Presidente da associação da Ilha das Caieiras, em Vitória, cobra apoio e infraestrutura
Pescadores da Ilha das Caieiras, em Vitória, voltaram a cobrar políticas públicas voltadas à pesca artesanal e participação na elaboração e desenvolvimento de programas, em reunião com o subsecretário de Estado da Agricultura Familiar, Rogério Favoretti. “Temos políticas públicas, mas são poucas. É preciso que os governantes tenham um olhar mais atento e contato direto com a comunidade pesqueira, que é uma categoria sofrida e desvalorizada”, cobra o presidente da associação de pescadores do bairro, Wellington Júnior, conhecido como Juninho.

Ele aponta que a desinformação sobre programas como o Fundo Social de Apoio à Agricultura Familiar (Funsaf) impede que pescadores concorram a recursos que poderiam melhorar a infraestrutura, a capacitação e o desenvolvimento de projetos locais. O fundo oferece apoio financeiro para associações de pesca formalizadas, por meio de editais, e o recurso será ampliado em 2026, mas a dificuldade de acesso persiste devido à falta de informação e orientação às comunidades pesqueiras.
“O secretário informou que, no próximo ano, o valor do benefício vai ser elevado, de cerca de R$ 300 mil para R$ 500 mil. O que nos chamou atenção foi a informação apresentada por ele sobre o acesso pelos pescadores. Apesar desses editais existirem há mais de uma década, apenas quatro associações de pesca conseguiram o benefício em todo o Espírito Santo, e a maior parte dos recursos ainda tem sido direcionada à agricultura”, observa. “Vai ser a primeira vez que vamos nos inscrever nesse edital, e nem sabíamos que ele existia. Com a ajuda do MAB [Movimento dos Atingidos por Barragens, que intermediou a reunião], conseguimos entender como funciona e vamos elaborar nosso projeto”, contou.
Juninho destaca que o edital permite investir em melhorias como câmeras frigoríficas, máquinas de gelo para camarão e equipamentos para descascar e processar pescado, fortalecendo a infraestrutura da pesca local, mas aponta para a vulnerabilidade enfrentada pelas famílias que sobrevivem da atividade. “A pesca está desassistida em todos os setores. É uma das profissões mais antigas do mundo, mas enfrenta desvalorização e dificuldade de manutenção das novas gerações. Muitos filhos e netos de pescadores não querem seguir a profissão devido à falta de incentivos e infraestrutura”, alerta, indicando os riscos de perda da cultura, tradicionalidade e modos de vida de uma das comunidades mais antigas da Capital.
O grupo também critica a baixa comunicação do governo com as comunidades tradicionais. Os programas e projetos, afirma, são concebidos de forma centralizada, sem diálogo prévio com quem realmente deve usufruir das políticas. “O primordial é conversar. Quando chega com as coisas prontas, é difícil, a comunidade não participa e não conhece as alternativas disponíveis”, explicou.
As demandas apresentadas ao governo incluem construção de galpões e piers para manutenção de embarcações, locais para os pescadores artesanais atracarem, e implantação de projetos de cultivo de camarão e tilápia. Além disso, os pescadores destacam a necessidade de equilibrar preservação ambiental com atividades pesqueiras, garantindo que as políticas públicas incentivem a manutenção do modo de vida local. A crise provocada pelo desastre da Samarco/Vale-BHP, segundo Juninho, agravou ainda mais a situação da pesca na região, tornando o acesso a programas de apoio uma questão urgente.
Durante a reunião, o representante da associação afirma que Rogério Favoretto ressaltou que o governo dispõe de recursos e editais, mas as associações teriam responsabilidade de buscar orientação e apresentar projetos. Para o pescador, a declaração evidencia a necessidade de maior proximidade e acompanhamento das políticas públicas, para que recursos cheguem de fato às comunidades.
“Foi importante receber o secretário, pois se ele não viesse, não teríamos acesso a essas informações. Mas ainda sentimos falta de um olhar mais próximo do governo e de políticas públicas que contemplem as reais demandas da pesca artesanal”, completa.
As demandas levantadas pelos pescadores da Ilha das Caieiras estão alinhada com as reivindicações apresentadas ao governo do Estado por movimentos populares ligados à pesca artesanal e à agricultura camponesa. Em maio deste ano, o MAB e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) levaram à Secretaria de Agricultura e Pesca (Seag) e à Secretaria de Estado de Recuperação do Rio Doce (Serd), propostas voltadas justamente ao fortalecimento da pesca artesanal, sobretudo em territórios impactados pelo crime da Samarco/Vale-BHP.
A pauta de reivindicação era resultado de um acúmulo de debates e articulações construídos a partir das bases dos movimentos, envolvendo atingidos por barragens, agricultores e pescadores artesanais, e já havia sido apresentada ao governador Renato Casagrande (PSB) em reunião com diversas secretarias, incluindo as de Agricultura e Habitação.
Um dos pontos sugeridos na ocasião foi a criação de um fundo social de amparo, funcionando como uma linha de crédito combinando microcrédito e recursos a fundo perdido, para que agricultores e pescadores possam realizar investimentos produtivos, como reforma ou aquisição de embarcações e melhorias nas propriedades. Para a pesca artesanal, os movimentos apresentaram um projeto-piloto para estruturar uma rede de cooperativas, especialmente em São Mateus e Conceição da Barra, no norte do Estado. A iniciativa propunha desde fábricas de gelo e insumos até sistemas de energia solar e câmaras frias, para integrar, garantir sustentabilidade e capacidade produtiva das comunidades.

