importância da constituição dos Conselhos Gestores sobre Drogas nos municípios que, apesar de serem previstos pela legislação, só estão implementados em cinco municípios. “Se não tem órgão, não se fiscaliza”, diz ela. 
 
Dos 78 municípios do Estado identificou-se a existência de algum tipo de serviço em 46 municípios. Portanto, 32 municípios não têm acesso a nenhuma atenção específica na área de drogas. E ainda, 23 municípios têm somente Grupos de Mútua Ajuda, como o Alcoólicos Anônimos (AA), Narcóticos Anônimos (NA), Amor Exigente (AE), Grupo Esperança Viva (GEV) e Pastoral da Sobriedade (PS).
 
A pesquisadora aponta que o trabalho desenvolvido nestas comunidades terapêuticas também não é fiscalizado. Ela aponta que, das instituições pesquisadas, 142, mais da metade, vivem basicamente pela venda dos produtos fabricados pelos internos, por doações diversas e, por último, de recursos públicos. 
 
Como não há fiscalização dos locais, não é possível saber se o trabalho dos internos é devidamente remunerado, ou o quanto esta produção, de fato, influencia na receita das comunidades.
 
As dificuldades das pesquisadoras começaram desde o agendamento com as instituições, já que muitos contatos sofreram alterações. Além disso, há muitas instituições em zona rural não tinham qualquer acesso ao telefone ou à internet.    
 
Na coleta in loco, realizada depois dos agendamentos, as pesquisadoras também encontraram dificuldades para acessar os locais, considerando que muitas das instituições localizavam-se em zona rural de difícil acesso e sem transporte público. 
 
A maioria das instituições está localizada em zona urbana. No entanto, aquelas que estão na zona rural, que representam 16,4% das instituições, são, na maioria dos casos, em locais de difícil acesso, distante da comunidade e dos familiares. Geralmente estão localizadas onde não há iluminação pública, nem transporte público e muito menos acesso aos serviços públicos, principalmente os de saúde.
 
Redução de danos
 
A política de redução de danos, preconizada na Rede de Atenção Psicossocial (Raps), só está implementada em duas das instituições pesquisadas. De acordo com Fabíola, na ocasião da coleta de dados, em 2012 apenas a Associação Capixaba de Redução de Danos (Acard) e o CAPSad de Cachoeiro de Itapemirim tinham política de redução de danos. 
 
No entanto, em 2013 depois que a coleta já havia sido realizada, Vitória implementou as políticas de redução de danos. 
 
A pesquisadora afirma que a pesquisa já nasce precisando ser atualizada, já que surgem novas instituições e comunidades terapêuticas constantemente. Além disso, ela explica, é papel do Estado manter esse cadastro de entidades atualizado, com controle sobre abertura, fechamento e condições das instituições. 
 
Ela afirma que a pesquisa também deve chamar a atenção do Judiciário, já que as determinações de internações compulsórias partem da Justiça que encaminham, inclusive, para qual instituição deve ser encaminhado o dependente químico. “O monitoramento deve ser diário”, alerta Fabíola. 
 
O relatório da pesquisa foi encaminhado para o Ministério Público Estadual e para governo do Estado.

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