Prefeito Micula anunciou reajuste de 7,87%, mas índice ainda não alcança piso nacional

O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) proibiu o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública (Sindiupes) de deflagrar a greve dos profissionais do magistério da rede municipal de João Neiva. A decisão liminar foi proferida na sexta-feira (3) pelo desembargador Arthur José Neiva de Almeida, a pedido da gestão de Paulo Sérgio Micula (Republicanos), após a entidade notificar sobre o movimento paredista, que teve início na última quinta (2), com ato público, em razão da interrupção nas negociações sobre a aplicação do piso salarial nacional da categoria.
Atualmente, o salário inicial pago aos professores de João Neiva é de R$ 1,9 mil, valor muito abaixo dos R$ 3.042 fixados pelo piso nacional do magistério para a jornada de 25 horas semanais. A diferença de R$ 1,1 mil por mês representa uma perda anual de aproximadamente R$ 14 mil, como aponta o dirigente do sindicato no município, Carlos Duarte. “É um recurso que faria diferença na vida das famílias dos trabalhadores da educação”, enfatiza.
A prefeitura alegou que a paralisação seria “ilegal e abusiva”, por atingir serviço essencial e não prever manutenção de efetivo mínimo em sala de aula. Também argumentou que as negociações não estavam encerradas, mas dependiam de “cálculos complexos” sobre o impacto financeiro do piso salarial e o equilíbrio atuarial do Instituto de Previdência dos Servidores Municipais de João Neiva (IPSJON).
Na decisão, o desembargador considerou que os requisitos legais para a deflagração da greve não foram atendidos por não haver previsão de manutenção de um percentual mínimo de servidores nem comunicação de um prazo determinado para o término da paralisação. Além de deferir o pedido de tutela de urgência, proibiu o sindicato de deflagrar o movimento paredista total, sob pena de multa diária de R$ 5 mil em caso de descumprimento, e intimou o Sindiupes para apresentar resposta no prazo legal e dar cumprimento imediato à decisão.
Categoria ‘frustrada’
Após três dias de paralisação, o Sindiupes realizou uma assembleia nesta segunda e discutiu a proposta apresentada pela gestão com a categoria, que aprovou o encerramento do movimento paredista. Segundo o dirigente da entidade no município, a prefeitura se comprometeu a enviar à Câmara Municipal um projeto de lei com um reajuste de 7,87% até o fim do ano.
Ele destaca que o reajuste anunciado pelo prefeito em reunião com os representantes do sindicato representa um avanço, mas ainda insuficiente para corrigir a defasagem acumulada. “A defasagem é muito grande. Mesmo com esse aumento, o salário do professor inicial ainda ficará bem abaixo do piso nacional. A categoria se sente frustrada, esperava bem mais, porém preferimos aceitar o que foi proposto, porque mais vale 8% entrando no bolso do que 58% voando”.
Ele lembra que, em Barra de São Francisco, noroeste do Estado, a Justiça impediu uma paralisação antes mesmo de ela começar, declarando-a ilegal logo no primeiro dia de notificação. “Isso preocupa. Mostra como o direito de greve dos servidores públicos está cada vez mais ameaçado”, observou.
Segundo Carlos, o próprio prefeito reconheceu que a defasagem acumulada nos vencimentos do magistério chega a 57,87%, mas justificou que o município passa por dificuldades financeiras decorrentes da queda da arrecadação. Micula apontou que o percentual prometido é adicional aos 5% de aumento já concedidos no início de 2025 e se comprometeu a enviar o projeto de lei até o fim do ano, mas o reajuste não será retroativo.
“Mesmo com esse novo aumento, os salários continuam em defasagem. O professor que deveria estar ganhando R$ 4,5 mil, segue recebendo R$ 3 mil, e o inicial, que deveria estar em R$ 3 mil, está recebendo R$ 1,9 mil. É uma diferença gritante”, criticou.
Ainda sobre a reunião, ele conta que o prefeito argumentou que parte da defasagem vem de gestões anteriores e que sua administração é responsável apenas por uma fração dessa dívida. O sindicalista, no entanto, contesta. “A gente não quer saber de quem é a dívida. A dívida é do município. Enquanto ele for prefeito, é ele o responsável por começar a pagar essa conta”, reforçou.
A greve dos educadores se estendeu até a manhã dessa segunda-feira e foi precedida de um estado de greve que se estendia havia meses, com a categoria aguardando sem sucesso uma resposta da prefeitura. Embora tenha aceitado a proposta do Executivo, a categoria pretende continuar mobilizada e acompanhar o envio do projeto de lei ao legislativo. O Sindiupes também cobra que o reajuste de 2026 siga integralmente o índice nacional.
A maioria dos municípios do Estado descumpre a lei e mantém professores recebendo abaixo do salário-base definido anualmente pelo Ministério da Educação (MEC). Segundo levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), apenas 37% das prefeituras capixabas pagaram corretamente o piso nacional do magistério em 2023, o que colou o Espírito Santo na segunda pior posição do país no cumprimento da legislação, ficando atrás apenas de Roraima (33,3%).
Neste ano, apenas 20 dos 78 municípios capixabas comprovaram conformidade com o piso nacional, de acordo com o Ministério Público Federal, que notificou 65 municípios para recomendar a atualização dos vencimentos do profissionais da educação. A Comissão de Educassão da Assembleia Legislativa chegou a questionar as prefeituras que receberam a notificação, entre elas, João Neiva, sobre os motivos que levam ao descumprimento, mas o município não respondeu à tentativa de comunicação.