Recurso da gestão de Arnaldinho foi acatado após duas decisões desfavoráveis
Por Manaira Medeiros e Mariah Friedrich

As obras turísticas e urbanísticas no Morro do Moreno anunciadas pelas gestões de Renato Casagrande (PSB) e Arnaldinho Borgo (sem partido) em Vila Velha estão novamente autorizadas. A decisão, da noite dessa quarta-feira (19), é do Tribunal de Justiça do Estado (TJES), em Agravo de Instrumento protocolado pela prefeitura para contestar a Ação Declaratória de Desapropriação Indireta com Indenização movida pelos herdeiros da família Aguiar, proprietários de uma área de quase 252 mil metros quadrados na região.
A relatadora do caso, desembargadora Eliana Junqueira Munhós Ferreira, apontou “incompatibilidade lógica e jurídica insuperável” e “grave violação ao princípio da supremacia do interesse público, ensejando risco de dano reverso ao erário e à coletividade, superior ao risco de dano aos particulares”.
Segundo ela, os autores – Antonio Fernando Sarmento de Aguiar, Claudia Lucia de Aguiar Martins e Helena Gilner de Aguiar Drews – “buscam, simultaneamente, o reconhecimento da desapropriação indireta (que pressupõe o apossamento irreversível do bem pelo Poder Público e, portanto, a perda do domínio) e a tutela provisória inibitória e possessória para impedir a intervenção física do município agravante na área”. No entanto, considera, “o direito a obter a ‘justa indenização’ pela ocupação pública da área é mutuamente excludente com o direito a coibir a realização da obra pelo município agravante”.
A magistrada reforça que a “desapropriação indireta pressupõe justamente o apossamento da área particular pelo Poder Público. O pleito de tutela provisória, ao buscar impedir a ocupação pelo ente público, contradiz a própria causa petendi da ação principal, que é o reconhecimento de um apossamento já consumado, com a consequente fixação da indenização devida”.
Ao prevalecer essa “inversão lógica e procedimental”, afirma, os interesses particulares se sobrepõem aos interesses públicos primários, “que, no caso, manifesta-se pela execução de obras destinadas a urbanizar e modernizar local de grande acesso e circulação, notoriamente o Morro do Moreno”.
A decisão diz ainda que os herdeiros “pretendem receber a ‘justa indenização’ pelo apossamento administrativo da área particular, o que depende do aguardo do procedimento pertinente, seja na via administrativa ou judicial, mas não justifica a paralisação da obra de interesse coletivo”.
Além disso, que os “os próprios autores agravados afirmam que o local em que será realizada a obra pública não era por eles utilizado por se tratar de local de preservação ambiental e que é frequentado habitualmente pela população, de forma que a atuação física do município no local não configura um esbulho possessório sobre o qual o Poder Judiciário tenha que intervir para fazer cessar”.
Eliana Munhós defende que “não há nenhum prejuízo para os autores agravados na continuidade da obra pública em local não utilizado por eles. Caso a ação de desapropriação indireta venha a ser julgada procedente, o direito à justa indenização será plenamente satisfeito ao final, corrigido monetariamente e acrescido dos juros legais, garantindo a reparação econômica”.
Nesse ponto, completa, a prefeitura “já demonstrou ter editado decretos de utilidade pública (UPU) das áreas que serão utilizadas na obra para dar início ao processo de desapropriação direta do local (ID 17135856), o que reforça o descabimento da manutenção de uma tutela provisória que, ao proibir a obra, obstrui o próprio procedimento formal de aquisição que os agravados pleiteiam indiretamente”.
O Diário Oficial de Vila Velha dessa quarta-feira publicou quatro novos decretos assinados pelo prefeito declarando utilidade pública para fins de desapropriação de terrenos pertencentes à família Aguiar no Morro do Moreno. Os atos determinam que as áreas, que variam entre 300 m² e 315 m², serão utilizadas para “construção de estruturas de apoio ao visitante” e implantação da “sede e do portal do Monumento Natural Morro do Moreno [Mona]”. Em todos eles, o prefeito afirma que, se não houver acordo amigável, autoriza a Procuradoria Geral a ingressar com ação judicial de desapropriação, com pedido de imissão provisória na posse.
O projeto turístico e urbanístico vai custar R$ 10 milhões e inclui a pavimentação de aproximadamente 730 metros da via principal de acesso ao topo, a construção de portaria, sanitários, sala administrativa, depósito, estacionamento e espaço voltado à educação ambiental. Também contempla sete mirantes com vistas panorâmicas para a baía de Vitória, o Convento da Penha e a orla de Vila Velha.
O conjunto de edificações inclui ainda um receptivo na Rua Xavantes, com sala administrativa para a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, setor destinado à operação de um futuro sistema funicular, sala de enfermaria, área de estar, bilheteria, sanitários públicos acessíveis, copa de apoio e iluminação pública em LED. No topo, será construída uma cafeteria e área de apoio coberta. As atuais trilhas não sofrerão alterações, como informam a prefeitura e o governo do Estado.
Divergências
A decisão do TJES vem na esteira de duas derrotas da gestão de Arnaldinho na primeira instância. Também nessa quarta, o juiz Marcos Antônio Barbosa de Souza, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Vila Velha, havia mantido o embargo às obras após pedido de reconsideração da prefeitura.
Ele decidiu modular a liminar anterior para permitir apenas “ações estritamente necessárias à segurança” e estudos técnicos, proibindo todas as demais obras de implantação previstas no contrato municipal ligado ao projeto turístico, “pois isso configuraria ocupação material indevida antes da regular desapropriação”.
A prefeitura apontou risco de danos ambientais e financeiros com a paralisação total das ações no morro e apresentou novos Decretos de Utilidade Pública (DUPs) como demonstração de cumprimento das etapas do plano de manejo. O juiz, porém, enxergou o movimento de forma oposta. Para ele, os documentos comprovam justamente que o município reconhece formalmente que a área não é pública.
“Os próprios decretos editados pelo município reforçam a necessidade de desapropriação, e não o contrário. Se o município entende que deve desapropriar, então deveria propor a ação cabível, depositar o valor e pedir a imissão provisória”, registrou.

