Ministro André Mendonça interrompeu processo para análise por até 90 dias

O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, nesse domingo (24), após pedido de vista do ministro André Mendonça, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7847, que contesta a lei capixaba do veto de pais e responsáveis à participação de estudantes em atividades pedagógicas relacionadas a gênero e à orientação sexual nas escolas públicas e privadas do Estado. O caso tinha recebido o primeiro voto na última sexta-feira (21), com a manifestação da ministra relatora, Cármen Lúcia, que defendeu a derrubada integral da norma, e os demais ministros poderiam apresentar seus votos até a próxima segunda-feira (1º), prazo que agora fica interrompido.
André Mendonça tem 90 dias úteis para devolver o processo, podendo fazê-lo antes. “É possível que outros ministros também peçam vista, o que suspenderia novamente o processo. E ainda existe a possibilidade de pedido de destaque, deslocando o julgamento para o plenário físico”, explica a advogada Amanda Souto, que representa as entidades autoras da ação, Aliança Nacional LGBTI+, Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas e Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros.
Até o avanço do trâmite, a Lei 12.479/2025 segue formalmente vigente, embora ainda sem regulamentação efetiva em boa parte das redes municipais e estadual. A decisão definitiva do Supremo determinará se o Estado poderá ou não impor restrições a conteúdos pedagógicos ligados a gênero, à sexualidade e à diversidade nas escolas capixabas.
A ADI 7847 já recebeu adesão de amici curiae (amigos da corte), como o Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), o Psol, a Executiva Estadual da Rede Sustentabilidade e um coletivo de defensorias públicas estaduais. O Fonatrans teve sua legitimidade questionada pela relatora, que considerou não se tratar de entidade nacional representativa de toda a categoria trans.
Enquanto aguarda a conclusão do julgamento no STF, outras duas ações contra a mesma norma tramitam no Judiciário capixaba, uma proposta pelo Psol e outra pelo PT, ainda sem decisão. Também há contestação no Tribunal de Contas do Estado (TCES), que analisa pedido do Ministério Público de Contas para suspender a regulamentação da lei.
Inconstitucionalidade
No voto publicado na sexta-feira, a ministra Cármen Lúcia afirmou que a lei capixaba “interviu de forma indevida no currículo pedagógico submetido à disciplina da Lei Nacional n. 9.394/1996”, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Para ela, o legislador estadual ultrapassou a competência suplementar dos estados, ao criar uma espécie de autorização familiar para temas que integram políticas educacionais previstas no âmbito federal.
A relatora destacou que a Constituição atribui à União competência privativa para legislar sobre diretrizes e bases da educação e citou precedentes do próprio STF que derrubaram normas semelhantes em municípios e estados. “Figura-me inviável e completamente atentatório ao princípio da dignidade da pessoa humana proibir que o Estado fale, aborde, debata e, acima de tudo, pluralize as múltiplas formas de expressão do gênero e da sexualidade”, registrou.
Para a ministra, a lei é formal e materialmente inconstitucional por violar princípios como igualdade, liberdade de ensinar e aprender, pluralismo pedagógico e o dever estatal de combate à discriminação. Ela também reiterou o parecer do governador Renato Casagrande (PSB), que, apesar de não ter se manifestado no prazo de sanção, enviou ao STF posicionamento defendendo a inconstitucionalidade da lei.

