Movimentos defendem fim da escala 6×1, mas há projetos diferentes em tramitação

O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), declarou à imprensa nacional que a Proposta de Emenda Constituição (PEC) que prevê o fim da escala de trabalho 6×1 (seis horas trabalhadas por um dia de descanso) deverá ser votado no início do retorno dos trabalhos legislativos, em fevereiro de 2026. Com a proximidade das eleições, a pauta se tornou prioritária para o governo Lula (PT). Entretanto, ainda há dúvidas sobre qual será o teor da proposta a ser deliberada, e é possível que a redução da jornada não contemple o que defendem os movimentos sociais no Espírito Santo e no Brasil.
O projeto com tramitação mais avançado é a PEC 148/2015, do senador Paulo Paim (PT-RS), que prevê redução da jornada semanal de trabalho para o limite máximo de 36 horas, com cinco dias trabalhados por dois de descanso (5×2). Mas a diminuição da proposta é gradativa, caindo de 44 horas para 40 horas no primeiro ano, depois reduzindo ano a ano até chegar a 36. A limitação a oito horas diárias não se modificaria. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou a iniciativa na primeira quinzena de dezembro.
Para Vinicius Machado, um dos coordenadores do movimento Vida Além do Trabalho (VAT) no Espírito Santo, a opção de reduzir a jornada gradativamente significa “esperar tempo demais”, uma vez que “a classe trabalhadora está adoecida e não pode esperar”. Apesar disso, reconhece avanços na proposta.
A luta contra o fim da jornada de trabalho 6×1 tem sido mobilizada a partir da PEC 8/2025, da deputada federal Erika Hilton (Psol-SP). O projeto prevê que a duração do trabalho normal no Brasil não poderá superar oito horas diárias e 36 horas semanais, com jornada de quatro dias por semana, facultada a compensação de horários e a redução de jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho. Segundo o texto, a PEC entraria em vigor um ano após a data de sua publicação.
Entretanto, o deputado federal deputado Luiz Gastão (PSD-CE), relator da proposta na Subcomissão Especial da Escala de Trabalho 6×1, apresentou parecer no início de dezembro defendendo a redução da jornada de trabalho máxima das atuais 44 horas semanais para 40, mantidos os salários. Ainda assim, seria uma redução em três etapas (42 horas semanais no primeiro ano, 41 no segundo e 40 no terceiro).
Na prática, a escala 6×1 se manteria, distorcendo a ideia original do texto. Gastão argumentou que 36 horas seriam hoje insustentáveis economicamente. Não houve acordo para votação, e deputados petistas pediram vistas do relatório.
Além dessas duas propostas, tramita o Projeto de Lei 67/2025, da deputada federal Daiana Santos (PCdoB-RS), que propõe a redução da jornada semanal máxima para 40 horas, com limite de oito horas diárias e dois dias de descanso, “preferencialmente aos domingos”. Há dispositivos para contemplar a categoria dos trabalhadores do comércio nas mudanças.
O governo do presidente Lula ainda não se definiu sobre qual proposta pretende levar a cabo, e a tendência é que se tente chegar a uma harmonização entre os diferentes projetos. “O governo só correu para aprovar, pois acredito que é algo de interesse político, principalmente porque voltamos a falar sobre o fim da escala 6×1. O movimento tem feito uma pressão enorme para isso acontecer, desempenhando um papel histórico na luta pelo fim da 6×1. A redução da jornada é algo que vem sendo falado há muitos anos, mas nada foi feito – só agora, por pressão do VAT”, opinou Júlia Alves, também coordenadora estadual do VAT, quando da aprovação da PEC de Paulo Paim na CCJ do Senado.
Para Júlia, a eventual aprovação de uma alteração para a escala 5×2 estaria longe da proposta defendida pelos movimentos sociais, que vão continuar lutando por uma escala 4×3, com no máximo 36 horas semanais. A última manifestação pelo fim da escala 6×1 no Espírito Santo ocorreu no dia 23 de novembro.
Impacto na saúde
Em audiência pública na Assembleia Legislativa em maio, Júlia Alves denunciou as consequências físicas, mentais e sociais da escala 6×1, com dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), que apontam que 65,8% dos trabalhadores formais no Brasil estão na nessa escala, dos quais 65% recebem até dois salários mínimos, e 42% até um salário mínimo.
A sobrecarga de trabalho imposta pela jornada tem provocado graves prejuízos, como evidenciam os dados do Ministério da Previdência Social. Em 2024, o número de brasileiros afastados por transtornos mentais e comportamentais atingiu o maior patamar dos últimos dez anos, crescendo 67% em relação a 2023.
Mais de 440 mil trabalhadores foram afastados, sendo os principais motivos transtornos de ansiedade (141.414 casos), episódios depressivos (113.604) e transtorno depressivo recorrente (52.627). Além disso, foram registrados afastamentos por transtorno afetivo bipolar (51.314), transtornos mentais e comportamentais relacionados ao uso de substâncias psicoativas (21.498) e reações ao estresse grave (20.873).
Também aparecem na lista casos de esquizofrenia (14.778), transtornos decorrentes do uso de álcool (11.470) e cocaína (6.873). O levantamento revelou que os afastamentos por transtornos de ansiedade aumentaram mais de 400%, enquanto os episódios depressivos quase dobraram durante a série histórica.

