Nota critica governador por decisão judicial que acaba com acampamento no Palácio Anchieta
Após a decisão do juiz Carlos Magno Moulin Lima, da 1ª Vara de Fazenda Pública Estadual, Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente, Saúde e Acidentes de Trabalho, de que o acampamento ao lado do Palácio Anchieta seja declinado, o Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) divulgou nota em suas redes sociais na qual “denuncia a violência social em curso no Espírito Santo”. “Nosso povo não é lixo social”, critica.

A decisão judicial é fruto de uma ação de manutenção de posse feita pelo Governo do Estado, na gestão do governador Renato Casagrande (PSB). As famílias, que se encontram no acampamento há mais de 20 dias, são da ocupação Vila Esperança, em Jabaeté, Vila Velha, de onde tiveram que sair no dia 9 de setembro, conforme decisão do juiz Manoel Cruz Doval, da 6ª Vara Cível de Vila Velha.
Para o Movimento Nacional, ao acionar a Justiça, o Governo do Estado “quer executar mais um despejo forçado contra nosso povo”. “Essas famílias não estão ocupando prédios ou áreas privadas: estão em praças e calçadas públicas, bens de uso comum do povo, garantidos pelo artigo 99, inciso I, do Código Civil. O que o Governo tenta fazer é um contrassenso jurídico e político: despejar famílias do próprio espaço público, da rua onde foram empurradas após perderem suas casas”, aponta.
O MNLM destaca que, após a reintegração, as famílias de Vila Esperança acamparam em frente ao Palácio Anchieta para exigir soluções, “mas, em vez de diálogo, agora enfrentam mais repressão, desta vez pelo Governo do Estado”. É apontado ainda que essa postura viola o artigo 6º da Constituição Federal, que trata do direito à moradia, e o artigo 5º, que estabelece “o direito à reunião pacífica em locais abertos ao público”. Além disso, “viola a Recomendação nº 90/2021 do Conselho Nacional de Justiça, que orienta para a suspensão de despejos sem alternativa habitacional”.
“O que está em curso é uma tentativa de invisibilizar nosso povo, de varrer para longe famílias trabalhadoras como se fossem descartáveis. Mas afirmamos: nosso povo não é lixo social. O espaço público é do povo. A moradia é um direito. Resistiremos contra cada ordem de despejo injusta, até que os governos assumam responsabilidade e garantam vida digna para todas as famílias”, finaliza a nota.
Conforme consta na decisão, o Estado alega que “a ocupação impede o acesso regular ao Palácio Anchieta, dificultando a circulação de pessoas, autoridades, visitantes e veículos”. O Governo do Estado diz, ainda, que houve protestos e reuniões com representantes da gestão estadual, da Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES) e de líderes políticos. “Foi ofertado auxílio-aluguel de até R$ 3.600,00 por família, mas os líderes do movimento e o advogado que os representa consideram o numerário insuficiente”, afirma o documento.
Segundo o magistrado, “há evidente detenção irregular de bens públicos (espaço público) pelos requeridos, conforme demonstram os documentos anexados aos autos”. Além disso, afirma, “a situação de insalubridade, insegurança e risco à integridade física dos ocupantes – em especial das crianças e dos idosos -, bem como dos transeuntes, caracteriza perigo de dano que reforça a urgência da medida”. “Embora a causa subjacente seja um problema social complexo, a manutenção da posse de bem público não pode ser obstada por ato que, ao restringir o uso e o funcionamento de um órgão governamental, acaba por violar diretamente o interesse público”, acrescenta.
Vila Esperança
Vila Esperança surgiu em 2016, durante a gestão de Rodney Miranda (Republicanos), em um terreno abandonado. Em 2020, um decreto assinado pelo então prefeito Max Filho (PSDB) declarou a região de interesse social para habitação popular, o que alimentou a expectativa de regularização. O decreto, no entanto, foi revogado em 2022 pelo prefeito Arnaldinho (sem partido), abrindo caminho para a reintegração de posse. A presidente da ocupação, Adriana Paranhos, a Baiana aponta que a empresa Alphaville estaria diretamente ligada às pressões pela retirada das famílias da área.
Com a ocupação no Palácio Anchieta, a proposta apresentada até o momento é a mencionada na decisão judicial, um auxílio financeiro de R$ 3,6 mil – o equivalente a cerca de seis meses de aluguel no valor de R$ 600, valor considerado insuficiente diante da realidade do mercado imobiliário.
A percepção da comunidade é de que tanto o governador Renato Casagrande (PSB) quanto o prefeito Arnaldinho Borgo (sem partido) mantêm uma posição alinhada contra a desapropriação de áreas que poderiam servir como alternativa habitacional.
A execução da reintegração na Vila Esperança havia sido suspensa por determinação do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que exigiu a elaboração de um plano voltado a garantir alternativas habitacionais para as famílias vulneráveis antes da remoção. Após audiência de mediação, a Justiça entendeu, porém, que o plano de desocupação pactuado entre o município, o proprietário da área e a Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), “mostrou-se satisfatório e razoável para mitigar a situação de vulnerabilidade dos ocupantes, quando da execução da ordem de desocupação”, o que é contestado pelas famílias e movimentos sociais.