Julgamento no TRE-ES terminou nesta segunda-feira após pedidos de vista

O jurista Adriano Sant’Ana Pedra, do Tribunal Regional Eleitoral do Estado (TRE-ES), foi o relator na segunda instância da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) contra Gedson Brandão Paulino (Republicanos) e Fernando Caprini Volponi (PSB), prefeito e vice reeleitos em Iconha, no sul do Estado. No último dia 19 de dezembro, ele havia votado a favor da cassação da chapa vencedora nas eleições de 2024. Em sessão desta segunda-feira (27), voltou atrás e decidiu acolher o recurso de Brandão e Volponi.
O plenário do TRE-ES se posicionou unanimemente à favor do novo entendimento, incluindo o desembargador Dair José Bregunce de Oliveira, que já havia adotado o entendimento do relator e acabou voltando atrás junto com ele. Adriano Sant’Ana Pedra decidiu fazer uma reavaliação após a juíza Isabella Rossi Naumann Chaves inaugurar a divergência de votação no último dia 22.
A AIJE foi solicitada pelo Podemos, partido do candidato a prefeito concorrente, o ex-prefeito João Paganini. A alegação é de que o governo estadual assinou convênio para repasse de recursos para obras da prefeitura em 27 de junho deste ano, dias antes do período de proibição para realização de transferências voluntárias, custeando intervenções previamente contratadas para capeamento asfáltico de ruas de paralelepípedo, no valor total de R$ 5 milhões.
Segundo a acusação, as obras tiveram caráter flagrantemente eleitoreiro, pois representariam “medida meramente estética e superficial, desconsiderando pareceres técnicos”. O prefeito e o vice contra-argumentaram, dizendo que a obra foi licitada e contratada muito antes do período eleitoral, em janeiro deste ano, para promover melhorias de infraestrutura e beneficiar comunidades do município, e que o convênio com o governo estadual foi para custear uma parte da obra.
A defesa da chapa vencedora argumentou que o convênio e o repasse do recurso ocorreu dentro do prazo limite de três meses antes da eleição, e não foi provado que o prefeito utilizou suas redes sociais para fazer propaganda da obra – e mesmo que o fizesse, seria legítimo dentro do processo eleitoral, segundo a defesa. Gedson e Fernando, porém, foram condenados em primeira instância, e o Ministério Público Eleitoral (MPE) também foi favorável à condenação
Em seu primeiro voto, em dezembro, Adriano Sant’Ana Pedra afirmou que a contração da empresa Renova Contruções LTDA, a partir da adesão a uma ata de registro de preços de Barra de São Francisco, ocorreu antes mesmo de o convênio com o governo estadual ser firmado. Além disso, foi feito um pagamento de R$ 1,8 milhão em agosto, o que representa quase 40% do valor total previsto pela prefeitura para se gastar nesse tipo de obras entre 2022 e 2025.
“O recebimento do recurso estadual, dias antes do período vedado, não muda o fato de que o objetivo da norma é que os recursos dessa natureza, ressalvando exceção legal, não sejam utilizados nesse período antecedente ao pleito, exatamente para preservação da paridade de armas entre os candidatos”, argumentou.
O magistrado ressaltou, ainda, que a diferença entre o primeiro e o segundo colocados na eleição foi de apenas 330 votos. Considerando o limite de gastos da campanha para prefeito no município, de R$ 159,8 mil, comparado ao volume de recursos, bem como o local de maior concentração de população e a visibilidade da obra, o relator considerou que houve, sim, abuso de poder político.
Novo entendimento
Na sessão de dezembro, Isabella Rossi Naumann Chaves pediu vista do processo para analisá-lo melhor. Seu voto foi apresentado no último dia 22 de janeiro, após o recesso judiciário. Segundo a juíza, apenas a transferência financeira entre entes governamentais durante o período eleitoral é vedada pela legislação, e não a execução de obra em si.
A magistrada defendeu ainda que “não se afigura razoável, ao meu sentir, que uma obra pública de capeamento asfáltico, executada também em diversos outros municípios do Espírito Santo por meio de convênios com o governo estadual, como é de conhecimento geral, seja suficiente para configurar abuso e causar a cassação de candidato eleito”.
Outros fatores citados pela juíza foram o orçamento, considerado compatível, e a ausência de elementos que qualificassem a personalização da chapa vencedora com relação à obra, que inclusive teria enfrentado resistência da população. Apesar de votar pelo acolhimento do recurso eleitoral, Isabella opinou pela necessidade de citação dos acusados para apuração dos “fatos supostamente ímprobos” do caso.
Com o voto divergente, Sant’Ana Pedra pegou novamente os autos do processo para revisar seu voto. De acordo com seu novo entendimento, “embora o capeamento asfáltico tenha ocorrido em período próximo às eleições, a transferência de recursos estaduais se deu antes da vedação imposta pela legislação eleitoral”.
“No caso em análise, embora o uso de recursos públicos tenha proporcionado ao gestor público angariar a simpatia dos munícipes, potenciais eleitores do pleito que se avizinhava, é crucial verificar se foram observador ou não os precisos limites de sua atuação. Em outras palavras, é preciso aqui distinguir uso do abuso de poder”, defendeu.
“Ademais”, prosseguiu o relator, “como já observado, eventuais inconsistências apontadas no processo de contratação e execução do serviço de capeamento asfáltico pertencem à esfera administrativa e devem ser analisadas pelos órgãos competentes, como o respectivo Tribunal de Contas. A Justiça Eleitoral não é o foro adequado para análise de mérito de atos administrativos, salvo quando comprovado que tais atos foram instrumentalizados para comprometer a igualdade do pleito eleitoral, o que não foi comprovado de forma robusta pelas evidências juntadas aos autos.”
Gedson foi eleito prefeito para o primeiro mandato a prefeito pelo Republicanos, em 2020. Ele também teve mandato como vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e concorreu à prefeitura em 2016 pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Apesar de ter origem política em um partido de esquerda, o atual chefe do Executivo tem apresentado uma guinada à direita ao longo dos anos. Nas eleições de 2024, o chefe do Exectutivo foi reeleito com 4,6 mil votos (51,84%), contra 4,1 mil (45,95%) de João Paganini e 199 votos (2,21%) de Hugo Durães (PT).
Os autores da ação ainda podem recorrer da decisão. Pelo menos dez cidades capixabas, incluindo Iconha, possuem ações na Justiça de questionamento aos resultados das últimas eleições.