Doações ajudam manter o acampamento no Palácio Anchieta para pressionar o Estado
Há 13 dias em um acampamento em frente ao Palácio Anchieta, os ex-moradores da ocupação Vila Esperança, em Jabaeté, Vila Velha, têm contado com a solidariedade para manter o acampamento e, consequentemente, a luta pela moradia. Organizações da sociedade civil e pessoas físicas se mobilizam para garantir alimentação, roupas e outros itens necessários para tentar assegurar, minimamente, a dignidade das famílias.

Uma das lideranças do movimento, Adriana Paranhos, a Baiana, relata que diante do fechamento da porta do Palácio, impossibilitando que as pessoas utilizem o banheiro, foram doados dois banheiros químicos. Também estão sendo feitas doações de alimentos, que as famílias preparam em uma cozinha improvisada, além de água e roupas para as crianças.
As doações podem ser feitas direto no acampamento ou em dinheiro, pelo Pix (27) 99949.8701. “São pessoas boas que tentam nos ajudar nesse momento em que jogaram fora nossa oportunidade de ter nossas casas”, diz Baiana. Ela se refere ao fato de que, apesar de o ex-prefeito de Vila Velha, Max Filho (PSDB), ter assinado um decreto no qual declarou a área da ocupação como região de interesse social para habitação popular, foi efetivada a reintegração de posse.
O decreto foi revogado em 2022 pelo atual prefeito, Arnaldinho Borgo (sem partido). A reintegração foi efetivada na manhã dessa terça-feira (9), conforme decisão do juiz Manoel Cruz Doval, da 6ª Vara Cível de Vila Velha. “É muito triste, trabalhadores que pegam ônibus lotado para construir prédios estão com seus filhos nas ruas diante dos olhos do governador do Estado”, desabafa Baiana.
A situação no acampamento, relata, é precária. Além de não poderem mais utilizar o banheiro do Palácio, as chuvas molharam os pertences das famílias, como roupas e colchão. “É revoltante ver as pessoas no poder público olhar para os mais humildes e não querer cuidar”, lamenta.
Com a reintegração, os pertences, como os móveis, estão sendo deixados nas vagas de garagem da rua do Palácio. Outra liderança do movimento, Josué Santos, relata que ainda há pessoas tentando trazer seus pertences, o que tem sido impossibilitado pela falta de recursos financeiros para pagamento do frete. As que conseguiram transportar, tiveram que carregar até o local onde o caminhão estava, pois não foi autorizada a entrada dos veículos na ocupação. Outras pessoas não chegaram a tempo de retirar seus pertences, que foram destruídos junto com suas casas.
Com a ocupação no Palácio Anchieta, a única proposta apresentada até o momento é a ampliação do valor do auxílio financeiro para as famílias, que passaria de R$ 2,2 mil para aproximadamente R$ 3,6 mil – o equivalente a cerca de seis meses de aluguel no valor de R$ 600, valor considerado insuficiente diante da realidade do mercado imobiliário.
A percepção da comunidade é de que tanto o governador Renato Casagrande (PSB) quanto o prefeito Arnaldinho Borgo mantêm uma posição alinhada contra a desapropriação de áreas que poderiam servir como alternativa habitacional. Baiana aponta que a empresa Alphaville estaria diretamente ligada às pressões pela retirada das famílias da área.
A execução da reintegração havia sido suspensa por determinação do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que exigiu a elaboração de um plano voltado a garantir alternativas habitacionais para as famílias vulneráveis antes da remoção. Após audiência de mediação, a Justiça entendeu, porém, que o plano de desocupação pactuado entre o município, o proprietário da área e a Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), “mostrou-se satisfatório e razoável para mitigar a situação de vulnerabilidade dos ocupantes, quando da execução da ordem de desocupação”, o que é contestado pelas famílias e movimentos sociais.
Nessa quinta-feira (11) o Vicariato para Ação Social Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória divulgou uma nota de “solidariedade e indignação” diante da reintegração de posse. “A dolorosa cena de famílias, incluindo crianças, idosos e pessoas com deficiência, desalojadas e sem amparo, revela uma ferida profunda na nossa sociedade: a ausência do direito fundamental à moradia digna”. O vicariato recorda que, no artigo 6º, a Constituição garante “a moradia como um direito social”. “No entanto, o que presenciamos em Vila Velha foi o descumprimento flagrante desse direito”, diz a nota.