Sexta, 17 Mai 2024

Comunidade denuncia morte do manguezal de Campo Grande, em São Mateus

Comunidade denuncia morte do manguezal de Campo Grande, em São Mateus
Campo Grande, em São Mateus (norte do Estado), é uma comunidade que vive tradicionalmente da cata do caranguejo. Quer dizer, vivia. Adeci de Sena, 54 anos de manguezal, presidente da Associação de Pescadores, Catadores de Caranguejo, Aquicultores, Moradores e Assemelhados de Campo Grande (Apescama), na região de Barra Nova, recorda ter visto “o amarelão” da lama da Samarco/Vale-BHP chegar em maio de 2016 e, com ele, o declínio da fonte de subsistência e principal identidade cultural de sua comunidade.



Do ponto de vista econômico, o primeiro impacto foi a redução na venda dos caranguejos, pois as notícias da chegada da lama afastaram os consumidores. Com o passar do tempo, no entanto, o manguezal foi perdendo a vida e os caranguejos desaparecendo.



Em dezembro passado, até os sítios localizados rio adentro foram afetados, "como o do senhor Romildo Thomaz, cujos porcos estão, até hoje, com feridas nunca antes vistas, resultado do contato frequente com a água contaminada”.



Em 2017, o processo de morte se acentuou e, nesta semana, Adeci registrou a situação deplorável do manguezal, seco, com árvores mortas e mortos também os poucos caranguejos que sobraram. O seguro-defeso se encerra esse mês. Irão viver de quê?



“O que a gente sabe fazer é pescar caranguejo e vender. Vai fazer o que, agora? Tanque-rede? Água 'tá' poluída. Agricultura? Água 'tá' poluída. A vida foi viver do caranguejo”, desabafa o líder comunitário.



Festival com caranguejos da Bahia


Até o Festival do Caranguejo, que acontece anualmente desde 2000, este ano vai ser feito com crustáceos comprados em Canavieiras, na Bahia. Serão 250 a 300 dúzias para abastecer os três dias do tradicional evento (19, 20 e 21 de maio).



Mesmo sem o reconhecimento formal da área como atingida, Adeci é firme: “A gente tem conhecimento técnico porque vive aqui há 54 anos, trabalhando só com caranguejo e aprendendo com os mais velhos, que estão aqui há 80, 90 anos. Se mesmo assim a gente não conseguisse entender como é o manguezal, entender o que acontece com ele...”, conta o catador, deixando as reticências no ar, junto de uma risada de ironia, de quem não precisa de acadêmico ou analista ambiental pra lhe dizer o motivo da morte de seu manguezal. “O mesmo produto que apareceu dentro do manguezal é o que está no mar. No mar bate e forma espuma. No mangue não bate, então ele fica parado, matando tudo. Não é só a seca, os rios com pouca água”, explica.



Diante dos fatos, o prognóstico do antigos consegue ser ainda mais duro, seco e triste que a realidade presente: “Pelo que a gente tem conhecimento, acho que eu morro e aquilo não se recupera. Mas acho que nenhum cientista pode dizer isso pra nós”, reflete.



Empresa e Renova nunca foram à região



Durante todo esse tempo, quase um ano, os pescadores e catadores de Campo Grande e região se uniram ao Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e ao Fórum Norte do Rio Doce, para exigir o reconhecimento da região como atingida pelo crime da Samarco/Vale-BHP.



A nova promessa é que o reconhecimento aconteça no final deste mês, na próxima reunião do Comitê Interfederativo do Rio Doce (CIF), a partir da pressão de uma Nota Técnica emitida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) comprovando, mais uma vez, a expansão da lama desde a divisa do Rio de Janeiro até o Parque Nacional Marinho de Abrolhos, com mais intensidade entre Aracruz e Caravelas/BA.



“Tô'  pedindo em nome da comunidade que a [Fundação] Renova e a empresa venham na nossa comunidade, porque nunca vieram aqui. Venham cá ver o dano que causou na comunidade. E deveriam trazer os profissionais junto, do Incaper [Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural] e da Secretaria de Agricultura, pra estudar no que a comunidade vai poder trabalhar daqui pra frente”, apela Adeci.


 

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