Quarta, 24 Abril 2024

Universalização da educação ainda é desafio para o Espírito Santo

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Uma pesquisa divulgada recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) evidencia desigualdades históricas no acesso à educação. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua aponta que a taxa de analfabetismo no Espírito Santo é maior entre negros, mulheres, idosos, e no interior. "Há uma dívida social histórica do Estado brasileiro com essas populações de maneira geral, e também uma dívida educacional, de uma oferta que permita ter acesso escolar", diz Edna Castro, professora aposentada do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Em 2019, ano dos dados analisados pela pesquisa, a taxa de analfabetismo no Estado caiu 0,2% e ficou em 5,3% de pessoas com 15 anos ou mais, representando um universo de 170 mil habitantes. O índice é mais alto conforme a faixa etária, chegando a 17,8% no Espírito santo entre os maiores de 60 anos. "O analfabetismo não é uma erva daninha que precise ser erradicada. O que precisamos é trabalhar na perspectiva de universalização da educação", adverte a professora lembrando os ensinamentos de Paulo Freire.

Historicamente, o País tem enfrentado o analfabetismo por meio ações de campanhas, numa lógica de políticas compensatórias, dependendo de gestões públicas momentâneas e que não vão ter continuidade dentro de um projeto educativo. Edna Castro considera que Educação de Jovens e Adultos (EJA), modalidade de ensino público, se distancia desse formato para trabalhar numa perspectiva de consolidar a educação como direito e de sua efetivação como política pública permanente.

No EJA, explica, a alfabetização é parte do processo de escolarização, que deve ir além e concluir os conteúdos e conhecimentos básicos não só para uma instrução formal, mas para uma formação cidadã. E há de se lembrar que existe também o analfabetismo funcional, no qual embora a pessoa tenha passado pela escola, enfrenta dificuldades no domínio de leitura e interpretação.

"A educação é um direito de todos, independente da idade ou da situação social", reforça a professora. Negar o acesso à educação é negar um direito que abre caminho para o acesso a muitos outros direitos.

Integrante do Fórum de Educação de Jovens e Adultos do Espírito Santo, ela lembra que o processo de escolarização no Brasil se massifica com o impulso da industrialização, que demanda por mão de obra especializada, que era menos necessário num país até então eminentemente agrícola. Mesmo assim, o acesso ainda fica por muito tempo restrito às classes dominantes. "As desigualdades vão pautando a possibilidade ou não de assumir esse direito", afirma, lembrando que o reconhecimento constitucional da educação como direito vai se dar apenas em 1988.

Apesar dos avanços na inclusão de lá pra cá, até hoje as desigualdades permanecem e são explicitadas pelos dados. Em relação à educação básica obrigatória, no Espírito Santo, menos da metade da população com mais de 25 anos concluiu o Ensino Médio (47,6%, pouco abaixo da média nacional).

O Estado, assim como a tendência nacional, se aproxima de uma universalização do acesso entre pessoas de 6 a 14 anos, que em 2019 chegou a 99,7% do total, incluindo 100% na capital, Vitória. Quando olhamos para o Ensino Médio, porém, o índice cai significativamente: 89,5% dos jovens de 15 a 17 anos estão cursando regularmente.

Edna Castro aponta como uma preocupação crescente a inclusão destes jovens que não concluíram o Ensino Médio no tempo previsto, que tem sido uma crescente. "Não se tratam mais de pessoas que não tiveram acesso à escola, mas que passaram por ela, mas a escola não deu conta de cumprir sua tarefa, que é ofertar condições para que saiam com pleno domínio das habilidades que necessitam e para o exercício da cidadania".

Esse novo público é também um desafio, pois representa outro perfil geracional que precisa interagir com adultos e idosos dentro da EJA. "A diversidade é grande nas turmas e são desigualdades que marcam. Somos desafiados a tentar responder a tudo isso", aponta. Chegar a sujeitos jamais contemplados, como trabalhadores do campo, quilombolas, catadores e população em situação de rua são desafios grandes.

A EJA se converte também num espaço de socialização para muitos dos que estão cursando, representado também um espaço de apoio importante dentro de suas trajetórias. Nesse sentido, os militantes da educação se preocupam com o caráter semipresencial que se vem afirmando para a EJA no Espírito Santo, que enfraquece os vínculos sociais e também precariza o trabalho dos professores, prejudicando o processo de educação. "A relação pedagógica é sempre de interação, não pode ser substituída", enfatiza Edna.

Com a pandemia do coronavírus e a paralisação das aulas, a situação fica ainda mais questionável, já que muitos estudantes não possuem acesso às tecnologias digitais. Para ela, a pressa em retomar urgentemente as aulas preocupa e não se justifica. "É um faz de conta. Concluir o quê? Para quê? Com que qualidade?", pergunta, apontando que além da questão de proteger as vidas, a garantia do processo de ensino e aprendizagem é mais importante do que a regularização de um calendário.

Para Edna Castro, o principal problema para a efetivação e qualidade da EJA é a garantia do investimento público. Nesse sentido, uma disputa está em curso e pode ter desfecho na próxima semana, quando o Congresso Nacional deve realizar votação sobre o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Ela lembra que foi só no atual Fundeb, que vigora de 2007 a 2020, que a Educação de Jovens e Adultos foi incluída, garantindo recursos aplicados neste segmento. "A gente quer que seja tratado como todos outros segmentos da educação, senão os gestores vão priorizar os que dão condições de trazer mais dinheiro para sua gestão", aponta.

"É preciso muita mobilização para garantir a continuidade das políticas e busca por atingir as proposta do Plano Nacional de Educação para uma educação pública, de qualidade, para todos e socialmente referenciada", conclui.

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