Rafael Primo aponta omissão sobre bairro anunciado para o entorno de Jacarenema

A crescente pressão da expansão imobiliária sobre áreas de preservação ambiental em Vila Velha resultou em uma ação civil pública contra o prefeito Arnaldinho Borgo (sem partido), os secretários municipais Raphael do Nascimento (Serviços Urbanos) e Rodrigo Magnago de Hollanda Cavalcante (Administração), e o chefe de Gabinete do prefeito, Samuel Paiva. Eles são acusados pelo vereador Rafael Primo (PT) de improbidade administrativa, por permitir o avanço do bairro de alto padrão Costa Nova sobre a zona de amortecimento do Parque Natural Municipal de Jacarenema.
A ação foi protocolada na 2ª Vara da Fazenda Pública do município nessa quarta-feira (16), e cobra o afastamento imediato dos agentes públicos por “omissão deliberada” no fornecimento de informações requisitadas por meio da Câmara Municipal sobre o licenciamento e as compensações ambientais vinculadas ao empreendimento, que ocupará 615 mil metros quadrados entre os bairros Araçás e Jockey, às margens da Rodovia do Sol. A área se localiza no entorno da unidade de conservação, considerada de alta sensibilidade ecológica e hídrica. O empreendimento é desenvolvido pelo Opportunity Fundo de Investimento Imobiliário, em parceria com empresas como Mar Azul e Green Village.
As informações solicitadas incluem cópias de licenças ambientais, Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados com o Ministério Público do Espírito Santo (MPES), projetos técnicos, contratos de execução de obras no entorno – como a nova Ponte da Madalena e a ciclovia construída no interior do parque -, além de estudos de impacto e registros de audiências públicas.
Segundo a ação, os pedidos foram formalizados em ofícios enviados em 20 de maio, porém, a prefeitura não apresentou nenhuma das documentações solicitadas nem justificou a negativa. “A conduta dolosa dos requeridos, consistente em negar informações de forma deliberada, visa frustrar o controle parlamentar e social sobre a atuação administrativa, possivelmente para ocultar irregularidades no processo de licenciamento de um megaempreendimento em área sensível do município”.
Outro aspecto que, segundo o vereador, “reforça a suspeita de má condução do processo”, foi citado por ele em carta aberta publicada também nessa quarta. “(…) Chama atenção que, no dia 14 de julho, o secretário [de Serviços Urbanos] tenha sido nomeado para compor a comissão do PDM [Plano Diretor Municipal], e no dia 15 tenha pedido exoneração”, apontou – o nome de Raphael do Nascimento ainda consta, porém, nos registros oficiais da prefeitura como titular da pasta.
“Trabalharemos de maneira técnica, baseada em evidências, buscando incessantemente construir a Vila Velha das propagandas e redes sociais, uma Vila Velha que respeite o servidor e acolha todos os cidadãos, sobretudo os que mais precisam”, acrescenta Primo.
O vereador também questiona a competência legal da prefeitura para emitir as licenças ambientais que permitiram o início das obras do Costa Nova. Citando a Lei Complementar nº 140/2011 e a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981), Rafael sustenta que, por se tratar de área com relevância ecológica estadual e próxima a uma unidade de conservação, o licenciamento deveria ter sido conduzido pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) ou pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Sem os documentos técnicos, no entanto, afirma ser impossível confirmar a legalidade da autorização.
Além do afastamento dos agentes públicos, a ação requer condenação por improbidade administrativa, com aplicação de penalidades como perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, proibição de contratar com o poder público, e multa proporcional ao dano causado.
O parque
Criado em 2003, o Parque Natural Municipal de Jacarenema é uma unidade de conservação de proteção integral com 346 hectares, que compreende a Praia da Barrinha, o costão rochoso do Morro da Concha e o manguezal na foz do Rio Jucu. O local abriga diferentes formações de vegetação de restinga e mata ciliar, além de uma rica biodiversidade. No entanto, enfrenta desafios, como especulação imobiliária e ocupações irregulares.

O Plano de Manejo do parque, consolidado em 2010, consiste em um documento técnico produzido por uma equipe multiprofissional, responsável por desenvolver um diagnóstico ambiental e sociocultural da unidade de conservação e definir uso territorial para cada uma das zonas propostas no zoneamento planejado. Militantes do Comitê Popular de Luta da Região 5 de Vila Velha também manifestaram preocupações com a atualização do plano. Eles temem que a revisão não priorize a recuperação de áreas degradadas, mas facilite a expansão de novos empreendimentos que comprometam ainda mais a integridade do parque natural, cujo objetivo primário consiste na conservação do equilíbrio ecológico para as formas de vida que habitam o território.
Com a inauguração das novas estruturas no parque, em janeiro deste ano, o Comitê Popular de Luta da Região 5, de Vila Velha, a Comissão de Luta pelo Meio Ambiente, o Fórum Popular em Defesa do Meio Ambiente e da Cidadania emitiram uma nota de repúdio contra os danos causados pela impermeabilização do solo de restinga, entre outras intervenções que comprometeram funções ecológicas do ecossistema e podem agravar problemas ambientais, como enchentes e perda de habitats naturais.
‘Trâmites legais’
Procurada por Século Diário, a Prefeitura de Vila Velha informa que não foi notificada oficialmente sobre o caso citado. Esclarece, ainda, que respondeu ao requerimento do vereador, no dia 25 de junho, via Secretaria de Meio Ambiente, conforme os trâmites legais.
A administração municipal diz que “reafirma seu compromisso com a legalidade, a transparência e o respeito ao cidadão, mantendo sempre o diálogo aberto com a sociedade e seus representantes”.