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TJES suspende lei de Guarapari que proibia ensino sobre gênero nas escolas

Medida, revogada pela Câmara, voltou a valer após veto do prefeito Rodrigo Borges

Leonardo Sá

O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) concedeu uma liminar para suspender a Lei Municipal nº 5.036/2025, de Guarapari, que proibia o ensino e a abordagem de temas relacionados à identidade de gênero e à orientação sexual, chamado de “doutrinação de gênero”, nas escolas públicas e privadas do município. A medida, de efeito imediato, foi aprovada por unanimidade pelo Tribunal Pleno e permanecerá válida até o julgamento final da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) movida pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol).

Na ação, o partido sustenta que a Lei nº 5.036/2025 é formal e materialmente inconstitucional, pois invade competência legislativa da União e viola direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal, como a liberdade de ensino e o pluralismo de ideias. O partido pediu a suspensão imediata da norma, alegando ainda que sua aplicação durante o ano letivo poderia causar prejuízos ao ambiente escolar.

O relator do processo, desembargador Robson Luiz Albanez, destacou que a norma municipal “impõe censura pedagógica” e “afronta os princípios constitucionais da liberdade de ensinar, do pluralismo de ideias e da promoção de um ensino emancipador e inclusivo”.

Ressaltou, ainda, que a Constituição Federal confere à União a competência privativa para dispor sobre as diretrizes e bases da educação nacional, conforme o artigo 22, inciso XXIV. “A Lei nº 5.036/2025 de Guarapari dispõe, de modo categórico, sobre conteúdos pedagógicos a serem vedados nas instituições de ensino públicas e privadas, estabelecendo inclusive mecanismos de fiscalização e denúncia contra professores e gestores escolares”, escreveu o relator. Para ele, essa interferência “restringe a liberdade pedagógica preconizada na Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação”.

O desembargador citou precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF), como as Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 457 e 461 e a ADI 5537, que reconheceram a inconstitucionalidade de leis municipais semelhantes. Em todos esses casos, o STF entendeu que normas locais que proíbem o ensino sobre gênero e orientação sexual configuram censura e violam a repartição constitucional de competências.

Albanez também alertou para os impactos negativos da lei sobre a rotina escolar, “com intimidação de professores e restrição de práticas pedagógicas voltadas à diversidade e à cidadania”. Para o relator, a medida era urgente para evitar “lesão grave e irreversível à ordem constitucional”.

O voto foi acompanhado por todos os desembargadores presentes, incluindo Pedro Valls Feu Rosa, que defendeu a centralização das diretrizes educacionais na União. “Caso cada município e cada estado decidisse com absoluta autonomia o que ensinar, a educação nacional se tornaria uma verdadeira balbúrdia”, observou. Ele acrescentou que “não se pode proibir o que já proibido está”, referindo-se ao fato de que o município não tem competência para tratar de temas que a legislação nacional não regula diretamente.

Na tese firmada pelo tribunal, ficou estabelecido que “compete privativamente à União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, sendo inconstitucional norma municipal que proíbe o ensino de identidade de gênero e orientação sexual”. O TJES também afirmou que a censura a conteúdos pedagógicos sobre diversidade “compromete o papel emancipador da educação pública e contribui para a exclusão de grupos vulneráveis no ambiente escolar”.

A Defensoria Pública Estadual (DPES) e a Procuradoria de Justiça também se manifestaram favoravelmente à liminar, entendendo que a lei municipal compromete o direito à educação plural e o princípio da proteção integral de crianças e adolescentes.

A lei já havia sido revogada em setembro, por projeto aprovado pela própria Câmara de Vereadores, que acatou recomendação do Ministério Público do Estado (MPES), resultado da intermediação da Procuradoria-Geral de Justiça, que buscou um acordo com o parlamento, por meio do Núcleo Permanente de Incentivo à Autocomposição (Nupa). Antes disso, a Comissão de Redação e Justiça do Legislativo também havia apontado a inconstitucionalidade da proposta. No entanto, a proposta foi vetada pelo prefeito, Rodrigo Borges (Republicanos), no mês seguinte, e o veto acabou sendo mantido por unanimidade pelo plenário.

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