Acampamento em frente ao Palácio Anchieta contra despejo segue sem prazo para acabar

As famílias da ocupação Vila Esperança, em Vila Velha, seguem acampadas em frente ao Palácio Anchieta, no Centro de Vitória, em resistência à ordem de despejo que ameaça mais de 3,6 mil pessoas. Nessa segunda-feira (1), no fim da tarde, uma comissão de lideranças da comunidade foi recebida pelo governador Renato Casagrande (PSB), acompanhado da secretária de Direitos Humanos, Nara Borgo, de representantes da Defensoria Pública do Estado (DPES), e da advogada do movimento, Maria Elisa Quadros. A reunião, no entanto, gerou frustração e aumentou a sensação de insegurança entre os moradores.
Até o momento, não há previsão para o término do acampamento, que teve início na noite desse domingo (31), para cobrar uma ação do governador em relação ao despejo marcado para a próxima semana, e denunciar a omissão do Estado diante das violações de direitos.
A presidente da ocupação, Adriana Paranhos, conhecida como Baiana, informou que haverá uma nova reunião nesta terça-feira (3), desta vez apenas com representantes da Defensoria Pública e da Secretaria de Direitos Humanos, sem a presença de membros da ocupação. “O governador disse que não havia necessidade. Isso é um desrespeito. Somos nós que estamos sendo ameaçados de despejo e não podemos nem participar da conversa?”, contestou.

No encontro dessa segunda, Baiana relata que o governador reconheceu a situação da comunidade, mas descartou a possibilidade de intervir para garantir a permanência das famílias no território, ocupado desde 2016. “O que nós sentimos é que ele não tem interesse nenhum em ajudar. O governador alegou que, se fizer isso, estaria incentivando novas ocupações. É o mesmo discurso do prefeito Arnaldinho [Borgo (sem partido), de Vila Velha]”, contou.
Casagrande afirmou, ainda, falta de recursos para desapropriar a área, acrescenta Baiana, apesar de reconhecer o decreto de 2020, editado pelo então prefeito Max Filho (PSDB), que declarou a região de interesse social para implementação de um loteamento. “A gente sabe que tem recurso, foram deixados no cofre para negociação de terras. Muitas famílias acreditaram nesse decreto, investiram, construíram suas casas e cultivaram a terra. Agora não podemos simplesmente ser jogados para fora”, criticou.
Na reunião, segundo os relatos, o governador apresentou como alternativa a inclusão das famílias em programas habitacionais futuros, como o Minha Casa Minha Vida, ou a destinação de duas áreas apontadas pela Prefeitura de Vila Velha para reassentamento. Mas Baiana afirma que foi informado prazos ou garantias. “Ele falou que pode colocar a Vila Esperança como prioridade em uma nova lista, mas isso pode ser daqui a cinco, dez anos. Enquanto isso, para onde vão essas famílias?”, questionou.
A proposta imediata segue sendo o pagamento de R$ 2,2 mil em parcela única para apenas 100 famílias, medida homologada pela Justiça no último dia 20 de agosto, quando foi restabelecida a ordem de desocupação. Para o movimento, a decisão é insuficiente e injusta, pois ignora a maioria das famílias que vivem no território há quase uma década.
Após a reunião, os moradores denunciaram que têm enfrentado restrições na mobilização em frente ao Palácio Anchieta. Baiana conta que seguranças chegaram a exigir a retirada das barracas da entrada principal e ameaçaram cortar o acesso a banheiros. “Falaram que, se não tirássemos as barracas, colocariam as pessoas dentro do banheiro. O povo reagiu, fez barulho, e depois voltaram atrás. Mas o clima é de pressão constante”.
Apesar da decepção, os moradores afirmam que permanecerão no acampamento até obterem uma resposta concreta. “Esperávamos que o governador tivesse uma postura de cuidar do cidadão, de assumir um compromisso com a desapropriação da área. Saímos decepcionados, mas seguimos firmes. As pessoas estão cansadas, tem gente adoecendo, mas não vamos sair daqui sem uma solução”, reforçou Baiana.
O prazo da ordem judicial, caso seja contado em dias úteis, termina em 16 de setembro. A incerteza aumenta a apreensão entre as famílias, que já denunciam impacto emocional grave, especialmente entre idosos e crianças. No acampamento, as famílias têm recebido apoio de movimentos sociais e associações, como o Grupo Orgulho, Liberdade e Dignidade (Gold), que abriu as portas de sua cozinha solidária para oferecer alimentação.
Deborah Sabará, coordenadora da entidade, explica que a ação nasce do compromisso de contribuir com pessoas em situação de vulnerabilidade. “Sempre sonhamos com a cozinha solidária, pensando em momentos em que pudéssemos ajudar quem precisa. Abrir para as famílias da Vila Esperança é reconhecer que todos necessitam de um lar. Oferecer comida e disponibilizar as tendas é uma forma de apoiar a luta por dignidade e por um lugar para chamar de seu”, afirmou.

A ocupação Vila Esperança surgiu em 2016 como resposta à falta de acesso à moradia digna na região, durante a gestão do então prefeito Rodney Miranda (Republicanos), em um terreno abandonado que, ao longo dos anos, foi transformado em um território vivo, produtivo e solidário. Os moradores construíram suas casas com recursos próprios e se apoiaram no decreto do ex-prefeito Max Filho (PSDB). Entretanto, em 2022, o prefeito Arnaldinho Borgo (Podemos) revogou o ato, cedendo às pressões do setor privado.
Desde então, as tentativas de diálogo com a Prefeitura de Vila Velha e o Governo do Estado não avançaram para encontrar uma solução que garantisse o direito à moradia e a permanência das famílias no território. Baiana aponta que a empresa Alphaville estaria diretamente ligada às pressões pela retirada das famílias da área.