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Estudantes da Ufes querem retirada de busto de ex-reitor que apoiou a ditadura

Busto de Alaor de Queiroz Araújo, que dá nome ao campus de Goiabeiras, está na Reitoria

Os estudantes do curso de História da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) protestam, nesta quinta-feira (13), pela retirada do busto do ex-reitor Alaor de Queiroz Araújo, nomeado em 1965 pelo então presidente Humberto de Alencar Castelo Branco para assumir o posto. A manifestação, que faz parte da programação da 17ª Semana de História, será a partir das 18h, na Reitoria, onde se encontra o busto.

Foto: Acervo Coleções Especiais/Biblioteca Central/Ufes

Da Reitoria, os estudantes marcharão até o auditório do IC III, no Centro de Ciências Humanas e Naturais (CCHN), onde acontecerá a última mesa do evento, cujo tema é “Movimento Estudantil – atuação durante a ditadura militar”, com a diretora da União Nacional dos Estudantes (Une), Loyane Lô; a pesquisadora Erika Fanticelli; a diretora da União Brasileira de Estudantes Secundaristas, Anna Júlia Valim; e o militante dos direitos humanos Perly Cipriano.

A diretora de articulação do Centro Acadêmico Livre de História Professor Cléber Maciel (CA), Maria Eduarda do Nascimento Louzada, relata que, com a mobilização pela cassação dos títulos de Doutor Honoris Causa concedidos aos ex-presidentes Emílio Garrastazu Médici e Humberto de Alencar Castelo Branco e de Rubem Carlos Ludwig, ministro da Educação no governo João Batista Figueiredo, em fevereiro deste ano, o professor do Departamento de História e integrante da Comissão da Verdade da Ufes, Pedro Ernesto, destacou o apoio de Alaor aos militares.

Maria Eduarda afirma que esse apoio se deu, por exemplo, com a implementação do projeto educacional da Usaid, a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, fundada em 1961 e extinta este ano, pelo governo Donald Trump. Com o golpe militar, o Ministério da Educação (MEC) fez acordos com a Usaid, que tinham como uma de suas propostas a precarização e privatização do ensino público.

Entre os impactos disso na Ufes, afirma a líder estudantil, está um aumento exorbitante do valor da refeição no Restaurante Universitário (RU), motivando a manifestação dos estudantes, que foi reprimida e culminou na detenção de manifestantes. A repressão ao movimento estudantil, segundo Maria Eduarda, impactou, inclusive, na arquitetura da universidade. Um exemplo dado por ela são os prédios do Cemuni, cuja construção teve início na gestão de Alaor.

Alaor de Queiroz Araújo em visita às obras do Cemuni. Foto: Acervo Coleções Especiais/Biblioteca Central da Ufes

Ela destaca que o Cemuni, ao contrário de outros prédios do campus de Goiabeiras, é fechado, com somente duas entradas. De acordo com Maria Eduarda, era uma forma de facilitar o monitoramento das pessoas e dificultar o contato com outras, uma vez que a arquitetura facilita um isolamento. Alaor, inclusive, dá nome a campus. A diretora de Articulação do CA informa que, inicialmente, o pleito é pela retirada do busto, por ser algo mais simples. Contudo, o próximo passo é a reivindicação pela mudança do nome do campus.

Alaor era vice-reitor na gestão de Fernando Duarte Rabelo, também nomeado pelo governo ditatorial, mas que, ao deixar o posto, foi substituído. Fernando dava nome a uma escola estadual em Santa Helena, Vitória. Contudo, em outubro último, a Assembleia Legislativa aprovou o Projeto de Lei (PL) 450/2025, de autoria da deputada estadual Camila Valadão (Psol), que mudou o nome da unidade de ensino para Professora Flávia Amboss Merçon Leonardo.

A escola, hoje, realiza um concurso para a nova logomarca. Flávia foi uma das vítimas do massacre ocorrido em 25 de novembro de 2022, em Aracruz, norte do Estado, onde um adolescente de 16 anos vitimou três professoras e uma estudante ao entrar armado em duas escolas, nas quais disparou vários tiros. Além de professora, Flávia era pesquisadora e ativista do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). “Não faz sentido que uma escola pública continue homenageando uma figura associada ao autoritarismo e à ditadura, enquanto temos educadoras como Flávia, que são exemplos de compromisso com a democracia, a educação e os direitos humanos”, defendeu Camila Valadão durante a sessão na qual o PL foi aprovado.

Cassação de títulos

A “desomenagem” a defensores da ditadura militar tem ganhado força na Ufes. Em fevereiro deste ano, a decisão pela cassação do título de doutor Honoris Causa de Castelo Branco e Rubem Carlos Ludwig foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Universitário. O relatório em defesa da cassação foi apresentado por Maurício Abdalla, professor do Departamento de Filosofia e integrante da Comissão de Assuntos Didáticos, Científicos e Culturais, que tem como uma de suas atribuições avaliar as cessões desse tipo de título.

Castelo Branco em solenidade de entrega de título de Doutor Honoris Causa. Foto: Arquivo/Ufes

O título de Doutor Honoris Causa é a maior honraria da universidade e, segundo o estatuto da Ufes, é destinado para pessoas que contribuíram para ações da ciência, artes e cultura, e causas do país e da humanidade.

O debate sobre a cassação dos títulos foi provocado, inicialmente, pela Comissão da Verdade da Ufes (CVUfes), que em 2017 apresentou um relatório na instituição de ensino com recomendações, uma delas, a cassação dos títulos. Maurício Abdalla representava a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória (CJP) no Comitê Estadual para a Prevenção e Erradicação da Tortura no Espírito Santo (Cepet), para onde levou a discussão.

O Cepet, então, com base no parecer da Comissão da Verdade, solicitou à Reitoria, que na época era comandada por Reinaldo Centoducatte, a cassação. Contudo, não houve resposta por parte da universidade. Em 2018, Maurício contatou novamente a Reitoria sobre o assunto, e permaneceu sem resposta. Em março de 2024, o Ministério Público Federal (MPF) expediu um ofício para a Reitoria, comandada na ocasião por Paulo Vargas, recomendando a revisão de homenagens e títulos concedidos pela universidade a apoiadores e autoridades da ditadura.

O assunto foi tratado na primeira sessão do Conselho Universitário daquele ano, em março. No mês seguinte, já na gestão do reitor Eustáquio de Castro, foi encaminhado um ofício ao Conselho para apreciação do tema. Como o documento do MPF fazia menção somente a Emílio Garrastazu Médici e Rubem Carlos Ludwig, Eustaquio, no ofício, incluiu o nome do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco após uma conversa com o professor Pedro Ernesto Fagundes, membro da CVUfes, que informou que Castelo Branco também havia recebido o título. No caso da concessão do título a Castelo Branco, não há registros documentais na universidade, somente fotográficos.

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