Ato por redução da jornada e fim da escala 6×1 marcou Dia do Trabalho

Centenas de trabalhadores ocuparam as ruas de Vitória neste 1º de Maio para exigir o fim da escala 6×1 e a redução da jornada de trabalho. A manifestação, organizada pelo Movimento Vida Além do Trabalho (VAT), em articulação com centrais sindicais e partidos do campo progressista, integrou a agenda unificada de mobilizações que ocorreram em todo o país neste Dia do Trabalhador.
A marcha saiu pela manhã da Praça Costa Pereira, no Centro da Capital, e seguiu até o Sambão do Povo, no bairro Mário Cypreste, onde se encerrou ao meio-dia. Ao longo do percurso, as lideranças ressaltaram o caráter histórico deste 1º de Maio, que marca uma virada na luta por direitos trabalhistas após anos de retrocessos, com uma proposta que unifica as classes populares e pode fazer “uma revolução nesse país”, com afirmou Rick Azevedo, precursor do movimento com um vídeo-desabafo que viralizou e alcançou milhões nas redes sociais, falando sobre a necessidade da revisão da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Vigente há 81 anos no País, desde sua publicação em 1943, esse regime tira a dignidade dos trabalhadores e pode ser considerada uma nova “escravisão moderna”, ressalta o ex-balconista de farmácia que se tornou o vereador mais votado do último pleito no Rio de Janeiro, pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol). O ato, que teve também a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil e a redução das taxas de juros praticadas pelo Banco Central como principais bandeiras, tem o objetivo de pressionar o Congresso Nacional pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 8/25, de autoria da deputada Erika Hilton (Psol-SP), que trata da limitação da jornada de trabalho a 36 horas semanais e extinção do regime 6×1.

Pioneira na articulação do VAT no Espírito Santo, a agente de chat Júlia Alves, trabalhadora de telemarketing submetida a essa escala, descreveu o movimento como “uma luz no fim do túnel para os trabalhadores”. Ela relatou ter vivido um processo de adoecimento mental em decorrência da carga horária exaustiva. “É uma questão de saúde pública”, afirmou. Júlia também comemorou a proximidade da meta de 3 milhões de assinaturas no abaixo-assinado pela PEC e o apoio declarado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à causa. “Estamos muito esperançosos”, anunciou.
Durante o trajeto, a marcha parou em frente às obras do novo Centro de Especialidades da Santa Casa de Misericórdia, onde o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil (Sintraconstr-ES) interveio para denunciar o descumprimento da Convenção Coletiva de Trabalho por parte da construtora HCX. Em meio a uma negociação tensa, com ânimos exaltados, os manifestantes mantiveram a palavra de ordem: “Trabalhador tem que lutar, a escala seis por um tem que acabar”, até que todos os operários fossem dispensados do serviço.

No encerramento, no Sambão do Povo, o coordenador estadual do VAT, Vinícius Machado, exaltou a coragem dos trabalhadores que abriram mão do feriado para lutar. “É o 1º de Maio mais importante dos últimos anos. Isso tem a ver com a força da classe trabalhadora e do nosso movimento nas ruas. Não por acaso ontem [quarta,30], o presidente Lula falou sobre a nossa pauta”, disse. Ele reforçou o apelo para que o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), envie a PEC 8/25 à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), para que avance na tramitação.
Autora de um projeto de lei que proíbe a escala 6×1 nos contratos de fornecimento de mão de obra e serviços do Governo do Estado, a deputada estadual Camila Valadão (Psol) reforçou a necessidade de que o debate sobre a jornada de trabalho seja levado para todas as esferas de poder. No âmbito municipal, o vereador Professor Jocelino (PT) anunciou o protocolo de um projeto semelhante na Câmara de Vitória, voltado aos contratos da prefeitura.
Para a professora Lívia Moraes, do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), que pesquisa relações de trabalho, a manifestação marca um momento fundamental. “Estamos vivendo um processo de precarização intensa do mundo do trabalho, perdas de direitos trabalhistas que afetam não só as condições de trabalho, mas de vida da classe trabalhadora, que não tem mais uma jornada específica”, observa.

Ela alerta que as pessoas têm trabalhado cada vez mais dias da semana, com menos tempo para lazer, para estar com a sua família e para fazer as lutas. “Hoje é um marco muito importante o VAT aqui, numa luta pela escala 4×3 e pela redução geral da jornada de trabalho: menos tempo para o capital e mais tempo para a vida”, enfatiza.

Impactos na Saúde
A sobrecarga de trabalho imposta pela jornada 6×1 tem provocado graves prejuízos, como evidenciam os dados do Ministério da Previdência Social. Em 2024, o número de brasileiros afastados por transtornos mentais e comportamentais atingiu o maior patamar dos últimos dez anos, crescendo 67% em relação a 2023.
Mais de 440 mil trabalhadores foram afastados, sendo os principais motivos transtornos de ansiedade (141.414 casos), episódios depressivos (113.604) e transtorno depressivo recorrente (52.627). Além disso, foram registrados afastamentos por transtorno afetivo bipolar (51.314), transtornos mentais e comportamentais relacionados ao uso de substâncias psicoativas (21.498) e reações ao estresse grave (20.873).
Também aparecem na lista casos de esquizofrenia (14.778), transtornos decorrentes do uso de álcool (11.470) e cocaína (6.873). O levantamento revelou que os afastamentos por transtornos de ansiedade aumentaram mais de 400%, enquanto os episódios depressivos quase dobraram durante a série histórica.