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Primeira marcha trans do Estado luta por reconhecimento e políticas públicas

Deborah Sabará ressalta que Motim Trans é “grito político” contra a exclusão

Zanete Dadalto

Movimentos em defesa dos direitos da população transgênero articulam a primeira marcha trans do Estado, batizada de Motim Trans, em resposta à tentativa de grupos do movimento “LGB Internacional” de retirar a letra T da sigla LGBTQIA+ e por políticas de inclusão no Espírito Santo. A iniciativa é organizada pela Associação Gold (Grupo Orgulho, Liberdade e Dignidade), em parceria com o Coletivo Trans Encruzilhadas (Ufes), a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), e se firma como um ato político e cultural por visibilidade e garantia de direitos para a população trans e travesti.

O evento está marcado para acontecer no dia 7 de dezembro, um domingo, às 16 horas, com concentração na Escadaria do Palácio Anchieta, no Centro de Vitória. De lá, as pessoas seguirão em um pequeno percurso até a Casa Gold, onde haverá apresentações culturais, palco aberto e distribuição de alimentos. A associação vai abrir inscrições para quem quiser contribuir com apresentações artísticas ou com a produção do evento.

“Vamos ter palco aberto, caldo para as pessoas se alimentarem, e uma tela grande para projeções artísticas. É um espaço de acolhimento e expressão, mas também de enfrentamento político”, destacou a presidente da Associação Gold, Deborah Sabará. Ela explica que o Motim Trans tem como objetivo reafirmar o protagonismo das pessoas trans e travestis na luta por direitos humanos e resistir aos movimentos que tentam aniquilá-las da história do movimento LGBTQIA+. “Há pessoas LGB que querem retirar a população trans da lista de letras LGBT. Isso é violento. É uma forma de nos matar novamente, agora apagando a nossa história”, aponta.

A proposta foi consolidada em reunião nessa quinta-feira (6), na sede da Casa Gold, em Vitória, com a participação de militantes, estudantes e lideranças da comunidade trans para construir coletivamente as pautas e a programação do Motim Trans.

Para a presidente da Gold, essa tentativa de exclusão é um fenômeno que já ocorre em outros países, e precisa ser enfrentado politicamente no Brasil. “Isso começou há alguns anos nos Estados Unidos e na Europa, e agora tenta se reproduzir aqui. Mas foi a luta das travestis e mulheres trans que deu origem ao movimento, lá atrás, em Stonewall [Nova Iorque]. Não dá para apagar isso”, afirmou, lembrando figuras históricas como Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera, conhecidas por suas participações cruciais no levante.

Além de denunciar a exclusão simbólica das pessoas trans dentro do próprio movimento LGBTQIA+, o ato também vai cobrar o avanço das políticas públicas afirmativas para a população trans no Espírito Santo. Entre as principais pautas definidas, estão a aprovação das cotas trans na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e a efetivação do Plano Estadual LGBT.

“Tem uma política estadual que já existe, mas está parada. É um plano que precisa ser revisado e colocado em prática. As ações previstas ali são simples e possíveis, como garantir o uso do nome social, ampliar o acesso ao emprego e reservar vagas para pessoas trans. O poder público tem condições de cumprir isso”, defende Deborah.

Ela destaca ainda a importância de políticas de saúde integral, incluindo o reconhecimento de procedimentos como a depilação a laser, colocação de próteses e reposição capilar como demandas de saúde pública, não de estética. “As pessoas acham que isso é vaidade, mas é saúde. A autoestima melhora, o corpo melhora, a vida melhora”, enfatiza.

O Motim Trans também servirá como etapa preparatória para a Marcha Trans Brasil, que acontecerá em janeiro de 2026, em Brasília, reunindo movimentos de todo o país. “Queremos mobilizar e fortalecer o Espírito Santo para participar da marcha nacional. O Motim é o nosso aquecimento, o nosso grito de resistência local”, enfatizou a ativista.

Interseccionalidade e resistência

Deborah argumenta que luta trans precisa ser compreendida dentro de uma perspectiva interseccional, que leve em consideração as desigualdades de gênero, raça, classe e deficiências que atravessam corpos e vivências.

“Quando se tira uma letra da sigla, quando se separa, a gente perde a dimensão de que as opressões se cruzam. A violência contra pessoas trans também é uma violência contra mulheres, contra pessoas negras, contra pessoas pobres. Tudo isso está ligado”, pontua.

Ela reconhece que, mesmo dentro da comunidade LGBTQIA+, a transfobia continua presente e a luta das pessoas trans é atravessada por uma disputa histórica. “O crime de transfobia não é cometido só por pessoas hétero. Ele também acontece dentro da nossa própria comunidade, quando tentam nos excluir ou nos silenciar”, diz.

Para a militante, o enfrentamento a essas tentativas de exclusão é uma forma de reafirmar o sentido político e coletivo do movimento. “A luta LGBT foi construída na diversidade. É essa diversidade que garante a força do movimento. Quando alguém tenta nos separar, o que está em jogo não é só uma letra, é a nossa história de resistência”.

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